Nosso Senhor Jesus Cristo trouxe ao mundo a plenitude da Revelação sobrenatural. Revelação que Ele anunciou de maneira simples, acessível aos Apóstolos e a seus imediatos discípulos ( Vide nossa postagem : “Círculo Interno ? Os Ensinamentos Secretos de Jesus”). Sobre sua Santa Doutrina, o Senhor fundou sua Igreja, uma sociedade destinada a viver neste mundo, atravessando os séculos até o fim dos tempos. Jesus Cristo, sendo Deus, ensinou a verdade. Ora é óbvio que a verdade não muda, não se contradiz.
Por tal motivo os ensinamentos de Jesus Cristo comunicados à igreja não podem variar segundo as fases da história ou a moda dos homens; devendo conservar-se em uma linha de fidelidade e continuidade a si mesmos: «O céu e a terra passarão ; as minhas palavras, porém, não passarão», dizia o Senhor aos Apóstolos (Mt 24:35). E da mesma forma que a Igreja de Cristo não pode ser retocada em sua estrutura essencial, assim os sistemas que se baseiam na tradição revelada (dentre os quais nos interessa a cadeia moral / iniciática, concentricamente arquiteturada nas classes do Rito Escocês Retificado, que permitem o aprofundamento gradual na doutrina que alavanca o homem ao progresso espiritual) não podem ser retocados, pois são obra da Verdade e, por conseguinte, participam da perenidade da Verdade.
Mas o que é tradição ? Em geral, todos consideram bem conhecido o sentido desse termo. Nós, todavia, julgamos necessário defini-lo corretamente.
Antes de mais nada, a idéia de tradição compreende a de certos valores transmitidos e preservados ao longo de gerações. Transmitidos e preservados, ou seja, ensinados e apresentados como valores a se manutenir e respeitar, pois se apresentam como fundamento inalterável de uma determinada concepção de mundo e, consequentemente, do modo de vida de uma sociedade. Com efeito, uma tradição se materializa nos costumes. A idéia de tradição está, logo, completamente unida à de valor e costume. Não há aqui lugar para definições subjetivas do que seja valor: o valor preservado pela Tradição é precisamente aquele que se impõe pelo fato de fundar essa mesma tradição e de lhe pertencer, a despeito do que pensam os indivíduos, que devem reconhecê-la e obedecê-la.
Os valores expressos em uma tradição constituem a verdade sobre a própria tradição. São tidos como dignos de pertencer-lhe porque são verdadeiros, e são tidos como verdadeiros por causa daquilo que expressam: Verdades de caráter religioso e moral, ou apenas religioso, ou apenas moral, ou moral e político, ou apenas político, ou enfim, provindo apenas dos costumes: uma verdade que é, seja o que for, objetiva, que pertence à coisa enquanto tal, independentemente do fluxo e refluxo de opiniões e acontecimentos.
Tal verdade, presente nos valores da tradição, equivale à conformidade desses valores com a idéia de justiça: os valores da tradição são justos, esta é a sua verdade; e é justo observá-los, conservá-los e viver sob sua orientação.
A tradição é, portanto, um sistema de princípios e comportamentos coerentes que constituem as normas, escritas ou não escritas, das quais o homem não pode se afastar no plano das leis ou dos costumes. Quando ligada a uma instituição, como o nosso Regime Retificado, a tradição aparece com um componente épico: atos gloriosos e empresas memoráveis.
Ao meditar sobre os atos gloriosos e as memoráveis empresas que o R.E.R. nos permite realizar dado as condições que nos proporciona, volto, primeiramente, ao momento exato de sua fundação e de sua expansão por toda Europa no Convento de Wilhelmsbad no ano 1782. Convento em cujas Atas se reconhece a intervenção de nosso Pai Fundador, Jean-Baptiste Willermoz, quando este tenta definir e esclarecer os valores dos elementos que compõem a nossa tradição: “O objetivo dos símbolos, figuras e cerimônias da maçonaria simbólica é o de conduzir aqueles que os estudam ao conhecimento e a prática da Ciência Maçônica.”.
Mas quantos eram, na ocasião, os irmãos que estavam interessados em conhecer realmente esses elementos e, por meio deles, conhecer a Ciência Maçônica ? E hoje ? Quantos seriam ? Quantos estariam dispostos a reconhecer que fazemos parte de uma “Ordem por excelência, detentora dos conhecimentos precisos e secretos que derivaram-se da Religião Primitiva” (religião revelada e manutenida por tradição).
Quando começamos os trabalhos no Grau de Aprendiz, a instrução por meio de perguntas e respostas nos diz:
- O que é a Maçonaria?
- É uma escola de Sabedoria e de Virtude que conduz ao Templo da Verdade, sob o véu dos símbolos, aqueles que A amam e A desejam.
E conforme avançamos pelos sucessivos graus simbólicos, vamos percebendo a verdade e os valores que nos foram legados por Willermoz em nossa tradição: “ “A maçonaria tem um objetivo universal, que a moral não pode alcançar… O objetivo da maçonaria é esclarecer o homem sobre sua verdadeira natureza, sobre sua origem e sobre seu destino [...]”. “A Franco-maçonaria quando bem meditada (pensada) , convida sem cessar, por toda sorte de meios, a vossa natureza essencial. Ela busca, de forma constante, aproveitar todas as ocasiões para fazê-los conhecer a origem do homem, seu destino primitivo, sua queda, os males que resultaram em consequência dessa queda e os recursos que a bondade divina proporciona para que possam triunfar”.
O Maçom Retificado sabe o que é a Ciência do Homem (ou Ciência Maçônica), conhece a tradição na qual está inserido, sabe em que consiste a glória para a qual ela conduz e sabe que a chave que lhe abre as portas da compreensão está codificada sob os símbolos, figuras e cerimônias que compõem os rituais que herdamos de Jean-Baptiste Willermoz. Cabe então a esse mesmo Maçom, decodificar esses elementos (remover-lhes o véu). E para tal, Willermoz apontou um caminho seguro e inquestionável, o mesmo apontado pela tradição cristã dos primeiros séculos: A Palavra de Deus... “quando, para aperfeiçoar o Vosso trabalho buscardes a Luz que vos é necessária, lembrai-vos que ela se encontra no Oriente e que é aí e só aí que a podereis encontrar” - Extrato do Ritual de Aprendiz.
De fato, ao iluminar nossos símbolos, figuras e textos rituais com esta Luz que está permanentemente localizada no Oriente (e que não é outra senão a Bíblia Sagrada, de forma mais particular o Novo Testamento) podemos gradualmente descobrir o estado decaído de nossa existência atual e o quanto ele nos impede de ver a verdade, lembrar de quem somos, de onde viemos e para onde devemos ir.
Tudo isso está presente na metodologia própria que a via iniciática maçônica, (perfeitamente preservada pela tradição contida no R.E.R) nos oferece. Metodologia que nos introduz em um espaço-tempo sagrado onde o poder combinado do Verbo, do gesto, do símbolo e da ação, constroem, tanto dentro como fora de nós, o Templo em cujo interior a presença Divina se manifesta, se encarna, faz morrer a nós mesmos (o velho homem) conduzindo-nos a ressurreição; processo que resume nossa divisa - Perit Ut Vivat - e que não é outro senão a imitação fiel do verdadeiro modelo: Nosso Senhor Jesus Cristo.
O processo está presente em nossos rituais simbólicos, desde o Grau de Aprendiz ao Grau de Mestre Escocês de Santo André.
O Grau de Aprendiz recorda o estado primitivo do homem e sua posterior queda;
O Grau de Companheiro mostra seu estado presente e a forma de retificar ou reparar as consequências da queda;
O Grau de Mestre orienta para seu estado futuro, ajudando-o a discernir entre o que é corruptível e perecedouro neste mundo daquilo que é incorruptível e eterno; e finalmente;
O Grau de Mestre Escocês de Santo André revela o destino glorioso que deve ser alcançado por meio do exercício das virtudes.
Após anos de trabalho intenso em Lojas Azuis e mesmo além delas, anos dedicados ao ato de debruçar-nos quase exaustivamente (porém sempre com a felicidade que somente a gratidão pode trazer) sobre os rituais e sobre documentos diversos, podemos testemunhar que nossos rituais são fonte inesgotável de reflexão, de sabedoria, de instrução, de orientação, de guia, de aperfeiçoamento moral e de reintegração. E isso não somente por causa do conteúdo intelectual que deriva de seus símbolos, figuras e instruções doutrinais, que devidamente iluminados pela Luz do Oriente ultrapassam o curto período que nossa existência física dura, mas também pelo método iniciático que atinge nossa mente e desperta em nosso coração a visão do espírito, ativando nossa memória e ampliando nossa consciência. Tudo isso dado a tradição que encerra em si.
O mínimo que podemos então fazer é preservar essa tradição que nos foi legada, com a mesma inteligência, bravura, discernimento e zelo que nossos antecessores tiveram para preservá-la a fim de que chegasse até nós. Eis aí uma parte dos atos gloriosos e empresas memoráveis às quais somos chamados a participar… Manter puro o que puro recebemos.
Pretender enxertar em nossos trabalhos maçônicos elementos estranhos a nosso rito, tais como: alquimia, música, sufismo, cabala, numerologia, rosacrucianismo, espiritismo, martinismo papusiano, pensamento de nova era, ensinamentos de outros ritos, etc (não que tais tradições não tenham seu valor dentro de seus respectivos contextos) somente conduz a confusão, dado que, inevitavelmente, essas misturas acabam por abrir portas que conduzem a dispersão, inicialmente na aparência e por fim na essência, já que tais elementos, quando aprofundados, estabelecem verdadeira contradição para com a doutrina preservada pela nossa tradição
De tudo o que foi dito, conclui-se que a doutrina e os métodos do Regime Escocês Retificado dispensam enxertos e/ou “puxadinhos”, pois são não apenas atuais para o homem de nossos tempos, mas também incorporam o modelo arquétipo do homem em sua dimensão eterna e sagrada; passado, presente e futuro, como acabamos de ver.
Desgraçadamente sempre existiram entre nós, como descrito por Willermoz há mais de dois séculos, muitos que ”levam o título de maçom” porém “a maioria se satisfaz com o superficial” e “pouquíssimos procuram o âmago das coisas”.
E é partir de nossa própria experiência percorrendo diferentes lojas em nossa terra, de várias Obediências, que afirmamos que toda vez que o verdadeiro espírito de nossa Ciência Maçônica é perdido, isso culmina em um desvio que leva, no menor dos males, a uma dispersão sem sentido e, no maior dos males, a uma completa perversão que desfigura o rito e conduz o maçom a uma experiência contra-iniciática.
Quem dentre aqueles que atualmente praticam o R.E.R. pode dizer que supera em luzes aqueles que projetaram a arquitetura ritual e doutrinal de nosso Regime? Contentemo-nos, meus Bem Amados Irmãos, em vislumbrar a luz que por meio da Ordem nossos Mestres nos transmitiram.
Na segunda parte desse artigo proporemos uma metodologia para realização de peças de arquitetura nas lojas simbólicas, consequência lógica dos fundamentos que acabamos de apresentar.
I.C.J.M.S.
Que Nossa Ordem Prospere !!!
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