Chegamos ao último extrato do Capítulo V do livro “Un Místico Lyonés y los secretos de la Francmasonería, Jean Baptiste Willermoz (1730-1824)”, de Alice Joly.
Nele o autor discorre sobre assuntos como as desafeições de Willermoz e o seu descontentamento com a Estrita Observância Templária, uma certa inimizade com Louis-Claude de Saint-Martin, com o Templo dos Filósofos Elus Cohen lioneses de 1.774 a 1.778, o desenvolvimento da doutrina de Pasqually, a decadência da Ordem Cohen, os sucessos mundanos do Filósofo Desconhecido na sociedade parisiense e encerra com uma meditação sobre uma reforma pessoal da maçonaria por Jean-Baptiste Willermoz.
A Desafecção de Jean-Baptiste Willermoz Pela Estrita Observância Templária e Pelo Templo dos Filósofos Elus Cohen de Lyon - Parte Final
Alice Joly
Os lioneses se esforçaram para distinguir o primeiro grau, que era um grau de reconciliação e perdão ao pecador arrependido, do grau mais eminente, onde o homem retorna em razão de seus méritos, as qualidade e virtudes que Adão, em decorrência da queda, havia perdido. Alcançar o estado perseguido nesse grau era mais importante coletivamente do que a nível pessoal, isso porque o lioneses acreditavam que um grupo muito grande de homens poderia ser salvo graças aos esforços de alguns poucos (1); e além disso, acreditavam que Adão não seria “reintegrado plenamente” até que o último de seus descendentes tivesse alcançado a regeneração, fazendo assim que Adão fosse o último a reconquistar seus direitos entre os salvos e isso só seria possível quando não houvesse mais o menor rastro do pecado original no mundo (2). Quer dizer que a condenação ao inferno seria remediável? É o que parece proposto pelos lioneses, ainda que de forma imprecisa. As instruções não avançam muito mais em outras direções que não aquela da ideia da regeneração geral, da qual o próprio demônio não estaria excluído (3), elas possuem vários pontos questionáveis ante a imensa tarefa que atribui ao homem e a responsabilidade que tais tarefas acarretaria (4). Com efeito, haveria de espantar, ja que o homem dependeria unicamente, de qualquer forma, do arrependimento dos espíritos rebeldes (5) ou seja, do desaparecimento do mal e da reconstituição do universo segundo o plano divino. Notas de Jean-Baptiste Willermoz limitam, claro, as ambições do iniciado, insinuando que durante a vida terrestre toda reconciliação, e com maior razão toda reintegração, só pode ser imperfeita (6).
De qualquer forma, o homem, para cumprir sua tarefa, dispõe de meios muito limitados, já que tornou-se incapaz - dado a sua falta - de “criar o pensamento que o pode aproximar do Criador”, sendo não mais que um ser passivo, entregue as diversas impressões que lhe chegam, seja dos “intelectos bons” ou dos “intelectos malvados” do maligno - desejosos de o pôr a perder nas vias da revolta e da contradição (7). A salvação era um assunto de discernimento, dependia de três colunas: a do meio-dia, que é a faculdade de escolha, a do norte, que é a vontade unida a coragem, e a do oriente que é a humildade (8) . A Ordem dos Elus Cohen era representada como a escola prática onde se aprendia a realizar essa escolha com total segurança.
[Nota do Blog Primeiro Discípulo: São tamanhos os erros e estranhezas teológicas, filosóficas e metafísicas de Pasqually e de seus discípulos Cohens (que nos chegaram graças aos Cohens de Lyon - em especial Willermoz e Saint Martin) que oramos ao Senhor Deus em ação de graças por ter colocado a “tesoura” dos bons protestantes que compunham os conventos de Gálias e Wilhelmsbad a impedir que toda essa superstição fosse incorporada ao Regime Retificado]
A ordem Cohen propiciaria ainda a seu discípulo os meios para atrair os intelectos bons e potencializá-los e rechaçar os intelectos malvados; era necessário para isso arrepender-se e mortificar sua natureza decaída. Os sete graus da ordem Cohen eram os sete graus da purificação ao estado de “menor espiritual”, apto para reintegrar-se. Os símbolos e temas maçônicos, sobretudo o do templo de Salomão, eram explicados à luz das doutrinas de Pasqually. Qualquer outro tipo de maçonaria era tido e denunciado como apócrifo…
[Nota do Blog Primeiro Discípulo: Os “adoradores” dos Cohens e de Pasqually em nosso meio deveriam ter sempre em mente que, segundo as proposições destes, tudo o que estamos fazendo como maçons em nosso tempo é transmitir uma mensagem espúria levando varias almas ao mergulho na obscuridade de nossa falsa doutrina].
Como as instruções em Lyon eram dedicadas a alunos pouco avançados, não se prestavam a explicar os altos graus e nem transmitiam as práticas das operações teúrgicas, que estavam reservadas aos Reau-Croix, não sendo nem sequer abordadas ali.
Havia outro ponto importante sobre Martinez de Pasqually o qual não era explicado com clareza. Era sobre o papel que, para ele, o Cristo ocupava na obra da reintegração. De fato ele não considerava tanto a Nosso Senhor a ponto de estabelecer uma doutrina baseada em seus ensinamentos ou de lhe prestar culto. Não obstante tal fato, Martinez fingia ser um bom católico e com isso evitava escandalizar a quem quer que fosse, desviando-se assim de problemas de qualquer natureza. Sempre “dava um jeito” de evocar a memória de Jesus, todavia seu tratado se detivera no Êxodo, uma boa razão para que o último daqueles adjetivados como “conciliadores” estudados fosse Moisés.
[Nota do Blog Primeiro Discípulo: Para Martinez de Pasqually o Cristo era uma espécie de “peça” no grande esquema cósmico destinado a reintegração, tinha suma importância como parte de um todo … mas não era, de forma nenhuma, o centro em torno do qual sua doutrina e cosmologia viriam a se desenvolver.]
Saint-Martin, Hauterive, Willermoz e os discípulos lioneses são, antes de qualquer outra coisa, cristãos e não partilhavam da mesma indiferença de seu mestre; para eles, é de suma importância, aplicar o simbolismo, o vocabulário e as teorias dos Cohen aos Evangelhos. Eles não viam o Cristo somente como UM DOS reconciliadores, um sábio entre outros sábios inspirados… Consideravam Cristo como DEUS FEITO HOMEM, o ÚNICO REDENTOR do mundo. Eles ensinavam que Jesus substituíra a Adão para cumprir a tarefa na qual esse fracassara e assim exercer justiça contra o Maligno, todavia exercendo sobre o homem a misericórdia. Seu sacrifício ultrapassaria infinitamente o de Abel, Abraão, Moisés e Salomão (9). É a “operação” perfeita, graças a qual o homem obteve o favor de “segundo nascimento espiritual”. Também atribuíam uma grande importância a Eucaristia, sacramento e sacrifício ao mesmo tempo, que perpetua, na igreja, o santo sacrifício do calvário.
[Nota do Blog Primeiro Discípulo: Curiosamente, temos em nossas fileiras homens que parecem querer completar a obra do Maligno ao invés de se aterem a obra da retificação. Não é incomum ouvir falar em “cristo cósmico”, “espírito crístico”, na tentativa de “diluir” a importância de Nosso Senhor negando assim aos novos aprendizes a possibilidade de realizar a obra da reintegração… Todavia os próprios Cohens de Lyon (afastando-se das fantasias de Pasqually) reafirmaram a autoridade espiritual da igreja no que tange a transmissão da verdade… sendo Cristo, a própria verdade e sendo a Eucaristia, a forma que ele se dá aos homens. Tais dissimuladores inventam uma doutrina para si, perdem-se em seu círculo de loucuras e põe a perder aqueles que chamam de irmãos. Seu trabalho de desconstrução é tão pueril (embora às vezes seja eficaz) que chegam a dizer: “Quando falamos em Cristo aqui, estamos falando de Yehoshua”, como se a partir do momento em que falássemos “bat” passássemos a ter um animal diferente de morcego, ao falar “perro” deixássemos de ter um cachorro ou se a palavra “vache” desse a nossa amada vaquinha asas para voar ou capacidade de falar em línguas… Em suma, assim como Sha'ul; Šāʼûl , Saul e Saulos não dividem nosso amado apóstolo em quatro pessoas diferentes de Paulo, assim também Yehoshua é a mesma figura de Nosso Senhor Jesus Cristo tal qual nos revelam os Evangelhos e cuja memória é perpetuada pela Santa Madre Igreja Católica.]
Mas Pasqually tinha apreços menos ortodoxos acerca da religião cristã, considerando que - em suma - não existia nada mais do que uma única religião sendo tudo mais modificações do culto perfeito que Deus havia destinado ao menor espiritual (11) “O verdadeiro culto cerimonial foi ensinado a Adão depois de sua queda pelo anjo reconciliador, sendo santamente operado por seu filho Abel em sua presença, restabelecido por Enoch, que formou discípulos, e foi posteriormente esquecido em toda a terra, foi restaurado posteriormente por Noé e seus filhos e renovado por Moisés, Davi, Salomão e Zorobabel, sendo finalmente aperfeiçoado por Cristo em meio aos doze apóstolos durante a última ceia".
Certamente, nessa cadeia de eventos dedicados a misericórdia, o cristianismo era um dos mais importantes elos, mas também a franco-maçonaria ocupava seu lugar juntamente a outras tradições que não procediam da tradição bíblica. Os Cohens estavam convencidos de que todas as formas de religião não eram nada além dos restos degradados do “verdadeiro culto ao Eterno” e que entre elas havia correspondências secretas. As igrejas cristãs não haviam conservado - de maneira mais acertada - a verdade mais do que as outras tradições existentes. Defendia ainda que os sacerdotes tinham perdido o sentido do culto que celebravam. Mas Pasqually seria, felizmente, um dos que possuíam as verdadeiras chaves. A lenda maçônica do grau de Mestre, encontrou aqui uma aplicação fácil: os Cohens tinham encontrado a palavra perdida sob a direção de Martinez.
[Nota do Blog Primeiro Discípulo: Curiosamente, aqueles entre nós que se julgam grandes e sábios livres pensadores e que criticam as igrejas cristãs acusando-as de arrogar para si o “monopólio” da verdade, não observam o caráter sectário evidente nos Cohens e nos ensinamentos de seu “guru”.
O Dicionário Enciclopédico das Religiões define que uma seita é um “conjunto de pessoas que professam uma doutrina diversa da geralmente seguida”. Também assinala “um grupo de pessoas que se separa de uma comunhão principal ou de uma determinada religião”. Ou ainda: teoria de um mestre seguida por prosélitos. Suas principais características são: a) ruptura com a sociedade maior; b) obediência total a um chefe ou guru “carismático”; c) tendência ao segredo; d) emoção e afetividade mais acentuadas do que o raciocínio; e) militantismo ou proselitismo; f) culto caloroso; g) expectativa de intervenção divina.
Como se pode ver na definição acima, o pensamento de Pasqually e a plena aceitação do mesmo fora dos círculos de Lyon (e até dentro deste) reveste-se COMPLETAMENTE de caráter sectário (o que teoricamente deveria ser repelido por maçons).]
Jean-Baptiste Willermoz aderiu a ideia de que o segredo do verdadeiro culto havia sido transmitido de era em era por alguns iniciados. Tentou traçar aproximações entre o cerimonial dos sacrifícios do antigo culto e o cerimonial instituído por Jesus Cristo (13). Nessa época fazia cópias de um fragmento de texto de São Basílio de Cesareia e de uma carta escrita por Inocêncio I ao bispo Decentius, julgava que nesses extratos estavam as provas de que o cristianismo primitivo era um mistério que apenas alguns fiéis conheciam (14). Daí a imaginar que teria compreendido tal mistério foi só uma questão de tempo.
Os Cohens de Lyon se achavam perfeitamente autorizados a buscar analogias entre a religião cristã e a religião de Pasqually a fim de corrigir, explicar e completar uma com a outra. O “livro das orações a cada seis horas” que se parece com o “livro das horas”, composto para o fies ordinários, contém muitas transposições de preces e muitas fórmulas significativas desse estado de espírito (15). Entre os escritos deixados por Jean-Baptiste Willermoz, se encontra também o curioso apontamento a seguir, durante a elevação, que parece ter sido escrita pela própria mão de Saint-Martin. Associa intimamente o triângulo maçônico, a mística dos nomes divinos, a invocação ao Deus quaternário e a chamada a os espíritos maiores, com a devoção ao Cristo presente na hóstia consagrada; eis tal qual é esse estranho texto:
"No instante em que o sacerdote toma a hóstia para consagrá-la, colocam-se os dois joelhos em terra faça-se , com o polegar da mão direita em esquadro, uma cruz sobre o coração, na parte oposta e no alto do estômago, o que faz um triângulo; faz-se uma quarta cruz sobre a boca, dizendo três vezes: Kadosh. No momento da a elevação se diz: conjuro vos, Angeli, archangeli, Cherubini et Serafini, pelos santos nomes de Deus, a interceder por mim perto do Criador todo-poderoso... In quacumque die invocavero te, velociter exaudi me per Christum filium tuum. Amen".
Todo esse ecletismo pareceria sacrilégio ou pelo mesmo surpreendente, caso não se levasse em consideração que isso demonstra a profunda convicção destes iniciados, bem como seus esforços, para associar a sua nova fé com a sua religião tradicional.
[Nota do Blog Primeiro Discípulo: Não temos toda essa “boa vontade” do autor do livro … Qualquer um que conheça a sã teologia cristã e o catecismo católico percebe que essa usurpação do sagrado é sim ação profanadora e sacrílega, constituindo uma verdadeira aberração comportamental ante a sagrada liturgia … Lembramos as santas palavras do evangelho: “Toda planta que meu Pai celestial não plantou será arrancada. Deixai-os! Eles são guias cegos guiando cegos. Se um cego conduzir outro cego, ambos cairão no buraco” - Mt. 15:13-15; ou ainda “Aqueles que guiam este povo são os mesmos que o desorientam, e aqueles que são guiados deixam-se seduzir e ser conduzidos ao erro.” - Isaías 9:16]
Mas por acaso isso pode surpreender alguém? mesmo depois de olhar o que resta dos escritos de Willermoz sobre as conferências no templo Cohen de Lyon? Se os Cohens de Lyon não tivessem aprendido, graças a fé de seu mestre, a conciliar as diversas noções contraditórias que se apresentavam ante eles, não separando a “potência eterna” da “criação universal”; a fundamentar um ensinamento moral e religioso sobre o livre arbítrio dos seres espirituais, recusando esses mesmos seres a toda existência e todo pensamento fora de Deus; a atribuir ao Maligno a iniciativa e a responsabilidade pela criação do mal, crendo em um Deus único e apenas criador. Enfim, poderíamos estender em muito a lista das dificuldades dessa teosofia.
É sábio fazer isso se desejamos compreender aqueles que, sem serem afetados pela debilidade mental, se consideram “os puros”? Contemplar o mundo da iluminação através do vidro do bom senso e da lógica, assim como uma crítica fria, é correr o risco de não perceber mais do que uma imagem distorcida e caricaturada. A razão não é a fonte das convicções do místico. Ele vê, sabe e crê em tudo primeiro, sua razão só se exerce depois, sobre uma matéria que não pode mudar, assim como faz o físico ao construir uma ciência a partir dos dados que observa. Os Cohens aceitaram de Pasqually uma fé muito desordenada com elementos díspares que podiam ressentir sua “ciência religiosa”, e com certa frequência tendiam a cair no estranho e no absurdo.
[Nota do Blog Primeiro Discípulo: O parágrafo acima é bem interessante. O autor aqui basicamente sintetiza o que é o pensamento ocultista / esotérico , tanto daquela época como o atual. Teses e proposições como as de Pasqually (Assim como as de Blavatsky, Kardec, Lewis, Levi, Crowley, Leadbeater, Gerard Encausse, Annie Besant, Mathers e outros.) só se tornam palatáveis a partir de uma adesão cega e acrítica daqueles que as abraçam. Provas e coerência argumentativa não são necessárias ou sequer desejáveis. O autor ainda tenta salvar a questão emprestando-lhe ares de metodologia científica ao propor uma analogia do trabalho do pseudo-místico com o de um físico - certamente isso provocaria risos em alguns setores acadêmicos.
Seja como for, a doutrina de Martinez não passava de um emaranhado de teorias confusas, inacabadas e vazias de sentido tanto para o judaísmo quanto para o cristianismo; propomos para reflexão dos irmãos que tudo aquilo que se caracteriza como judaísmo-cristão acaba sempre não sendo nem judaico, nem cristão.
Willermoz e Saint-Martin tiveram que fazer um esforço gigantesco - com resultados para lá de duvidosos - para tentar arrumar a arruaça doutrinal deixada por seu mestre e adaptá-la o máximo possível as idéias cristãs mais ortodoxas, com o fim de deixá-la mais admissíveis para os irmãos do Templo Cohen de Lyon, todos eles cristãos. Para nós, no entanto, tudo o que eles conseguiram fazer de fato foi encobrir os erros de seu mestre com sofismas diversos - ainda que muitas vezes de forma que parece involuntária - cuja adesão só seria possível para aqueles que adotassem a posição cega e acrítica sobre a qual nos referimos poucas linhas atrás; e assim como nos dias de hoje, naquela ocasião também não era difícil encontrar homens dispostos a tal. Isso se dá pelo fato de que teorias como as de Pasqually exercem grande fascínio por parecer corresponder com à sede do maravilhoso e da experiência mística que os homens trazem em seu íntimo. É preciso reconhecer porém que através da história da humanidade, a fantasia e a imaginação muitas vezes preponderam sobre o racional e o lógico, especialmente quando em jogo parece estar a aquisição de poderes secretos, grande sabedoria ou uma pseudo importância cósmica que eleve o homem a um nível acima daquele que a insignificância da existência humana lhe parece sugerir.
Assim, as respostas apresentadas aos discípulos em Lyon acerca das questões universais e a promessa de grandeza àqueles que a elas aderissem seduziram fortemente aquele grupo (especialmente Saint-Martin e Willermoz); todavia, tudo o que ali era proposto não passava de divagações imaginosas, desprovidas de fundamentação racional, histórica ou teológica que as corroborasse. Aqueles que as aceitaram no passado, assim como os que com ela flertam no presente, o fizeram - como bem pontuado pelo autor - sem qualquer sombra de evidências lógicas, de correspondência com a verdade, racional; baseando-se única e cegamente no “ensinamento do guru”. Lembramos a nossos leitores, homens livres e de bons costumes, que a fé cega é característica do fanatismo e da superstição - coisa que a maçonaria se propõe a combater. Ora, a fé autêntica, embora ultrapasse os limites da razão, não dispensa o seu crivo. Quem se afasta dos parâmetros da razão e da lógica, sujeita-se a cair no mais grosseiro dos erros: a mentira]
Willermoz certamente não tinha muito bom senso para dar-se conta das possíveis heresias ou contradições que o pensamento de Pasqually continha (16). Dedicava tanto esforço para compreender a teoria da Reintegração, que é bem possível que tenha acabado se perdendo em alguns momentos dado a complexidade da mesma, o que ocultava-lhe aquilo que poderia ser tido como algo aventureiro. As exegeses originais de Pasqually lhe pareciam completar as lacunas bíblicas, oferecendo interessantes explicações que o vulgo ignorava. Estava tomado de grande prazer por integrar o pequeno número de Elus Cohens, homens especialmente selecionados por mostrarem-se aptos a conhecer segredos maravilhosos e a renovar as tradições do verdadeiro culto. Para ele, isso já era o suficiente. A íntima satisfação de pertencer a uma “aristocracia secreta de iniciados de altíssimo grau” já compensava as aflições, preocupações, dificuldades e decepções de todos os tipos que frequentemente encontrava ao percorrer a sinuosa estrada a qual Martinez de Pasqually lhe apresentara como caminho.
Não há lista dos membros do Templo de Lyon no correr daqueles anos. Não obstante, o pequeno número de discípulos iniciais ia aumentando à medida que o tempo passava. Temos documentado uma única recepção ao Templo, a de um irmão estrangeiro, o Barão de Eyben, que recebeu a 16 de fevereiro de 1.774 os três graus simbólicos e o grau de Mestre Elu. Sabemos que alguns irmãos da Ordem Retificada: Braun, Bruyset e Marc Revoire de Chambery tinham sido admitidos entre o número de iniciados. Assinalamos que todos eles eram debutantes, aos quais convinha ensinar a doutrina Cohen antes de ensinar o culto. Já no círculo místico, o número de Reau-Croix ficou extremamente restrito, é bem possível que em Lyon, a exceção de Willermoz, não tenha havido ordenação suprema. Uma certa Mademoiselle de Brancas chegou ser iniciada, mas para que fosse admitida nos graus superiores faltava a autorização do Soberano Mestre, o que Caignet de Lestere recusou, dado que não confiava em mulheres. Saint-Martin aprovara tal decisão, julgando que não devia receber na ordem apenas um número pequeno de irmãs, ainda assim examinadas muito escrupulosamente. "Eu apoio o artigo de nossos estatutos que defende que não devemos recebê-las sem uma prova direta e física da própria Coisa"
Já a irmã de Willermoz, Madame Provensal, fora submetida a apreciação de forma muito mais indulgente. Ela era exceção. A “pequena mãe” conciliava suas ocupações de boa dona de casa, a educação dos seus filhos e as suas obrigações familiares, com os seus deveres de frente aos amigos da ordem e seus exercícios espirituais. Uma vida tão completa era paga com graças místicas. No verso de uma invocação, copiada para seu uso por Louis-Claude de Saint-Martin, vê-se uma recitação curta que teria sido escrita por ela e que demonstra o clima de “exaltação e de milagre” em que viviam os Cohen de Lyon (19).
[Nota do Blog Primeiro Discípulo: A essa altura já não podemos falar dos Cohen de Lyon sem pensar em um grupo revestido com todas a características de uma seita… inclusive o maravilhamento constante a respeito da espiritualidade que imaginam estar vivendo.]
1 de março de 1.777 - "Pedidos feitos e respostas sentidas, que desejo não esquecer nunca, pelo efeito que me causaram:
-O que exige de mim?
- Que me ame
- Continue falando comigo, é você em corpo?
- Sim, eu sou
- Você já disse duas vezes mas duvido ainda de ti.
- Trema para a terceira!
- Perdoe-me ainda esta pergunta. Qual é então seu corpo?
- O que terei no julgamento.
Aqui minhas agitações e o trabalho de dois dias cessaram. Deus vele para que todos os homens experimentem o momento delicioso que que eu experimentei entre meia e uma hora, ante a lareira do salão, após uma comunicação que Deus me tinha permitido fazer…”
Tais fenômenos deviam representar para Willermoz preciosas provas de que a ciência de Pasqually era verdadeira e que seu método era eficaz. E a medida em que lhe depositava mais fé, desejava também ver sua doutrina ensinada e praticada em um templo digno dela.
Todavia tal idílio teve tempo de vida limitado, podendo causas de tal rompimento serem bem menos românticas ou espiritualizadas do que desejado pela maioria. A sociedade dos Elus Cohen atendia cada vez menos aos anseios pessoais (não necessariamente espirituais) de Jean-Baptiste Willermoz. A morte de Don Martinez não havia trazido nenhuma melhora na constituição organizacional da ordem, em teoria sua hierarquia era simples e lógica (20). Um Grande Soberano era responsável pela direção central da Ordem, com um substituto Geral para a França. Logo após vinham os Reau-Croix, instrutores de seus irmãos, centralizando-se na família de Pasqually. O seu filho, que tinha sido ordenado por seu próprio pai, desde seu nascimento era um membro da Ordem muito importante, pois era alvo da esperança dos irmãos de que herdaria o dom do pai, estando assim amplamente apto a ser, um dia, o Grande Soberano.
Enquanto isso, Caignet de Lestere apresentava dificuldades para dirigir a Ordem a partir de Santo Domingo, raramente se recebiam notícias dele. Seu papel parecia limitar-se a enviar para a França o que restava dos trabalhos de seu finado mestre (21). Todavia ninguém pareceu inquietar-se a respeito de quem receberia ou não a autoridade soberana na Ordem.
Willermoz não demonstrou preocupações quando foi informado que o segundo sucessor de Pasqually se chamava Sebastian de Las Casas (22), afinal Las Casas não parecia se esconder dele. O Substituto Geral de Serre desempenhou suas funções com grande discrição. Só sabemos que em 1778 ele ainda tinha a custódia do jovem Pasqually, que acabara de se casar, e que foi para ele que o Abade Fournié solicitou autorização para copiar e distribuir documentos vindos da América.
No âmbito geral os Reau-Croix estavam sem liderança de fato e entregues a seus próprios cuidados. A Ordem estava abandonada ao acaso e a propagandas individuais. Os círculos de La Rochelle, Marselha e Libourne, simplesmente deixaram de existir; os irmãos que a eles haviam pertencido estavam dispersos, alguns acabaram se unindo a lojas do Grande Oriente. No entanto, aqui e ali, subsistiam alguns Templos, como os de Lyon, Versalhes e Toulouse, estando pendente ainda o tema da criação de uma nova oficina em Meaux (23) . A dispersão acontecia nas lojas em geral: Bacon de la Chevalerie tentava desprezar a memória de Pasqually, o Marquês de Lusignan deixava pouco a pouco a dedicação às atividades com “a coisa”. Todavia alguns resistiam; Champollon, Grainville, Willermoz, Hauterive e Saint-Martin; assumiram o papel de propagandistas e de sustentar as bases do pensamento da sociedade Cohen. Cada um livremente assumia uma posição. O ex-secretário de Martinez, o abade Fournié, permaneceu em Bordeaux ao lado da viúva de seu mestre, considerando-se sempre como o Secretário da Ordem. Willermoz mantinha correspondência ativa com ele (24) e lhe enviava uma pensão de 150 libras. A abade guardara consigo a lenda do teurgo desaparecido e por um mimetismo mais ou menos consciente havia assumido a tarefa de substituí-lo; assim como seu mestre, compunha obras inspiradas e se dizia favorecido pelas graças maravilhosas; os espíritos puros operavam durante horas sob suas ordens. Dizia ver o fantasma de Pasqually; conversava com seus parentes desaparecidos; viveu uma espécie de prefiguração os dias de sua própria morte. Saint-Martin admirava muito seus múltiplos dons espirituais, todavia parecia não apreciar a forma com que esse os explicava: “É um anjo puro de coração e pela caridade”, escrevera Saint-Martin, “é um verdadeiro escolhido por sua inteligência; quanto aos favores físicos não sei se nosso falecido mestre recebera-os em tão grande número e de forma tão direta… Mas o que lhe acontece, de forma contínua, consegue explicar expressar de maneira mais inteligível nos discursos do que em suas cartas, onde verdadeiramente não conhece três quartos daquilo que quer dizer” (25).
Apesar dos edificantes milagres, não havia dúvida de que a Ordem desagregava-se mais a cada dia. Pior ainda, seus segredos eram espalhados entre os profanos, correndo os salões, sendo objeto de conversações de principiantes nos estudos do oculto, dos mistérios. As ideias e os feitos que eram considerados sagrados por Willermoz eram publicamente discutidos e deformados. Em 1.775 Willermoz foi informado de que Bacon de La Chevalerie estava a falar demais, e sem justificativa, a respeito da pessoa do Pasqually. As reprovações que acreditou ser seu dever dirigir-lhe foram mal recebidas. O Substituto Universal não queria receber lições de ninguém sobre sutileza ou sobre indiscrição. Pretendia seguir só, e simplesmente, o exemplo do “audaz Martinez” que não fazia nenhum mistério acerca de seus dons e teorias (26). Pode-se acreditar que foi Bacon que expos as doutrinas Cohen a alguns de seu amigos do Grande Oriente que haviam demonstrado-se curiosos a respeito dos segredos maçônicos que continham. Mas ele não era o único culpado; o principal responsável pelo interesse indiscreto que havia sido despertado no público sobre o os trabalhos secretos dos místicos franco-maçons era na verdade o mais zeloso dos Reau-Croix: Louis Claude de Saint-Martin.
Saint-Martin nunca havia dado uma excessiva importância à regras e formalidades; o que havia de “humano e de jurídico” na ordem Cohen lhe pareciam cada vez mais um peso desnecessário. Em Lyon, já havia experimentado problemas como membro de uma pequena capela. No futuro, estava disposto a não mais alienar sua liberdade sob o peso de regras humanas. É fato que em 1.776 ele até aceitou desempenhar papel de oficial junto aos irmãos de Toulouse, mas o fez por caridade e sacrifício pessoal. De qualquer forma, já em 1.774 havia dado passos decisivos para fora dos limites da maçonaria, quando escreveu seu livro: “Dos Erros a Verdade”, não para edificar e instruir um pequeno e seleto número de iniciados, mas para expor a sua fé espiritualista a uma multidão de homens. De forma bastante insensível, a visão do mistagogo deu lugar a visão do autor e o zelo para com a ordem deu lugar às preocupações do homem de letras, tão somente interessado em ver nascer a sua obra.
O que realmente era alvo das preocupações de Saint-Martin era conservar seu anonimato, valendo-se disso para a difusão de seu livro. Buscou envolver seus amigos de Lyon para propagar seu livro. Todavia a venda ia muito mal, não provocando qualquer interesse em nenhuma das duas partes alvo, os teólogos e os materialistas (27). A peça todavia chamou atenção daqueles que amavam a crença em mistérios e no espiritualismo maravilhoso (28). Logo, o “Filósofo Desconhecido” virou o alvo preferido das conversações dos salões onde, entre um gole e outro, a discussão de temas como religião, mística e ciências ocultas; com os Lusignan, com a duquesa de Bourbon, irmã do duque de Chartres, Grande Mestra das lojas femininas, muito curiosa pela religiosidade e os mistérios, e com Madame da Croix, era muito apreciado.
Genevieve de Jarente, viúva do Marquês de la Croix, que havia sido tenente-geral em Espanha, conheceu Saint-Martin em 1.776 (29). Logo depois passou a compartilhar e exaltar com entusiasmo suas ideias e a buscar-lhe amizade. Ofereceu-lhe generosamente hospedagem unicamente pelo benefício de tê-lo por perto e assim aprender suas lições. Saint-Martin no entanto não tinha grandes ilusões acerca dela. Caignet de Lestere recusou admiti-la nos graus elevados dos Cohen, e as potências espirituais interrogadas pareciam dar razão à desconfiança do sucessor de Pasqually. A "Coisa" não havia se manifestado para julgar esta "mulher de desejo", seu amigo estava aberto o máximo que podia… “Eu nunca vi uma pessoa tão atenta e ‘ardente’”. Ele estava tentando estabelecer em suas relações com ela uma “moderação sábia”, a fim de salvaguardar sua liberdade e sua própria reputação; tanto para um como para o outro, o "gancho" de uma amizade tão invasiva era assustador.
Confiante em si mesmo, seguiu com diversão e indulgência a rápida marcha dessa senhora em direção a perfeição espiritual, “às vezes a galope, as vezes devagar”. E embora sua proximidade com ela lhe tenha coberto com um “verniz singular”, isso não prejudicou seu sucesso no mundo parisiense. Embora tenha se defendido em alguns momentos nas cartas que direcionava aos contatos de Lyon, vê-se que Saint-Martin sem dúvida desfrutou de uma certa satisfação em suscitar altas questões de espiritualidade com grandes senhores, mulheres ilustres e eclesiásticos importantes, assumindo junto a alta sociedade de sua época um certo “charme” de caráter enigmático, lisonjeador e agradável.
Willermoz considerava essa frívola conduta de Saint-Martin reprovável e julgava com severidade as suas novas relações; o êxito mundano do “filósofo desconhecido” não era suficiente para merecer-lhe uma atenuação de humor. Estava em guarda contra aquilo que considerava perigoso e indiscreto, bem como com o obcecado interesse de Saint-Martin a cerca de opiniões duvidosas (30) e sem moderação; advertia-o ainda sobre a duvidosa reputação de Madame de la Croix.
Mas haviam outras razões para inquietar-se. O cavaleiro de Grainville propôs em 1.778 a pequena comunidade uma espécie de questionário, fruto de sua meditação, que tendia à um novo sistema, quer de explicações doutrinais, quer de cerimônias teúrgicas (31). Para um homem comprometido, como era Willermoz, com o desejo de conciliação e união, tais iniciativas eram perigosas e mostravam o desregramento em que se encontravam os cavaleiros Cohen mais antigos.
Por outro lado, entre os maçons curiosos pelo ocultismo, criavam-se lojas cuja concorrência era reduzida. Um certo “Rito Escocês Filosófico”, que se pretendia herdeiro de uma “Loja Mãe Escocesa de Avignon”, proscrita no condado, havia fundado na antiga Loja de São Lázaro uma oficina sob o nome de "São João da Escócia" ou "Contrato Social". Apesar da oposição do Grande Oriente, que se esforçava para parar seu progresso e manter sua influência longe das lojas regulares que lhes pertenciam, eles recebiam grande volume de correspondência de outros maçons interessados… O sábio orientalista Court de Gebelin deu em 1.777 sete conferências sobre sua simbologia. Os progressos do Rito excediam em muito os da Ordem dos Cohen e os da Estrita Observância (32) .
Outra loja parisiense, a dos “Amigos Reunidos”, organizava, em seu seio, uma sociedade consagrada a busca dos segredos maçônicos: a Ordem das Filaletas; fundada por um certo Jean-Paul Savalette de Lange, filho de um tesoureiro real, e ele próprio um oficial de finanças (33). Tal loja parece ter existido desde 1.771. Naquela ocasião tinha como regra não admitir nenhum irmão provindo da maçonaria regular.
A reorganização da Grande Loja da França fez mudar as disposições particulares da loja "Os Amigos Reunidos". Em 21 de junho de 1.773 (34) “ao som dos instrumentos e ao ruído do salitre [sic]” recebeu ai o respeitável irmão Anne de Montmorency-Luxembourg, Administrador de todas as lojas regulares da França. O próprio Savalette logo entrou nos Conselhos do Grande Oriente ocupando todo tipo de funções na Câmara de Administração, e nas províncias; em 1.777 torna-se Secretário de toda a associação. Um grande número de Irmãos distintos, nobres, burgueses afortunados e artistas foram membros de "Os Amigos Reunidos"; em 1.774 eram membros dela o conde de Srtoganoff, Tassin del Etang, o Visconde de Saulx Tavannes, o Abade Rozier, o Marquês de Clermont-Tonnerre, o pintor Hubert Robert e o diretor da Companhia de Indias Jean-Francois de Mery d'Arcy, etc, etc.
Instigados por Savalette, os "Amigos Reunidos" constituíram em 1.775 uma comissão encarregada do estudo das ciências secretas e da busca de vias que poderiam conduzir à verdade. Este movimento desembocou uns anos mais tarde na Ordem dos Filaletas, hierarquia de doze classes (35) que conduziam o irmão de "Os Amigos Reunidos" ao título supremo de "Amigo da Verdade". A sociedade defendia-se de não ser outra coisa que uma sociedade de estudos e de buscas desinteressadas, sendo também eclética, tanto na escolha de suas doutrinas como na de seus membros, deixando a cada um a maior liberdade.
Ninguém além do Grande Mestre dos Filaletas se encontrava à espreita da ciência hermética e dos diversos segredos com tamanha intensidade; a sua curiosidade não se estendia apenas às sociedades maçônicas, mas a todo tipo de seitas místicas não somente de França mas de todo lugar possível. Esforçava-se por conhecer detalhes de sua composição bem como sobre suas doutrinas, interessando-se especialmente nas opiniões que se professavam sobre o mundo imaterial e as relações do homem com os espíritos. Desde 1.775, vemos-lhe "desocupado e curioso" (36) , dando voltas ao redor do Filósofo Desconhecido, e oferecendo seus serviços para expandir seu livro. Saint-Martin desconfiava de sua indiscrição, achando-o pouco dotado para a "Coisa". Mas com ou sem a ajuda de Saint-Martin, ele soube obter informações sobre os segredos dos Cohen. Seus informantes foram, sem dúvida, o Abade Rozier ou Bacon de la Chevalerie, que falaram por moto pessoal, assim como certos “amigos reunidos” que foram aceitos entre os Elus Cohen: Saulx Tavannes, introduzido por Hauterive e que era amigo de Saint-Martin, o saxão Tieman de Berend (37), que mantinha contínuas relações com Willermoz e com o Templo dos discípulos lioneses.
Não há necessidade de pensar, como visto no livro sobre a franco-maçonaria francesa de Bord, que Savalette houvesse sido iniciado diretamente, para utilizar-se da analogia de suas ideias com as dos discípulos de Pasqually.
Seja como for, Willermoz encontrara nesse meio um verdadeiro centro místico do Grande Oriente e o mais fraterno apoio para seus projetos; graças a ele, pôde ver aprovadas pelo órgão diretor da maçonaria francesa as suas lojas reformadas do Rito Alemão. A primeira loja regular que solicitou relações com “La Beneficencia” foi justamente a “Os Amigos Reunidos”. Em 1.777 os dois círculos ocultos de Lyon e Paris buscavam tratar-se bem e trocar todo o tipo de boas experiências.
Mas não obstante as relações amistosas, o que Willermoz constatava a respeito da prosperidade dessa ordem não podia deixar de lhe inquietar, isso dado sua preocupação com o futuro das ordens que lhe interessavam diretamente: Os Cohens e a Estrita Observância. De fato ele estava já Irritado com os defeitos de um e de outro, mas não podia desprender-se deles. Seu desejo por desempenhar um importante papel pessoal e poder dirigir, ele mesmo, uma ordem maçônica a seu gosto, o levariam a lançar-se a inovações aventureiras. Possuía uma profunda fé na parte moral, dogmática e a nível de culto da ordem de Pasqually. A reforma templária do Barão Hund o agradara pelas qualidades mais externas, pela religiosidade de suas cerimônias e pela sua ritualística, parecendo-lhe bastante adequada para conduzir o maçom iniciante em direção a uma instrução superior, ao mesmo tempo em que o número de lojas na Alemanha, Escandinávia, Suíça e Itália, constituíam em si um vastíssimo campo para possível propagação.
Pouco a pouco, Willermoz foi amadurecendo projetos de sérias reformas, com o fim de unir o melhor que os dois grupos (Cohens e EOT) possuíam. Os quadros da Estrita Observância Templária porventura não poderiam servir para divulgar os ensinamentos Cohen? Não era essa já a hora de fundar uma sociedade capaz de atrair os “homens de desejo”, agrupando-os, e sob uma direção bem ordenada ensinar-lhes a verdadeira doutrina ao invés de assisti-los perdidos em vãs buscas? Sobre essas questões e seus projetos tratou-os com Paganucci, amigo que sempre o apoiava, com Perisse Duluc, um dedicado discípulo seu que sempre havia sido bom confidente em todas as suas experiências secretas, seu irmão o doutor Pierre-Jacques (39) . Os primeiros só eram colaboradores dos fiéis reflexos de seu pensamento. Quanto ao doutor, como vivia em Lyon nessa data, não temos nenhum testemunho do que pensava, nem se Jean-Baptiste o havia procurado mais uma vez em busca de conselhos.
Notas:
1 - Nota do Blog Primeiro Discípulo: Essa curiosa proposição mostra o quanto os Cohens estavam perdidos em suas fantasias e na arrogância que as mesmas geravam. A salvação dos homens é individual e só é possível por meio de Nosso Senhor Jesus Cristo, diz a escritura: “portanto, não há salvação em nenhum outro ente, pois, em todo universo não há nenhum outro Nome dado aos seres humanos pelo qual devamos ser salvos!” (At 4:12).
2 - Lyon, ms. 5476, p. 18. “(Adão) foi regenerado como todos os homens por Cristo. A graça de sua regeneração tem buscado sua reconciliação pessoal, mas sua reintegração a seus direitos lhe foi negada até a purificação universal de sua posteridade”.
3 - Lyon, ms. 5476, p. 25. “O criador quis que o príncipe da corte demoníaca fosse capaz de governar seu pensamento maligno em todo o seu império, e que essa triste similitude, fonte de seu crime, fosse conservada até que seu arrependimento a fizesse cesar”. Pasqually apenas abordou levemente a questão do arrependimento do maligno, não apresentando para isso nada além de soluções contraditórias,
4 - Lyon, ms. 4276, p. 25. “A ciência do mal só pode cessar com o arrependimento daqueles que a professam e que são incapazes de arrependerem-se por si mesmos, se tal sentimento não lhes for sugerido pelo único ser que teve o poder, mas que infelizmente seduziram, arrastando-o com eles".
5 - Lyon, ms. 5476, p. 4. “Se a misericórdia deseja operar qualquer coisa - a favor dos perversos - será mediante a comunicação do homem”
6 - Lyon, ms. 5476, p. 5. “O homem não pode esperar uma comunicação direta (com Deus) a não ser após a sua reconciliação, que não pode ser perfeita enquanto dure seu curso temporal”.
7 - A questão do “intelecto” é bastante obscura, as instruções proporcionam numerosas explicações a respeito do tema. Elas assinalam que o “intelecto bom” não é um ser especial, sendo uma “emanação momentânea” do espírito maior, destinada a uma ação passageira a favor da alma a qual o espírito deseja unir-se (p26).
8 - Lyon, ms. 5476, p. 6.
9 - Lyon, ms. 5476, pp. 5, 6 y 18.
10 - Lyon, ms. 5526. Anotações de Willermoz concernentes a Eucaristia e a Missa.
11 - Lyon, ms. 5476, p. 21. "O homem, ser espiritual menor, tinha que operar um culto; puro e simples, mas ao degradar seu ser e desnaturalizar sua forma, seu culto mudou, tornando-se um culto cerimonial”
12 - Lyon, ms. 5476, pieza 21.
13 - Lyon, ms. 5526. Extrato fechado de 24 de Julho de 1.777.
14 - San Basilio, De Spiritu, cap. 27. As passagens são citadas no livro de J. Gramdas “As Antigas Liturgias”.
15 - Por exemplo a “Salve Rainha” dos Cohen: “Eu a saúdo Rainha dos Anjos, oh mãe de misericórdia, vida, doçura e esperança nossa. Volta a mim vossos bondosos olhos e sede minha advogada, quando eu sair dessa prisão tenebrosa na qual me encontro, etc.” 5526, p. 1, p. 80.
16 - Nota do Blog Primeiro Discípulo: Discordamos aqui do autor, cremos que se ele não tivesse não teria feito os esforços que fez para trazer modificações onde trouxe. No entanto cremos que mesmo sendo homem sábio e de bom senso acabou deixando-se levar por algumas dessas teses, aderindo completamente a elas. Ou seja: cremos que ele modificou algumas com correções necessárias, aderiu a outras e cobriu outras com argumentos sofísticos no intuito de que sobrevivessem apesar dos erros evidentes.
17 - Lyon, 5476, p. 11.
18 - Papus, Saint-Martin, pp. 146-147.
19 - Lyon, ms. 5471, p. 36.
20 - Esta hierarquia encontra-se indicada no tomo "Orações particulares a dizer para a Ordem dos Elus Cohen do Universo, que contém a contagem de orações de seis em seis horas", de Jean-Baptiste Willermoz.
21 - Saint Martin fez alusão sobre o envio de pacotes por parte de Caignet em suas cartas de 28 de março a 2 de agosto de 1778. O abade Fournier menciona um pacote da América em uma carta de 23 de julho de 1.778 - Lyon, ms. 5472, p. 2.
22 - Nueva Noticia, pp. LXXXVI y LXXXVII.
23 - Papus, Saint-Martin, cartas p. 135. Era um tal de Corby que havia proposto tal empreendimento.
24 - Lyon, ms. 5472, pp. 1 a 10.
25 - Papus, Saint-Martin, p. 143, carta de 30 de julho de 1.775.
26 - Lyon, ms. 5472, p. 12. Carta de 24 de setembro de 1.775. Esta carta se encontra reproduzida na obra de M.P. Vuillaud sobre os Rosa-Cruzes lioneses e em M. Van Rijnberk sobre Don Martines de Pasqually.
27 - Papus, Saint-Martin, p. 138.
28 - Nota do Blog Primeiro Discípulo: Ou seja, atraiu justamente o mesmo público de hoje.
29 - As informações que Willermoz havia procurado obter a respeito dela, às quais Saint-Martin respondeu em 6 de julho de 1776, mostraram suficientemente que naquela época as relações de Madame de la Croix com Saint-Martin e o círculo Cohen eram recentes. Papus, Saint-Martin p. 139.
30 - Papus, Saint-Martin, p. 150. Saint-Martin se defendía dessa última reprovação declarando não querer se passar “por charlatão ou por imbecil”
31 - Não encontramos documentos que expliquem em que consistia esse “novo sistema”. Saint-Martin fala sobre esse questionário em sua carta de 11 de abril de 1.778, mostrando sobre o mesmo pouco interesse. Julgava que Grainville "não estava tão avançado", tal foi o que transpareceu ao responder "Teria que ser feito, creio, um trabalho essencial com ele, e seria o de não lançar sobre a má vontade de outros aquilo que tende a embaralhar, confundindo o caminho de sua inteligência". Papus, Saint-Martin p. 151.
32 - Bord, ob. cit. pp. 337-381.
33 - Bord ob. cit. pp. 342-355.
34 - Ata del 21 de junho de 1.773, firmada por todos os irmãos presentes na reunião. Peça comunidade por Madame Joanny Bricaud.
35 - Aprendiz, Companheiro, Mestre, Eleito, Escocés, Rosa-Cruz, Cavaleiro do Templo, Filósofo Desconhecido, Sublime Filósofo, Filaleta. Eram esses os doze graus, sem catecismos ou cerimônias particulares, mas que abarcavam um certo ciclo de estudo cujo curso completo permitia aceder ao grau supremo.
36 - Papus, Saint-Martin, p. 134.
37 - Bord, ob. cit. p. 354. B. Fabre, Um iniciado das sociedades secretas superiores “Franciscus eques a capite Galeato”, París, 1-913 p. 108. Tieman era um estrangeiro que viajava com um senhor liones; apaixonado pelo místico e pelas ciências secretas, se filiou a todo tipo de sociedades que teve acesso: A dos Amigos Reunidos, a Estrita Observância Templária, aos Elus Cohen. Saint-Martin e Willermoz o conheciam e nutriam admiração por ele.
38 - Lyon, ms. 5481, p. 35, 13 de junio de 1.777.
39 - Carta de J.B. Willermoz a Charles de Hesse em 12 de octubre de 1.781.
I.C.J.M.S.
Que a Ordem Retificada Prospere !!!
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