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A Iniciação, Por que e Para Que ? [Parte Final]

Atualizado: 22 de out. de 2020

Seguimos então com a segunda e ultima parte da tradução desse excelente texto. Esperamos que o mesmo apresente fortes pontos para reflexão dos maçons retificados em nossas terras.


Visões Diversas Sobre a Via Iniciática no Marco Evangélico.

[Por Pascal Gambirasio d’Asseux]


Com relação à natureza e aos "efeitos" da iniciação, é certamente necessário distinguir se ela opera dentro de tradições não-cristãs ou dentro da estrutura evangélica da Nova e Eterna Aliança.


Tradições Não Cristãs


A iniciação constitui, no contexto espiritual aqui considerado, algo como um “plus”; um “algo a mais”, algo “suplementar” em relação aquilo que a “multidão” já recebe ordinariamente. Ela confere, por meio da bênção específica que representa, uma espécie de privilégio aos olhos do que é transmitido à massa de fiéis; e na medida em que esses últimos recebem uma “via geral” que lhes permitirá cumprir da melhor maneira possível sua peregrinação terrestre (em modo bíblico, diríamos que são admitidos no recinto do Templo, chegando inclusive ao Lugar Santo) aqueles que recebem a iniciação teriam então a possibilidade de ultrapassar o limiar, podendo ser admitido no “Santo dos Santos”; o que coloca a iniciação como uma espécie de bênção reservada.


Do mesmo modo, esse “plus”, que evocamos um momento atrás, é percebido e analisado como um elemento de interioridade e condicionamento “suplementar” no quadro da revelação espiritual considerada. Em outras palavras, trata-se de uma graça (de uma "influência espiritual", como diria Guénon) que aproxima o centro daquele que a recebe, permitindo-lhe, agindo no sentido pleno da palavra, outras possibilidades, outros campos de realização espiritual nesta vida ou naquilo que se convencionou denominar os estados póstumos do ser. Estes estados podem diferir essencialmente, neste contexto tradicional não cristão, segundo um esteja iniciado ou não, e a condição que essa iniciação se tenha cumprido, ou que um se beneficie (se nos é permitido dizê-lo já que por si mesmo é um testemunho eficaz e incomensurável da atenção misericordiosa do Criador para seus filhos), "somente" da bênção geral que "envolve" ao conjunto de membros da comunidade em vista de uma via espiritual apta a ser alcançado e cumprido por esta multidão ainda não sensível ao desejo de interioridade e do absoluto "para o Reino dos Céus"


Tradição Cristã


Ao contrário de outras formas tradicionais, precisamente por tratar-se da Nova e Eterna Aliança na qual intervém "a plenitude dos tempos", segundo a promessa de Deus, a revelação cristã não conhece, ou talvez melhor não considera, distinção de alguma forma hierárquica de bênçãos, da "periferia" ao "centro".


"Tudo nos é dado" em plenitude pelos sacramentos fundamentais do batismo, da confirmação e pela participação da Comunhão Eucarística que os próprios sacramentos permitem e para os quais se ordenam.


O homem, por meio do Santo Batismo, é definitiva e radicalmente “lavado” do pecado original, ou seja, das conseqüências ontológicas do pecado de Adão. O homem é salvo da queda e a marca de Satanás nele é apagada, embora ele permaneça, apesar de tudo, suscetível e, portanto, sensível às tentações do maligno, que continua sendo capaz de machucá-lo individualmente através de suas potenciais corrupções, caso ele se deixar seduzir e subjugar. Mas as vivas águas do Batismo e o fogo desse Pentecostes pessoal (que é o sacramento da Confirmação) marcam indelevelmente o ser que os recebe, tornando-o um novo ser, um ser renovado no Senhor. O alimento eucarístico, finalmente, o faz entrar como por "antecipação escatológica" nos mistérios do Reino de Deus e ser admitido, pela Graça adotiva à vida Trinitária que as Três Pessoas têm por natureza.


Como podemos perceber, e é aqui que a doutrina cristã, com toda a sua autoridade divina, afirma através do Evangelho e do Magistério da Igreja, que não é possível que, no marco espiritual a iniciação traga uma graça "maior" em relação ao resto que não fosse partilhada pelo conjunto de batizados. É precisamente nisto que o cristianismo e a iniciação cristã diferem de outras tradições.


No entanto, isto não significa que a via iniciática perca sua razão de ser no contexto cristão, nem tampouco sua "eficiência" particular, muito pelo contrário; se por um lado ela não confere "nada de mais" (que seja superior aos outros), por outro ela transmite “algo muito melhor” [...]


[Nota do Blog Primeiro Discípulo: Cortamos aqui o parágrafo ao meio para fazer essa nota, que bem poderia estar no rodapé, mas resolvemos inserir aqui devido a importância que a ela atribuímos. S. João Paulo II disse VITA CONSECRATA: As pessoas consagradas, na medida em que aprofundam a sua própria amizade com Deus, ficam em condições de ajudar os irmãos e irmãs com válidas iniciativas espirituais [...] jornadas de deserto, escuta e direção espiritual. Deste modo, é facilitado o progresso na oração a pessoas que poderão, depois, realizar um melhor discernimento da vontade de Deus sobre elas próprias, e decidir-se por opções corajosas, às vezes heróicas, exigidas pela fé. De fato, as pessoas consagradas, ‘pelo mais profundo do seu ser, situam-se no dinamismo da Igreja, sequiosa do Absoluto, que é Deus, e chamada à santidade. É desta santidade que dão testemunho’ .O fato de todos serem chamados a tornar-se santos, não pode senão estimular ainda mais aqueles que, pela própria opção de vida que fizeram, têm a missão de o recordar aos outros”. Ora, é justamente esse o conceito que - aqui nesse espaço - trazemos em nosso coração e temos tentando transmitir desde as primeiras linhas que escrevemos. Meus Bem Amados Irmãos, cada um de vocês é chamado ao heroísmo da santidade por sua iniciação. Passar por uma iniciação cristã e negligenciar a busca da santidade é jogar fora os talentos que Deus o confiou… Aquele que o fizer será tido por servo inútil e será atirado às trevas exteriores; ali haverá pranto e ranger de dentes. (Mt 25:14-30]


[...] Ela constitui, se nos é permitido o exemplo, uma ampliação, uma intensificação do Sacramento da Confirmação e, mais precisamente ainda, de certas Virtudes e Graças que o Espírito Santo nos confere, em particular a Virtude da Força e da Justiça, particularmente ligadas à iniciação cavaleiresca. Por outro lado, podemos recorrer à mesma doutrina da Igreja quanto à definição e os efeitos do sacramento da Ordem, reservado a alguns em relação às graças e caracteres gerais partilhados por todos os batizados, chamados - não o esqueçamos - ao triplo ministério: real, sacerdotal e profético. A iniciação, no âmbito da tradição cristã, integra, culmina, recapitula e justifica as iniciações anteriores, todas elas fundamentalmente de origem divina e coeternas ao homem desde o seu exílio "neste mundo". Nisto atua exatamente a tradição cristã, como em relação a outras tradições no plano dito "exotérico".


Deste modo, a iniciação cristã transfigura e ilumina as iniciações anteriores, as quais aparecem como prefigurações da mesma. Em linguagem teológica, diríamos que estas iniciações permanecem "justificadas", com efeito, ou seja, ao mesmo tempo legitimadas em sua natureza e objeto, e doravante entendidas e "situadas" como "propedêuticas" antes que o Verbo se fizesse carne no correr da história dos homens. Essas religiões e iniciações contribuíram, de acordo com sua ordem, para realizar o que João Batista nos exorta a fazer em seus respectivos corações: preparar e endireitar o caminho para o Senhor (Mc 1:3). Essa "justificação" lhe permite tomar finalmente sua verdadeira dimensão e revelar sua autêntica "eficiência espiritual".


A iniciação, no contexto cristão, é marcada pelo mesmo selo. Os elementos arquetípicos e preexistentes na perspectiva que acabamos de definir são, doravante, ordenados à Palavra última e viva de Deus feito homem, Jesus Cristo, que dá e deixa ao mundo a sua Aliança, a sua Alegria e a sua Paz (Jo. 14:27). Como a religião inscrita em um coração radiante, a iniciação cristã "recapitula" igualmente tudo aquilo que foi ou que permanece na matéria como igual, em relação as graças anteriores, o que significa que as reúne e ultrapassa, que as sintetiza e ilumina em plena comunhão de sentido.


Por outro lado, firma e abre um aprofundamento do “olhar interior”, uma abertura do "olho do coração" em favor do iniciado cristão em relação ao seu irmão cristão não iniciado. Como já dissemos, o não iniciado, não suporta uma falta, já que o iniciado, sem ter um "plus" goza de um "algo melhor" numa ilustração da diversidade de carismas e de superabundância evangélica. Já que, se todos os cristãos estão "situados" pela graça do batismo, no "centro", no "coração de Deus", o iniciado em particular, percebe seus batimentos com maior consciência, desejo e intensidade. É, de fato, o oficiante e o guardião, de acordo com sua vocação e com os dons que o Espírito lhe tenha outorgado. Esta é a sua missão neste mundo.


Assim mesmo, a iniciação no marco da religião cristã, busca com todo amor e com todo humildade a revelação do coração pelo Evangelho, da interioridade cordial da Aliança do Cordeiro de Deus, Salvador do Mundo.


E por que, pois, querer ir mais além, em direção a Deus? Por que, pois, ir, como diria São João Paulo II: "para mais próximo de Cristo"? A resposta temos, por um lado, nas palavras de São Macário do Egito: "Se alguém diz: Sou rico, tenho tudo o que possa necessitar, não preciso de mais nada', este não é cristão, mas um vaso de iniquidade diabólica. Já que o prazer que se tem em Deus é tanto que não se pode saciar. Quanto mais se gosta, quanto mais em comunhão estás com Ele, mais fome d’Ele tens." Mas esta fome a que nos referimos, não é porventura a vocação primeira, essencial, do homem ? sendo a verdadeira vida do seu ser? E por outro lado, nas palavras de Santo Anselmo: "Não tento, Senhor, penetrar nas vossas profundezas [...] mas desejo apenas compreender um tanto a vossa verdade que o meu coração crê e ama.". Estes dois Padres da Igreja explicitam desta maneira, e na sua radicalidade, a fonte e a legitimidade espirituais e evangélicas da meditação teológica, assim como da via iniciática.


Por outro lado, toda a via se resume, se consuma e se consome, no exemplo e no testemunho de três verdadeiros faróis da espiritualidade carmelitana que podemos contemplar como iniciados pelo mesmo Espírito Santo. Em primeiro lugar, São João da Cruz quando afirma: "no entardecer de nossas vidas, seremos julgados no amor"; Santa Teresa de Jesus (santa Teresa de Ávila) quando proclama: "E sem amor tudo é nada"; e, finalmente, Santa Teresa do Menino Jesus (santa Teresa de Lisieux), que nos deixa o perfume de sua alma, escrevendo: "No coração da Igreja, que é minha mãe, eu serei o amor".


Amor e conhecimento como uma única oração, como uma única obra cristã; São Paulo confirma-o e exorta-o com estas palavras: "Que a vossa caridade abunde mais e mais no conhecimento e em toda a compreensão" (Fp 1:9). Eis o que tece o caráter da iniciação cristã, o manto de terra em que a semente germina e cresce.


[Nota do Blog Primeiro Discípulo: Paramos por aqui, embora o texto traga em si outras linhas riquíssimas a medida que adentra os sacramentos e os relaciona a iniciação.]


I.C.J.M.S.

Que Nossa Ordem Prospere !!!

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