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LIBERTATEM LAPIS

o oriente espiritual no rer

Atualizado: 31 de out. de 2020



Jean-Françoir Var


“Meus Iir∴, eis o Oriente: a Luz começa a iluminar os nossos trabalhos. Estejamos prontos a continuá-los a partir do momento em que, recebamos a ordem e o poder do Venerável Mestre”.


Este é o convite do Primeiro Vigilante que marca o ponto de partida Dos nossos trabalhos. E ao ouvirmos a advertência do Venerável Mestre quando do fim destes mesmos trabalhos somos remetidos diretamente ao convite inicial:


“Meus Iir∴, quando, para aperfeiçoar o Vosso trabalho buscardes a Luz que vos é necessária, lembrai-vos que ela se encontra no Oriente e que é aí e somente aí que a podereis encontrar”.


Meus irmãos; o ritual (preceitos e meneios) para poder funcionar eficazmente, deve impregnar-se profundamente no homem que o pratica, de maneira a integra-lo e integrar-se totalmente por ele e nele. Para logra-lo, não existe outro método: a repetição, e a repetição incansável. Porém este método, que insisto, é único, pode ser um entrave se faltar a seu objetivo a prática constante. Se esta repetição não é acompanhada de uma atenção desperta, de uma constante vigilância, esta se degenera em uma reprodução sonora e verbal a quais se entregam os louros. As palavras se degradam, encadeando-se mecanicamente uma a outra, e durante esse tempo os pensamentos vagam muito distantes. O sentido do ritual já não aflora à consciência, e se converte, no sentido próprio do termo, em “insignificante” e como consequência em inútil e vã.


Outro risco que nos cerca, é a atenção exclusivamente sobre o exato desenrolar do cerimonial, considerando-se unicamente seu aspecto técnico. Esta atitude neste caso é apenas passiva, respondendo a uma intenção louvável. Porém nem por isto menos errônea, pois deixa de lado o verdadeiro sentido do ritual. Pois a importância essencial do ritual, e até sua justificação, para todos os que tomam parte nele, seja de maneira ativa (como executores), ou de maneira passiva (como expectadores). Seu sentido essencial e o significado que importa para nós, é a Orientação que nos da. E eis-nos aqui levados pelo ritual ante o Oriente, a questão levantada no começo desta exposição.


O Que é afinal o Oriente? E qual é a luz que dele emana? É o que os marinheiros denominam “bússola”? Em poucas palavras, é o Este? É uma região do globo? A região subdividida em Oriente Médio e Extremo Oriente? E esta luz do Oriente, é a de um sol nascente? Ninguém ignora que “Levante” e “Oriente” são palavras sinônimas – convêm recordar ao longo desta explanação. Um exemplo é o castelo de Chambord em que o rei francês Francisco I (1494-1547) ordenou a construção de uma misteriosa escada que chama a atenção, o rei a denominava “Escadas de Levante”, eram iguais as escadas utilizadas pelos turcos nos portos do mediterrâneo oriental, com desenho muito similar aos feitos por Leonardo da Vinci, sua principal característica é a de permitir que uma pessoa suba ao mesmo tempo em que outra desce sem que se cruzem devido a sua espiral em dobro.


As questões acima, os textos maçônicos antigos parecem apontar uma resposta. Tomemos, por exemplo, o manuscrito de Dumfries nº 4, que data por volta de 1710, mas se reporta a práticas operativas muito mais antigas:


P.- Quantas luzes existem na Loia?

R.- Duas.

P.- Quais são?

R.- O sol que se levanta pelo Este e chama os homens ao trabalho, e que se põe pelo Oeste devolvendo aos homens o descanso.


Esta frase evocará irresistivelmente, àquele que frequenta as Santas Escrituras, estes versículos do salmo 104, também chamado “salmo cósmico”, que a Igreja cristã recita tradicionalmente nas Vésperas, e que se leem assim:


“Tu envias as trevas e és à noite;

Em que circulam todas as feras da selva;

Rugem os leões por sua presa,

Reclamando a Deus seu alimento.

Quando o sol aparece, se retiram.

E voltam a acostar-se em suas guaridas.

O homem então sai para seu trabalho,

a seu labor, até que entre a noite.” (Sl 104, 20-23).


Existe aqui uma referência consciente ou inconsciente do salmo, não havendo nada de inverossímil, à vista do que sabemos sobre a educação religiosa dos Maçons dos tempos antigos. O mesmo texto se faz ainda mais preciso:


“P.- Onde repousa o Mestre?”

“R.- Em um canal de pedra, abaixo da janela do Oeste, mirando em face de Este, esperando a saída do sol para por seus homens ao trabalho”.


A causa parece entendida, mais ainda quando estas indicações correspondem exatamente às condições de emprego dos obreiros construtores tal qual são descritas nos textos medievais. Vejo por única prova (porém os exemplos abundam) as “Ordenanças da catedral de York”, emitidas em 1370 pelo capítulo da igreja de São Pedro sobre os pedreiros (maçons operativos) que lá trabalhavam:


“Eles (os maçons que trabalham nas obras da igreja de São Pedro) deverão estar (na loja) desde que haja suficiente luz para ver claro e trabalhar. E permanecerão nela trabalhando conscienciosamente toda a jornada, enquanto houver suficiente luz para ver claro e trabalhar”.


Isto vai de encontro, a primeira vista, como um eco fiel nesta frase de nosso ritual de abertura em grau de aprendiz, repetida sucessivamente pelos dois Vigilantes:


“Assim como o Sol inicia a sua caminhada no Oriente e espalha a sua luz sobre o mundo, assim também o V.∙. Mestre toma assento no Oriente para distribuir trabalho pelos obreiros e iluminar a Loja com a sua luz.”


Eco fiel dizia? É realmente assim? Uma constatação deve levar-nos a reflexão. E esta é a que o Mestre (Venerável Mestre) não aguarda a saída do sol para dar o sinal de início do trabalho, na realidade o que acabo de descrever ocorre em outros ritos ou graus maçônicos (pensemos, por exemplo, na Marca). Ele próprio é o sol, é dele que emanam as luzes que iluminam a Loja. É o que fica explicito neste intercambio de perguntas e respostas da instrução:


P - Explicai-me o símbolo do Sol.

R - Representa o Venerável Mestre que ilumina todos os Irmãos da Loja com as suas luzes, assim como o Sol ilumina o mundo.

P - Explicai-me o símbolo da Lua.

R - Representa os Irmãos Vigilantes que, assim como a Lua recebe e reflete a luz do Sol, recebem e refletem a luz do Venerável Mestre sobre os Irmãos da Loja.


Isto poderia, todavia, entender-se como una transposição da realidade física a cósmica. Porém vejamos quem vai nos obrigar a superar este estagio. Na abertura dos trabalhos e no encerramento, o Venerável Mestre pergunta em três ocasiões: “Que horas são?”. No primeiro caso, as respostas são sucessivamente: “É a décima segunda hora”, “Meio-dia” e “Meio-dia em ponto”; no segundo, “Meia-noite”, “Meia-noite em ponto”, e finalmente, diz no ritual, “a hora solar do momento”.


Nada pode mostrar-nos melhor que é necessário estabelecer uma distinção radical entre a hora solar e o que o ritual denomina meio-dia e meio-dia em ponto, meia-noite e meia-noite em ponto, e sobre seu real significado o qual é conveniente perguntar-se. A instrução por perguntas e respostas os qualifica de “tempos ou intervalos no dia maçônico” e adiciona que cada um comporta “seis horas e um tempo”, por assimilação à época da criação do mundo e à construção do Templo. Não saberíamos como poder fazer mais tangível o fato que o “dia maçônico” é de natureza absolutamente distinta do dia físico, que é limitado pelo despertar e por do sol e pela lua.


Quem já viu um trabalho que se inicia na metade do dia (meio-dia) e termina na metade da noite (meia-noite)? Em todo caso, os maçons operativos citados anteriormente, seguramente que não. Logo, trata-se de um trabalho de outro tipo, de outro meio-dia e de outra meia-noite. Entramos aqui em outra coisa distinta do tempo cronológico, tempo do relógio, do qual podemos chamar de tempo “acrónico”. Tempo que não obedece a um desenrolar cronológico. E o fulgor da luz que nos ilumina é totalmente independente do desenrolar que mencionávamos. Isto se confirma em outra passagem da instrução:


P - De que vos apercebestes logo que vos foi dada a Luz?

R- Das três grandes luzes.

P - Que significam essas três luzes?

R - O Sol, a Lua e o Venerável Mestre.


Encontramo-nos em plena “vulgata” maçônica. E o que segue é mais uma afirmação do mesmo:

P - Que relação existe entre o Sol e a Lua e o Venerável Mestre?

R - Assim como o Sol ilumina o mundo durante o dia, e a Lua durante a noite, assim o Venerável Mestre ilumina sem cessar a Loja com as suas luzes.


“Ilumina sem cessar a Loja com as suas luzes”: Existe aqui uma primeira indicação, tênue, porém indiscutível, de que não se trata neste caso da luz física. O sol e a lua estão aí somente a título “figurativo”, substitutos, cuja presença pode equivocar aos espíritos superficiais e irreflexivos. E talvez esta seja esta sua real intenção. Isto é tão certo, que imediatamente outro intercâmbio de perguntas e respostas se inicia assim: “De que vos apercebestes então?”, sobre o qual não quero antecipar-me e que só quero levar-nos progressivamente mais tarde, tendo em vista sua importância capital, já que resulta ser esta a chave de tudo.


Fica um ponto por esclarecer: que o sol e a lua brilhem ou não no céu, pouco importa; a luz da qual falamos ilumina sem cessar. E isto é o que nos evoca esta frase dirigida ao candidato no curso da cerimônia de sua Recepção:


Ir.∙. Aprendiz, a Luz é inalterável. Ela nunca cessou de brilhar em toda a sua pureza por um só instante. Só tu estás na obscuridade.”


Esta luz é de outra ordem absolutamente distinta ao físico, de que luz poderia tratar-se?

Retornemos a nossos textos antigos: Eles nos apontam uma segunda resposta que nos diz mais. Esta foi extraída do manuscrito Graham, que data de 1726:


P.- “Por que (a Loja está orientada) de Oriente a Ocidente?”

“R.- Porque as igrejas estão estabelecidas de Oriente a Ocidente, com seu átrio ao Sul.”

“P.- Por que as igrejas estão estabelecidas de Oriente a Ocidente?”

“R.- Por quatro razões”.

“P.- Quais são?”

“R.- Em primeiro lugar porque nossos primeiros pais foram instalados ao Oriente do Éden.”

“Em segundo lugar, porque o vento de Oriente secou o mar ante os filhos de Israel (Ex.14; 21): assim o Templo do Senhor deve ser construído;”

“Em terceiro lugar, porque o Sol se levanta no Oriente e se recosta no Ocidente sobre aqueles que habitam cerca do Equador;”

“Finalmente, porque surgiu no Oriente a estrela que advertiu aos pastores e aos reis magos”.


Eis-nos aqui providos de três preciosas indicações que veem unir-se à indicação cósmica ou astrológica: o Oriente e, neste caso, trata-se claramente do Oriente maçônico, ou para ser mais preciso, do Oriente visto e concebido pelos Maçons que é simultaneamente:


- O Éden, lugar de residência de nossos primeiros pais, também chamado Adão, o primeiro homem;

- Uma particularidade da edificação, um traço orientador do Templo;

- O sinal da natividade de Cristo, da encarnação do Verbo.


E de maneira definitiva, é claramente um Oriente espiritual que nos é dado a contemplar, e por consequência uma luz espiritual que ira iluminar-nos em nossos trabalhos, pela qual o Venerável Mestre a denomina justamente “a luz mais pura”. Isto também, nossos antigos textos ensinam de maneira mais explícita. É deliberadamente que falo de “antigos textos”, já que os que vou citar refletem a prática da Grande Loja dos Antigos, unanimemente reconhecida hoje como mais tradicional que a Grande Loja dos Modernos. O primeiro foi extraído de “The Three Distinct Knocks”, “OS Três golpes distintos” (1760), ritual dos Antigos. Onde se pode ler:


P.- “Por que vossa Loja está disposta de Oriente a Ocidente?”.

R.- “Porque todas as igrejas e capelas o estão ou deveriam estar”.

P.- “Porque isto, meu amado Irmão?”.

R.- “Porque o Evangelho foi pregado primeiro no Oriente e se estendeu dali até Ocidente”.


O segundo trecho foi retirado do “Guia dos Maçons Escoceses”, diz o ritual estabelecido pelo Supremo Conselho de França (1804) para suas Loias simbólicas, que é a transposição literal do precedente texto. Voltaremos a encontrar o trecho que acaba de ser citado:


P.”- Onde haveis ido, meu irmão?”.

R.- “Estive a Ocidente”.

P.- “E aonde vais?”.

R.- “A Oriente”.

P.- “Porque deixastes o Ocidente e vais à face de Oriente?”.

R.- “Porque a luz do Evangelho apareceu primeiro no Oriente”.


De tudo isto, podemos extrair algumas conclusões iniciais e parciais.


- O Oriente não é somente uma região terrestre, é uma região celeste. Ou melhor, para dizer de um modo mais preciso e exato, é o lugar do céu na terra, a saber, o Paraíso. Paraíso que era o lugar da residência de Deus sobre a terra – a terra primeira e original, em todo seu estado de esplendor, saída das mãos do Criador; igualmente é o lugar de habitação do homem com Deus; do homem primeiro e original, em seu “estado primeiro glorioso” (como dizem nossos rituais retificados), porque foi criado a imagem e semelhança divina (como a doutrina do Retificado proclama sendo igual a toda tradição cristã, o homem original, o primeiro “Adão”, em união constante e perfeita com Deus, sendo coparticipe da gloria divina. Não esquecendo que, em toda a Bíblia, a “Gloria”, o Kabod, designa a manifestação luminosa da Presença atual de Deus) como no Templo, que depois de sua dedicação por Salomão, a Gloria de Deus veio “a encher” até o ponto que ninguém mais podia morar (1 Reis 8; 11 e Crônicas 5; 14).


É o que nos ensina o Gênesis em seu capítulo 2, que citarei na tradução da Septuaginta, porque é a tradução que alimentou toda a tradição cristã, particularmente em sua liturgia (hinos e antífonas); e também sinalizou a tradição judaica antes da tradução dita dos Massoréticos que só foi elaborada muito mais tarde (século VI) e, em boa parte, por reação contra a interpretação cristã da Bíblia. A Septuaginta se expressa assim: “E o Senhor Deus plantou um jardim (paraíso) no Éden no Levante, e pôs ai o homem que havia formado”. (Gênesis 2; 8).


O termo hebreu miqqèdem que a LXX traduz por Levante é a miúde interpretado também por “ao principio”. Este Levante em questão é o principal, este Oriente é uma origem, e os convido igualmente a recordar também que esta aproximação em forma de jogo de palavras, é importante.


- A porta do Oriente é a porta do céu. Com efeito, uma vez Adão exilado do Paraíso, é a Oriente deste que Deus põe os Querubins armados de uma espada flamejante e arredondada a fim de guardar o acesso a Árvore da vida (Gênesis 3; 24).

Do mesmo modo, é ao Oriente que se encontra a porta de acesso ao Templo. Isto é o que os maçons citados antes fazem eco unanimemente e esta em conformidade com a arqueologia e as Escrituras:

É por esta porta de Oriente que “a Gloria do Eterno [que] enchia a casa de Deus” (conforme citado acima) a abandonou no momento do exílio na Babilônia (Ezequiel 11; 1 e 22-23). Exílio que é idêntico ao de Adão. Assim, o exílio do homem do céu corresponde ao exílio de Deus na terra. Podemos trabalhar sobre três pontos:


a) Adão se alijou de Deus pelo Oriente.


b) Igualmente para Caim: “Caim se alijou da presença do Eterno, e se estabeleceu na terra do exílio (Nod) a Oriente do Éden” (Gênesis 4; 16).


c) Finalmente: “Sucedeu, que enquanto se moviam a partir do Nascente (do Oriente), encontraram um vale no país de Senaar e se estabelecerão ali” (Gênesis 11; 2, na LXX). Quem também fez isto? Os construtores da Torre de Babel, esta falsa “porta do céu”! Dai tiramos outra conclusão: existem dois grandes e variados orientes: o verdadeiro Oriente (o Oriente eterno); e os falsos orientes, aquele que qualquer um encontra ou o oriente para o qual tendem a ir os que se afastam do verdadeiro. Em resumo, o Oriente é então: O lugar do homem com Deus; e ainda, o lugar no qual o homem deixa Deus (Adão, Caim), e o lugar em que Deus deixa ao homem (a Gloria abandona o Templo). Porém também é: O lugar aonde Deus vem reunir-se com o homem. Vejamos o que nos ensinam os profetas “pelos quais fala o Espírito Santo” como proclama o Credo. Escutemos Zacarias(14; 3, 4, 9):

“Vontade manifesta o Eterno (…). Se plantaram seus pés aquele dia no monte das Oliveiras que está enfrente de Jerusalém (sendo assim o Templo) ao Oriente (…). o Eterno será rei sobre toda a terra. O dia no qual, o Eterno será único e único seu Nome”.


E agora Ezequiel(40, 1; 43, 1-2 e 4-5): “Ele (o homem da visão de Ezequiel, que certamente não deveria ser um homem ordinário posto que seu “aspecto era como o aspecto do bronze”) me conduziu à porta, à porta que estava do lado de Oriente. E é aqui, que a Gloria do Deus de Israel se avançava de Oriente (…). A Gloria do Eterno entrou na Casa pela porta que estava do lado de Oriente… E é aqui, a Gloria do Eterno encheu a Casa” .


Esta visão é profética e não se aplica a um templo atual, mas a um templo que esta por vir, veremos qual. Assim, o mesmo movimento de partida é o de retorno, de exílio e de habitação se aplicam a Deus, como é aplicado e se aplicará ao homem; e é o Oriente o que o produz. Prossigamos com esta leitura de Ezequiel(43, 6,7):


“Ouvi, então, que alguém me falava do interior do templo, enquanto o homem se conservava (sempre) a meu lado. Filho do homem, disse-me (a voz), é aqui o lugar do meu trono, o lugar onde pus a planta dos meus pés, minha morada definitiva entre os israelitas. De hoje em diante, nem o povo de Israel, nem seus reis profanarão mais o meu santo nome pelas suas fornicações nem pelos cadáveres de seus reis, seus lugares altos,” .


Esta profetizando claramente que Deus se manifestará sob forma de homem, tomará forma de homem para vir a habitar, residir entre os homens; de um homem que é rei, como Adão, rei da criação, o era na origem. Em poucas palavras, é o anuncio de um “Novo Adão”, o Cristo. Podemos nos remeter a São Paulo por exemplo que em 1 Coríntios (15; 45) e a continuação de toda a tradição cristã.


O Oriente é o lugar de Deus-com-o-homem, como o era em sua origem e o do homem-com-Deus. Agora, Deus-com-o-homem se diz EMANUEL, que é um dos nomes de Cristo (Mateus 1; 23) profetizado por Isaías (7; 14). Deste modo podemos compreender até que ponto nossos textos maçônicos tradicionais, fies à letra do Evangelho (Mateus 2; 1-2), estão fundamentados em afirmar que a estrela aparecida “no Oriente” anunciava que “nosso Salvador se havia feito carne” (ver mais acima).


Em tudo que se precedeu, por comodidade de linguagem, falei do Oriente como de um lugar, e cada um haverá compreendido, em suposição, que se trata de um lugar espiritual. Porém na realidade aqui se trata de uma “expressão substituída”, já que a verdade é muito mais profunda mais forte, trata-se em realidade de um estado espiritual. Situa-se a Oriente aquele que se assemelha a Aquele que se ha feito conforme a nós, e que por consequência se reúne a Aquele que está unido a nós.


E ainda existe mais: “Oriente” não é somente o lugar e o momento em que Deus se fez homem, no qual o Verbo se encarna: é mesmo um Nome de Cristo, Verbo encarnado, e isto também é anunciado pelos profetas. O “Oriente” o “Nascente”, é Aquele que “se eleva”, que se levanta.


Este não é outro que a Tsemah (Renovo) da profecia de Zacarias, denominação reproduzida do original por “Gérmen”, mas que a Septuaginta traduziu por este termo “Anatole” e que significa precisamente “Levante”: “Esta aqui um homem cujo nome é Gérmen (o Levante, o Oriente) e germinará de seu sitio (se levantará em seu lugar) e construirá o Templo do Eterno. Ele reedificará o Templo do Eterno, e alcançará gloria e se sentará e dominará de sobre seu trono; será sacerdote sobre seu trono” (Zacarias 6; 12-13).


O que faz eco ao cântico de outro Zacarias, o pai de João o Batista, que, “pleno do Espírito Santo, profetizou: (…) O Sol levante (o nascente) nos há visitado desde a altura para alumbrar aos que estão na obscuridade e a sombra da morte a fim de endereçar nossos pés pelo caminho da paz.” (Lucas 1, 67 e 78-79).


Herdeira e intérprete inspirada das Santas Escrituras, a Igreja cristã se encontra então perfeitamente fundada e justificada em atribuir a Cristo o nome de Oriente, e é o que faz. Este é o quinto dos Nomes de Cristo, que são em número de sete, e que a liturgia cristã nos revela sucessivamente no transcurso da semana –da santa hebdômada- que precede a festa de Deus feito homem, referente à Natividade. Cada um dos dias que compõem esta semana é em efeito solenizado por uma antífona, que no modo antigo, proclama um destes Nomes.


O primeiro é: Sabedoria; o segundo: Adonai, o qual se traduz em grego por Kurios, Kyrios, quer dizer Senhor; o terceiro: Raiz de Jessé (e cada um creio eu, deve pensar nos vitrais que ilustram, por exemplo, a catedral de Chartres na França); o quarto: Chave de Davi; o quinto: Oriente; o sexto: Rei das nações; e o sétimo: Emanuel, “Deus-conosco”, do qual já falamos. O oitavo dia (noção importante na teologia cristã, ainda que não seja este o momento de deter-nos nele) no oitavo dia, então, o de Natal, nos é dado outro nome: Jesus, que não nos remete a um de seus atributos ou uma de suas missões, senão que é seu Nome próprio.


O Que significa então Oriente? O texto de Zacarias citado anteriormente nos indica: é o nome de Cristo em Majestade, do Cristo Sacerdote e Rei, e ao mesmo tempo, Construtor do Templo, o que é a essência pura da “Arte real” que é a nossa, e que o creia bem, não se perdeu em absoluto de vista ao longo de toda minha explanação.


Porém, construtor de que Templo? Do Templo de pedras? Do de Salomão, de Zorobabel, ou de Herodes? Não em absoluto. Já que não podemos deixar de rememorar este episodio no qual, ao extasiarem-se os discípulos de Jesus ante a magnificência do Templo, este os anunciou: “Em verdade vos digo que não ficará aqui pedra sobre pedra que não será derrubada”. Isto se encontra nos evangelhos sinópticos (Mateus 24; 1-2, Marcos 13; 1-2, Lucas 21; 5-6). E, como sucede habitualmente, São João nos da deste feito uma significação espiritual profunda quando o relaciona com estas palavras de Cristo: “Destruirei este Templo, e em três dias o levantarei”, e adiciona: “Porem ele falava do templo de seu corpo. E assim, quando ressuscitou dentre os mortos, recordaram seus discípulos que dizia isto, e creram na Escritura e na palavra dita por Jesus” (João 2; 19 e 21-22).


É por este “Gérmen”, do qual a profecia de Zacarias faz menção, evoca irresistivelmente estas outras palavras de Cristo: “Em verdade, em verdade vos digo que se não morre o grão de trigo que caiu na terra; não dará fruto; porém se morre produz muito fruto” (João 12; 24).


Palavras que encontram eco no nosso ritual, com a terceira máxima que o irmão Introdutor da ao candidato a Aprendiz: O grão lançado à terra recebe dela a vida; mas se o seu germe esta alterado, a própria terra acelera a putrefação. Recorda bem esta noção de “alteração” do germe. Esta aqui a razão pela qual, no velho ritual operativo citado no início, o Mestre se recosta de maneira a poder ver e levantar-se a luz de Oriente, a luz do Sol nascente: a luz d’Aquele que se eleva e que o levantará. Compreendereis que não insisto agora sobre este ponto, porém quiçá alguns aos que me dirijo recordarão de pronto minhas palavras, e aplicando-as a eles mesmos, extrairão seu significado em toda sua extensão.


Resta por dizer que este Oriente é a Luz por excelência, a Luz da gloria, a Luz eterna. “Oh Oriente, esplendor da Luz eterna e sol da justiça”, canta a antífona à qual fazia alusão precedentemente. Tal é a luz “a mais pura” que ilumina nossa Loja (a miúde qualificada de “lugar muito iluminado”), tal é a “justiça” que reina na Loja de aprendiz e que a preside.


Esta luz, o Prólogo do evangelho de são João nos expõe qual é; a palavra “expõe” resulta em outra parte débil e inadequada, e seria mais conveniente falar de “contemplação”. E, seja dito, é a causa desta teologia da luz indissociável à teologia da Encarnação, como encontrado na Igreja oriental, dita ortodoxa, um admirável desenvolvimento, que chama ao discípulo mais amado, são João, o Teólogo; é dentre todos os Doutores da Igreja um dos três (três somente), com são Gregório Nazianzeno, “São Gregório o Teólogo”, no século IV, e “São Simeão o Novo Teólogo”, no século X, a quem a Igreja ortodoxa reconhece sem restrição esta qualidade de “teólogo” que implica um conhecimento em plenitude dos mistérios inefáveis. Os digo isto de passagem, a título documental.


Assim devemos transportar-nos ao Prólogo do evangelho de são João. E isto, não somente os cristãos, senão também os maçons. E por quê? Porque é sobre este Prólogo, e não em qualquer outra passagem das Escrituras, que prestamos todos os nossos juramentos de um lado a outro de nossa jornada maçônica, e inclusive mais além. E quando digo “sobre”, é em seu sentido mais concreto, no sentido físico do termo, sendo que pousamos a mão direita encima: a mão direita, a que compromete. O que implica obrigatoriamente em nossa adesão ao que este contem, na integra. Impossibilitando escolher entre o que nos convém ou o que não. Esta adesão integral se estende por outra parte à totalidade do Evangelho, como nos é recordado em múltiplas ocasiões, e em particular nesta passagem da “instrução moral do grau de aprendiz”: “O Evangelho é a Lei do Maçom, em que deve incessantemente meditar e seguir”; e este outro, retirado da “Regra maçônica”: “O Evangelho é a base das nossas obrigações. Se não acreditasses nele, cessarias de ser Maçom”.


Este Prólogo, por acaso é necessário recordar seus termos, que cada um deveria conhecer de memoria, (como recordação, antes da reforma do Vaticano II, era recitado a cada domingo na missa). Citarei apenas as passagens que nos interessam diretamente, e o farei em uma tradução pouco habitual para vós, mas que tem o mérito de seguir a seu sentido original, mais que os textos em uso:


No principio era o Verbo, e o Verbo era com Deus, e o Verbo era Deus. Este era nele principio com Deus. Todas as coisas por ele foram feitas, e sem ele nada do que ha sido feito, foi feito. Nele estava a vida, e a vida era a Luz dos homens. E a Luz luzia nas trevas, e as trevas não prevaleceram contra ela: et tenebrae eam non comprehenderunt”. (João 1; 1-5).


A Luz está presente aqui, por encima de vos, Venerável Mestre, esta Luz do Verbo que as trevas não conseguem apagar, nem ao menos alterar, mesmo que hajam velado e obscurecido. Prossigo:


Esta Luz é a verdadeira Luz que ilumina a todo homem vindo a este mundo”. (João 1; 9).


E ainda:


E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, pleno de graça e de verdade, e havemos contemplado sua Gloria, uma gloria como a gloria do Filho único vindo do Pai”. (João 1; 14).


Haveis reconhecido nesta passagem vários temas que já foram abordados: a habitação, a gloria, e também o feito que esta luz seja a do principio. Ao que se adiciona que ilumina a todo homem que vem a este mundo e que nasce, é dizer que ela é inata nele, a luz original que pode estar oculta, porém não está abolida. Tema recorrente na doutrina do Retificado. Aparece também o tema da verdade, tão essencial para todos os homens, certamente, sobretudo para nós Maçons, que fazemos dela – e seria desejável que isto seja algo mais que palavras- o objeto de nossa busca.


Agora que todos estes temas são reunidos, por uma sorte de necessidade lógica, os encontramos igualmente em nossos rituais, e isto em repetidas ocasiões. Citarei somente alguns extratos dentre os mais significativos, e que se encontram, como se sucede repetidamente , quase sempre, na “Instrução moral”:


“As trevas que te envolviam designam também as que cobriam todas as coisas no principio da sua formação. Enfim o guia desconhecido que te foi dado para percorrer este caminho, simboliza o raio de luz que é inato ao homem, pelo qual, e unicamente, ele sente o amor à Verdade e pode chegar ao seu Templo.”


Voltaremos mais adiante sobre esta noção de “templo da verdade”. Mas continuemos escutando o que nos ensina a Instrução moral:


“Com isto ensinaram-te que, por muito fraca que seja a Luz que o homem traz com ele ao nascer, se a descura pode perdê-la por completo e cair nas trevas mais espessas, mas também que pode desenvolvê-la bastante pelo bom uso que dela faz e que deve mesmo esperar descobrir a Verdade através dela, pesem as nuvens espessas que a escondem aos olhos do vulgo. É então que, abrindo os olhos a um novo dia, ele vê com admiração e espanto a multidão de socorros que a Bondade Divina estabeleceu à sua volta para o dirigir e defender.”


Esta luz inata, o homem pode perdê-la por causa de seu comportamento, exatamente como sucedido a Adão que perdeu a parte que tinha da Gloria divina, e por este feito, caiu sob o peso de uma dupla condenação a morte: a “morte intelectual”, como dizem nossos textos, é dizer a morte espiritual; e a morte corporal. Aqui, uma vez mais os remeto a meus estudos precedentes. De onde retiro esta advertência do Venerável Mestre ao candidato: “Aquele que perde a Luz começa a perder a vida e a Verdade afasta-se dele.”


Veja como estes termos: luz, vida e verdade, são indissociáveis. Advertência que o Venerável Mestre completa com esta exclamação, que parece querer sublinhar ao candidato o quão pesado será a tarefa que o espera: “Meus Iir.∙.é muito difícil oferecer a Luz a quem a desprezou.”


No obstante, como venho repetindo, nosso Rito é otimista. Existem, se me permitem esta reflexão pessoal, duas categorias de cristianismo. A primeira é fundamentalmente pessimista: aconteça o que for o homem, por mais que se esforce, nunca deixará de permanecer a uma distancia incomensurável de Deus; pode inclusive, se crê na espantosa doutrina da predestinação, estar condenado de antemão. Nosso Rito não compartilha em absoluto de tal concepção. Nosso Rito ensina – e não se trata de modo algum de heterodoxia, mas ao contrario- que o homem, se quiser, e não se trata somente das intenções, e mais ainda de seus atos (primeiro ponto) e com a ajuda de Deus (segundo ponto, e insisto fortemente nestes dois pontos), pode retornar pouco a pouco a aproximar-se novamente de Deus e a seu Principio. É o que o Venerável Mestre declara ao candidato: “Se cumprir com exatidão todos os vossos deveres (face Deus, face vossos irmãos e face vós mesmo) deveis esperar alcançar a luz do verdadeiro Oriente” . Em outra parte se diz: “somente a virtude leva o homem à luz”.


Porque esta necessidade imperiosa na prática do bem? que encontra sua expressão concreta na pratica das virtudes, tão presentes nos graus de nosso Rito. Simples e claramente por que o “germe”, é dizer o estado original do homem, ha sido alterado, e recordemos que etimologicamente, ser alterado, é converter-se, ao menos parcialmente, em “outro” em si mesmo. É preciso então reencontrar sua integridade inicial. Do contrario, si é um germe alterado o que é posto na terra, encontrará, não a vida, quero dizer a luz, senão a putrefação, ou seja, um acréscimo das trevas, as da morte espiritual. O que corresponde a esta admoestação do Venerável Mestre: “Acredita que a Luz se possa espalhar sobre o homem viciado e corrupto?”. Tarefa árdua, certamente, a do restabelecimento da luz no ser. Ela passa inelutavelmente por uma serie de provas (como regra universal), que são outras tantas purificações, e cuja primeira é este cenário na terra, é dizer a prova das trevas. “que aquele que gozando da Luz, rechaça em toma-la como guia, seja provado pelas trevas”, declara o Irmão Introdutor vendando os olhos do candidato. Uma vez mais as trevas! Porém, as coisas são muito mais simples do que parecem.


Acabo de vos mostrar; existe um só Oriente verdadeiro e, fora dele, falsos orientes. Todos são enganosos em diversos graus: uns são fictícios e ilusórios, os outros, deliberadamente mentirosos. Porem todos tem o mesmo efeito: distraem do verdadeiro Oriente; “desorientam”.


Sucede o mesmo com as luzes que estes orientes emitem. Existe a Luz da Verdade, e existem as outras, que a miúde, a eclipsam e em algumas ocasiões a substituem. As mesmas Escrituras nos advertem que “o que não é de espantar. Pois, se o próprio Satanás se transfigura em anjo de luz.” (2 Coríntios 11; 14) Estas luzes são, na realidade, e apesar das aparências, tenebrosas. Agora as trevas não são todas da mesma natureza. Temos que deixar aparte as trevas de nossas origens, aquelas que “cobriam todas as coisas no principio de sua formação”, como já havia sido dito anteriormente, e das que pela Palavra Criadora, o Fiat Lux, surgiu a Luz primeira. Todas as outras são as trevas consequentes da queda, as que as Escrituras, e depois delas nosso ritual, denominam “as sombras da morte”, já que trevas e morte são duas faces de uma mesma realidade.


E estas trevas por sua vez, são de dois tipos. Existem trevas intelectuais, que o espírito por equivoco, toma por luzes, evidentemente falsas, já que não emanam da Luz verdadeira. Isto é explicado em distintas ocasiões, em particular na Instrução moral: “Mas uma curiosidade vã podia distrair-te, uma falsa luz podia perder-te: reduziram-te a ser guiado por aqueles a quem deste a tua confiança e por isso recebes-te o prêmio.”, acrescenta-se: “As três viagens na escuridão simbolizam (…) o estado de privação em que (o homem) se encontra, quando é abandonado às suas próprias luzes.”.


Sabemos, que na terminologia que Willermoz herdou de seu mestre Martinez, o “estado de privação” expressa a situação do homem caído, cortado de Deus, que já não esta “em unidade com a Divindade”.


Do mesmo modo, no começo, o Irmão Introdutor, privando o candidato da “luz elementar”, quer dizer da luz física, a qualificava de “símbolo mais que evidente dos falsos louvores que são o quinhão do homem abandonado à sua própria vontade”.


Todavia ainda existe mais, e abordamos aqui a segunda categoria de trevas: as trevas materiais ou elementares. A matéria mesmo, ao menos em seu estado presente, é treva, logo os “elementos” que a constituem, e por consequência disto a luz material. Ela é tenebrosa porque foi causada pela queda. Antes, existia outro tipo de matéria, incorpórea, luminosa e imortal, da qual estavam feitos os “corpos gloriosos”. Não tenho tempo de insistir sobre este ponto da doutrina, herdado também de Martinez de Pasqually, e os remeto aos estudos que lhe foram dedicados, porém devo recorda-lo já que é essencial para compreender a natureza das provas pelas quais passa o aprendiz. Este é em efeito “provado”, porém não “purificado” pelos elementos, ao contrário do que se passa em outros Ritos.


Esta prova pelos elementos é concebida para fazer descobrir ao candidato que a luz que ele busca não é deste mundo. É tão certo que ao término das três viagens, o Venerável Mestre constata: “Se ao atravessar as três Regiões Elementares, (…) não conseguindo encontrar a Luz que deseja já se encontra no bom caminho”. É o mesmo que dizer que buscar a luz no mundo, permanecendo no universo material –leia-se intelectual- desde aqui abaixo, é equivocar-se com toda segurança.


Assim mesmo, quando finalmente a luz é devolvida ao candidato “em todo seu esplendor” – me vejo obrigado por razão de falta tempo a passar por alto as etapas intermediárias, muito instrutivo por outra parte, posto que fazem descobrir a Justiça e a Clemência, o que não é pouco - simultaneamente se queimou diante dele uma “chama (…)que passou como um relâmpago”, assinala, a explicação do Venerável Mestre “chegará o momento em que todas as ilusões desaparecem com a velocidade do relâmpago”); e simultaneamente também é exclamado em voz alta: “Sic transit gloria mundi!”, de maneira a imprimir com força no anima do candidato que a “gloria do mundo” é transitória e passageira, que é fugaz e condenada a desaparecer súbita e completamente, como a ilusão ante a verdade e a realidade.


Absolutamente outra, com efeito, é a Gloria que preside os trabalhos dos Maçons, os governa, os ordena, os perfeiciona, os verifica e os vivifica. “para aperfeiçoar o Vosso trabalho buscardes a Luz que vos é necessária, lembrai-vos que ela se encontra no Oriente e que é aí e só aí que a podereis encontrar.” Gloria que, volto a repeti-lo, é Presença eterna do Eterno presente – Eterno como Deus, presente como o Homem. Luz Daquele que é vida e verdade, e a própria perfeição. Daquele que é o Oriente, origem de todas as coisas, incluindo o homem. “O Oriente Maçônico significa a fonte e o princípio da luz que o Maçom procura”, nos diz a Instrução moral. Que nos tem sido representada pelo candelabro de três braços que ardia sobre o Altar no Oriente, sendo como o emblema [= a representação figurada] do tríplice poder do Grande Arquiteto do Universo. Esta Luz [adiciona, e isto é de importância capital] é a primeira vestimenta da alma, a prenda que lhes é dada [digo, o avental branco] não é mais que sua representação e “sua brancura designa nela a pureza.”


Nenhum equívoco possível: na origem, o homem estava revestido da luz divina, da gloria divina. O que da toda a força à banal expressão de “fiho da luz”, a qual nos vem a dizer, como São Paulo aos atenienses em Areópago, que nós os homens, somos “da raça de Deus” (Atos 17; 22); e toda a extensão à exclamação que o Venerável Mestre deve proferir “em um tom elevado” quando o Aprendiz é “devolvido a luz”:


“Meus IIr.∙., que a alegria reine de novo entre nós. O Filho da Luz tinha se perdido nas trevas. Foi chamado, reconduzido, os teus olhos foram abertos e as trevas dissiparam-se.”


Meus Irmãos, a luz da Iniciação, é simbolicamente, o retorno de Adão do “Éden ao Oriente”: o homem restaurado em sua gloria original graças a sua volta ao Oriente, no qual é reunido ao Cristo, que é o Oriente. É passando através de Cristo que podemos aspirar a reintegrar-nos no Principio, já que “ninguém vai ao Pai senão pelo Filho” (João 14; 6).


Agora, como Cristo não pode ser dissociado do Pai e do Espírito, a manifestação da Gloria divina é forçosamente Trinitária. Isto também, o ritual nos diz na passagem da Instrução por Perguntas e Respostas que anunciei quase no começo deste trabalho:


“P - De que vos apercebestes então?”

“R - De um candelabro de três braços sobre o altar do Oriente.”

“P - A que alude ele?”

“R - À tripla força que ordena e governa o mundo, e que é expressa na Loja pelo Venerável Mestre e os seus dois Vigilantes.”


Veneráveis Mestres, meus Irmãos Vigilantes, haviam tomado consciência disto? Representais em Loja, ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo! Simples e claramente. A Gloria divina, a Gloria do Grande Arquiteto do Universo, representada trinitariamente em nossas Lojas sob a forma de ternário luminoso, o é de distintas maneiras não todas equivalentes, e incluídas no cerne do conjunto constituído pelo qual o ritual denomina as “nove luzes da Ordem ou maçônicas” e que são, como todos sabem: o candelabro de três braços do altar de Oriente, as três tochas [os grandes candelabros] situados nos ângulos Sul-Este, Sul-Oeste e Norte-Oeste do tapete da Loja, e finalmente os três porta-velas situados respectivamente nas mesas dos Vigilantes e do Secretario.


Tem entre eles, a diferença hierárquica [por assim dizer] que segue. O candelabro de três braços, que é acesso antes da abertura dos trabalhos –os quais, recordemo-los, iniciam normalmente na obscuridade- significa que a luz que o simboliza é “inalterável”, que brilha eternamente e que as trevas não puderam apaga-la. Tem sua exata correspondência no triângulo luminoso que brilha por cima da cabeça do Venerável Mestre, e que deveria se aplicamos ao pé da letra o ritual, estar situado debaixo de um dossel o baldaquino. Agora, a língua antiga tinha outro termo para designar um dossel, e era a palavra “céu” (que encontramos no céu da cama), e que empregavam, por exemplo, nas ocasiões das procissões, como no do Dia do Senhor, ou levando o Santo Sacramento. E quiçá isto tenha um sentido que sobreponha a simples historieta.


Resulta que os dois, o triângulo e o candelabro, estão situados a Oriente, o qual, em Loja, simboliza o universo e o homem que ha cumprido sua reintegração. Por demais, o oriente deveria estar sobre elevado em relação ao resto da Loja por meio de um estrado de três passos, com o fim deste assinalado fisicamente.


Falo aqui da Loja por comodidade de linguagem, porém é uma inexatidão (que nossos rituais se permitem também: é minha escusa), já que se nos atentarmos ao catecismo por Perguntas e Respostas do grau de Aprendiz:


“P - Que representa a Loja?”

“R- O Templo de Salomão reedificado misticamente pelos Maçons.”


Estritamente falando, a Loja é o tapete e; em alguns casos, a reunião dos Irmãos em torno dele. Agora, de acordo ao que nos ensinam as Instruções, o Templo de Salomão tem uma dupla relação: com o que as instruções chamam o “templo universal”, por um lado é o mesmo que dizer o universo (considerado como templo cheio pela presença divina), e por outra, com o homem, e seu “templo particular”. Sem entrar em detalhes, digamos que, situado aí, e dizendo não ao Oriente, o universo e o homem estão em vias de reintegração, porém esta ainda não se há cumpriu.


Entretanto, as tochas [os grandes candelabros] que rodeiam o tapete da Loja e que são acendidas pelo Venerável Mestre, e apagadas ao final, significam que ao longo da duração de sua existência, o universo e o homem estão rodeados e sustentados pelo poder da Trinidade, e também que sua existência cessará quando esta potência os faltar.


Deixo de lado as três outras velas, que acesas a partir das anteriores, tem um valor correlativo, porém subordinado que não interessa ao objeto deste trabalho.


Porém é necessário assinalar outra luz, cujo seu bom significado fica reservado para mais tarde, é dado a contempla-lo desde este grau, o qual é uma particularidade única do Rito Retificado. Trata-se, como bem haveis compreendido, da “a estrela flamejante de cinco pontas, com a letra “G” pintada em ouro no centro”, “que ilumina o centro, de onde espalha a sua luz por toda a parte.”


O mesmo se relaciona a outro simbolismo numérico que é do ternário - mas na tradição, inclusive maçônica, não é raro que a estrela de cinco pontas simbolize a Trinidade – não é necessário ser um grande clérigo para compreender que figura a presença de Deus no coração do universo e sobre tudo no coração do homem, e que ela é de algum modo a projeção no plano humano do que é o ternário no plano divino.

De tudo o que precede, resulta que o programa que a Maçonaria retificada nos propõe, ensinando-nos o método e os meios para realiza-lo, é de “reconstruir misticamente” nosso Templo interior, de maneira há converter-nos, a cada um de nós, e o conjunto de todos nós, no habitat da Gloria de Deus e de Sol da Justiça, residência do Emanuel, Deus conosco e Deus em nós.


Já que o verdadeiro Templo, somos nós mesmos, quando nos fazemos conformes a Cristo, quando nós mesmos nos tornamos Cristo – o que por outra lado quer dizer cristão, christianus. Como disse Jesus, “Ora, aqui está quem é mais do que Salomão.” (Mateus 12; 42), “Ora, eu vos declaro que aqui está quem é maior que o templo” (Mateus 12; 6) Então isso se aplica a nós – e crede-me que esta explicação, não é minha, mas que a faço seguindo ao pé da letra nossos rituais (não somente o de Aprendiz, ainda que tudo esteja ali em semente)- estas palavras de São Paulo: “Não sabeis que sois o templo de Deus, e que o Espírito de Deus habita em vós? (…) Porque o templo de Deus é sagrado - e isto sois vós.” (1 Coríntios 3; 16-17). Logo, se estamos ao Oriente: nós somos o Oriente. É tudo isto o que expressa, em termos inspirados, a Igreja ortodoxa neste Troparion de Natal:


“Teu Nascimento, oh Cristo nosso Deus,

iluminou ao mundo com a luz da Sabedoria,

pois os que adoravam aos astros,

pela estrela aprenderam a

adorar-te, oh Sol da Justiça,

e a conhecer-te, Oriente do alto.”


Meus Irmãos, tudo isto é grandioso e exaltante, é verdadeiro. Realmente verdadeiro. Mas simbolicamente. “Simbólico” não quer dizer, como na linguagem corrente, e com demasiada frequência ocorre na linguagem maçônica - o que é o ápice!- “irreal” ou “fictício”. O símbolo tem sua realidade, uma realidade particular, que lhe é própria. Participa da realidade da qual simboliza, mas não em plenitude. Digamos que possui uma realidade por realizar: já é por si, mas fica o que será cumprido.


“O tempo vem, e já é chegado”, repete com frequência Jesus Cristo. É neste mesmo estado temporal que se situa a realidade simbólica: entre o “não todavia” e o “já aqui”. Temos que tornarmo-nos, temos que convertermo-nos no que realmente somos. E entre os dois, para que se encontrem e coincidam, para que a realidade simbólica se converta em realidade na plenitude, ha, como diz na Instrução Moral, um “caminho penoso a percorrer”, “trabalhos imensos (…) a efetuar sobre nosso espírito e nosso coração”.


Pode ser que nós, que nos sentamos ao Oriente, não estejamos mais próximos dele realmente que os aprendizes que nos contemplam de longe. Pode ser que sim, pode ser que não, nada é seguro ou certo, isto depende de cada um.


Mas uma coisa sim é segura: este Oriente, Ele está em nós, no mais profundo e secreto de nosso templo interior. E, se não profanamos este templo que é o seu, jamais Ele nos abandonará, jamais sua Luz nos entregará às trevas.


Jean-François Var


I.C.J.M.S.

Que Nossa Ordem Prospere !!!

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