Prosseguimos com nosso projeto de traduzir na integra a obra "Un Mystique Lyonnais et les Secrets de la Franc-Maçonnerie - 1730 - 1824" da arquivista francesa Alice Joly, chegamos ao capitulo XIII da referida obra.
Boa leitura.
O segredo da Maçonaria é um segredo político? — Divergências dos Cavaleiros Benfeitores. — Os Irmãos deputados nos Estados Gerais. — Inquietações e decepções de Périsse Duluc. — A Beneficência em 1791. — O círculo de Lyon permanece fora do Iluminismo revolucionário. — Evolução mística de Claude de Saint-Martin. — A Sociedade Filantrópica de Lyon. — Os eventos revolucionários destroem toda fraternidade maçônica. — O cerco de Lyon. — Jean-Baptiste Willermoz suspeito.
Outras emoções, outros temas de interesse apaixonavam, na França, o público culto. O entusiasmo pelos segredos da Maçonaria estava totalmente fora de moda. Agora, as pessoas se interessavam por política; criticavam as decisões do rei e os projetos dos ministros; tomavam partido na luta entre os parlamentos e o poder real. Os decretos, adotados em junho de 1788 por Loménie de Brienne, espalharam intensa agitação por todo o país. Esses decretos instituíam uma ampla consulta a todos os corpos constituídos para empreender uma reforma financeira e administrativa. O decreto de 23 de setembro de 1788, que anunciava a convocação dos Estados Gerais, não acalmou essa efervescência; pelo contrário, aumentou, pois deixou em suspenso as condições da eleição, a representação dos estados e o modo de convocação. Durante todo o inverno, em todos os pontos do reino, assembleias e reuniões privadas ou públicas discutiram essas questões primordiais até janeiro de 1789, quando finalmente foi fixado o regulamento das eleições; após isso, vieram as reuniões de eleitores, a redação dos cadernos e a escolha dos deputados. O país, devido à lentidão de uma administração hesitante, estava numa espécie de febre, ao mesmo tempo feliz e inquieta, onde muitos misturavam, com suas ilusões e desejo de melhorias, o gosto pela mudança e muitos sonhos mais ou menos puros de ambição pessoal.
Os discípulos de Willermoz haviam, como vimos, perdido muito de seu zelo. Será que o recuperaram favorecidos por essas circunstâncias? Essa consideração é importante, pois pode resolver, em um ponto e para a região de Lyon, a questão tantas vezes levantada desde Lefranc e Barruel sobre a responsabilidade da Maçonaria nos eventos que destruíram o antigo regime na França [1].
"Problema interessante, mas talvez insolúvel", como escreve o Sr. Dermenghen, embora os elementos que o compõem comecem a ser um pouco mais conhecidos[2]. Porque muitos dos que estudaram o assunto trouxeram mais opiniões pessoais do que rigor científico, mais criatividade do que precisão. Se atribuímos à Maçonaria um papel central na Revolução Francesa, geralmente é porque pensamos que ela tinha uma doutrina unificada e que seus membros formavam um grupo disciplinado na França, liderado por alguns indivíduos determinados. Isso tudo nos parece bastante problemático.
Após acompanhar Jean-Baptiste Willermoz em sua busca obstinada pelo segredo da Maçonaria, e conhecer o resultado de suas múltiplas experiências ao longo de mais de trinta anos de reflexões e pesquisas, ficamos um tanto perplexos ao ver tão facilmente mencionados termos como "espírito maçônico" e "ideal maçônico", como se houvesse, naquela época, apenas um único espírito e um único ideal nas lojas maçônicas: uma doutrina otimista e igualitária, com o objetivo de reformar sociedades e religiões, exaltar o orgulho humano e a fé no progresso material. O que é mais geral nas lojas não é de natureza doutrinária; sua unidade é puramente externa, derivada apenas do formato adotado. O sucesso das formas utilizadas na associação inglesa dos companheiros da construção faz com que as sociedades de Francos-Maçons se assemelhem e que se possa falar em Maçonaria; o que nelas é permanente é o que há de mais comum em uma sociedade de cristãos, pessoas do mesmo ofício. O dever de igualdade fraterna, a recomendação do segredo, a lenda, onde se quis ver todos os tipos de princípios subversivos e fermentos destruidores, eram condições bastante normais para uma reunião corporativa. O enigma surgiu apenas quando esse quadro teve que servir a mundanos e ricos burgueses. Todos os Francos-Maçons inteligentes reconheceram essa falha; eles tentaram remediar o estranho caso de sua sociedade que, tendo perdido todo sentido prático, já não tinha propriamente sentido algum. Vimos que eles conseguiram brilhantemente e que, graças a eles, o vazio na Maçonaria se tornou excesso de riqueza.
Modelo de adaptabilidade e oportunismo, a sociedade se ajustava a qualquer coisa e a qualquer um. Nascida na Inglaterra num momento em que o prestígio dessa nação se impunha à Europa, devido a seus sucessos militares e suas instituições liberais, a Maçonaria certamente se beneficiou desse patrocínio. Ela importou para o continente hábitos ingleses. Refletiu, sem dúvida, as ideias da moda do outro lado do Canal, as de John Locke, filósofo que via os homens como seres livres e racionais, naturalmente inclinados à virtude. No entanto, a instituição maçônica estava longe de estar aclimatada na França quando Montesquieu, em obras de grande repercussão, espalhava essas mesmas ideias racionais e liberais e as aplicava às questões sociais e políticas. É um fato comum observar que foi fora das lojas que Voltaire, Jean-Jacques Rousseau, Diderot e a maioria dos chamados Enciclopedistas escreveram suas obras, construíram seus panfletos, suas críticas, suas utopias.
Nunca foi estabelecido também que a Maçonaria francesa tenha tido, no século XVIII, um objetivo político definido. Seus segredos e ensinamentos variam. Nenhum deles sugere qualquer indício de conspiração contra os poderes estabelecidos. Sabemos que ensinavam a queda do homem pecador e sua incapacidade de realizar algo valioso sem ajuda sobrenatural, assim como os sentimentos efusivos e o otimismo dos filósofos mais recentes. Certamente buscavam a Pedra Filosofal e a Panaceia, observavam métodos de vida espiritual e praticavam o magnetismo. A doutrina maçônica, se é que existe tal doutrina, pode ser comparada a um mosaico colorido formado por fragmentos diversos, alguns desgastados e ultrapassados, outros seguindo a moda do momento.
O único vínculo que atrai essas pessoas tão diferentes e as reúne é o gosto pelo mistério, o culto ao segredo por si só. Esse atrativo fez mais pelo sucesso das lojas do que algumas ideias filosóficas que os franceses já conheciam fora delas. Pode-se até argumentar que, ao contrário, a Maçonaria se beneficiou do desejo de reagir contra a lógica, o espírito crítico, o culto à razão e à pretensão de entender tudo e reduzir tudo à medida humana na fria clareza, defendida pelos pensadores em voga. Entrava-se nas lojas para uma cura de mistério e absurdo. O homem não vive apenas de razão; ele é um animal místico que se apega facilmente aos mitos, ama os símbolos e se deleita na obscuridade.
O homem do século XVIII, apesar das aparências de ceticismo e espírito crítico, não escapava dessa lei comum; pode-se dizer que nenhuma sociedade foi mais do que a sociedade da época "voluptuosamente curiosa dos arcanos". A unidade de ação na Maçonaria nos parece ainda mais problemática do que a unidade de inspiração. Depois de ler muitos livros, examinar muitos documentos antigos, restos de arquivos e correspondências de Francos-Maçons, não encontramos nenhuma compreensão real, nenhuma colaboração séria entre as lojas daquela época. A história dessas sociedades não mostra sinais de um desenvolvimento lógico conforme um plano preconcebido. Parece que há uma tendência em pintar um quadro muito otimista da união que o Grande Oriente francês havia alcançado com a maioria dos outros regimes que floresciam no reino.
Não se pode ser impressionado pelo grande número de lojas e seus membros quando se percebe que a falta de assiduidade é a regra e que o caos reina em quase todos os ateliês. As lojas mais célebres, os maçons mais zelosos não estavam isentos dessas falhas; a maioria, sabemos, não levava o assunto muito a sério. A hierarquia dessa organização, centralizada sob uma única direção, é perfeita apenas na teoria. Na realidade, o poder central se exerce apenas em trivialidades, e qualquer projeto geral e prático encontra dificuldades infinitas e acaba em fracasso. Em meio século de sucessos brilhantes, a Maçonaria demonstrou apenas sua impotência e inutilidade. Forte sintoma da história dos costumes, ela tem pouco impacto nos eventos do século; para seus membros, era uma espécie de jogo teatral e ilusório, realizado à margem da vida real e com pouca influência sobre ela.
Não entendo como se pode personificar uma associação tão artificial e pouco unida, nem como se pode representá-la como uma espécie de poder que pensa, decide, escolhe pessoas, adota uma ou outra tática e conspira em um vasto plano de dominação e destruição: longe de ser "a inspiradora intelectual das revoluções do final do século" [3].
Quem eram aqueles entre os Maçons que tramavam nas sombras negros complôs contra o rei e a Igreja, ou elaboravam tranquilamente vastos planos de regeneração universal? Esses superiores incógnitos da Maçonaria aplicada à política, perversos destruidores ou audaciosos inovadores, conforme o gosto, eram no século XVIII verdadeiramente desconhecidos, assim como os elusivos descendentes dos Templários. Os únicos personagens que encontramos nas lojas francesas eram nobres, oficiais, eclesiásticos, burgueses e comerciantes abastados. Eles formavam um grupo de pessoas distinguidas, uma espécie de círculo um tanto ridículo, inclinado principalmente para emoções coletivas, torneios de eloquência e reuniões espetaculares; no entanto, nunca foi provado que escondessem sob suas aparências pacíficas um grupo de conspiradores determinados.
Entretando, foram apontados como instigadores do complô Weishaupt e os Illuminati da Baviera. Aqui encontramos o testemunho de François-Henry de Virieu e os alarmantes comentários que ele teria feito após Wilhelmsbad, entre seus amigos. Segundo os Memórias sobre o Jacobinismo, ele retornou da Alemanha convencido de que "uma conspiração tão bem urdida e profunda estava sendo tramada que seria difícil para a religião e os governos não sucumbirem a ela". Os historiadores anti-maçônicos frequentemente se valeram dessa tradição; veem nisso a prova da existência do pernicioso complô, com a indicação de que seus líderes estavam na Alemanha. Mas, ao examinar de perto as coisas, o testemunho desmorona ou pelo menos se reduz a proporções mais precisas.
Virieu, conhecido por seu caráter generoso de grande senhor bastante exaltado, tão apaixonadamente ligado ao seu rei e sua fé quanto defensor das reformas e das luzes, teria ele continuado sendo Maçom se estivesse convencido de que o objetivo de toda a Maçonaria era destruir o catolicismo e a monarquia na França? Isso é tão improvável que seu biógrafo Costa de Beauregard, um espírito lógico, afirma que a partir de 1782 ele compreendeu o perigo de se associar a uma instituição tão prejudicial e abandonou todos os laços com os Francos-Maçons. Infelizmente, sabemos que isso não corresponde à realidade. Antes e depois de Wilhelmsbad, Virieu permaneceu um dos mais zelosos e decorativos Cavaleiros da Cidade Santa. Portanto, qualquer certeza de que ele teria descoberto o complô que a Maçonaria organizava visando uma revolução política e religiosa desmorona.
Na realidade, o que havia despertado o justo horror do Grande Professo dauphinois durante sua estadia na Alemanha era o anticlericalismo agressivo e a afetação de desprezar o poder dos grandes e criticar a autoridade estabelecida que o Ordem dos Illuminati da Baviera, cujo fundador era Weishaupt, exibia. Isso não manchava de forma alguma a Maçonaria em geral, nem a dele em particular, desde que ela soubesse se defender da propaganda desses irmãos desviados. No entanto, era normal que Virieu estivesse preocupado, pois ele conheceu o Iluminismo no auge de sua prosperidade, quando seus promotores se esforçavam, por meio de suas intrigas, para suplantar na Alemanha a Ordem Retificada, enquanto Willermoz, com métodos semelhantes, tentava levar adiante o contra-complô dos místicos. Em 1782, existia de fato uma conspiração nos círculos maçônicos; tudo ali era apenas conspirações, jogos de espionagem, negociações secretas, recrutamentos secretos, promessas, traições e falsas aparências. Mas não se tratava de uma conspiração política. Ela se limitava ao universo fechado das lojas e, especialmente, aos Diretórios Escoceses da Ordem Retificada; é a esse pequeno mundo fantasioso que devemos atribuir os medos e as preocupações do Conde de Virieu.
Aliás, não quero insinuar de forma alguma que ele não tenha levado a sério a situação. Como bom discípulo de Willermoz, ele considerava a Maçonaria — a verdadeira Maçonaria, entenda-se — como uma grande escola de aperfeiçoamento humano, e essa convicção o fazia temer os ataques dos perversos que poderiam se unir para destruí-la. Mas seu zelo, como o de todos os verdadeiros Maçons, só poderia aumentar diante de um perigo claro e iminente. De fato, esse foi o sentimento que observamos em todos aqueles que colaboraram com a reforma espiritualista instituída no Convento de Wilhelmsbad. O entusiasmo só esfriou depois que a prática do magnetismo animal deu um novo rumo aos pensamentos dos Francos-Maçons místicos. Além disso, naquela época, a Sociedade dos Illuminati não representava mais uma ameaça para eles. Proibida desde 1784 pelo Eleitor da Baviera, ela se dispersou sem que os outros Maçons da Alemanha demonstrassem algo além de indiferença e alívio por se livrarem desses poucos indivíduos amargos, excitados e comprometedores que Weishaupt reunia em suas Classes Minerval.
Este não é o lugar para discutir se o Iluminismo alemão poderia ter exercido uma influência subversiva sobre a França e, assim, se teve uma influência oculta sobre a sociedade francesa. Sem considerar o fato de que a Ordem antijesuíta não existia mais desde 1785, sem entrar em detalhes sobre se ela já havia desejado ou tido os meios para estender sua propaganda à França, imaginou-se, desde 1792, ao aproximar o irreligioso dos Jacobinos das doutrinas anticlericais de Weishaupt, que havia uma misteriosa aliança de longa data entre os dois partidos. Mas isso não passa de uma lenda, cuja origem e desenvolvimento o Sr. R. Le Forestier estudou e demonstrou sua certa inanidade.
O Sr. Bernard Faÿ identifica Benjamin Franklin como um dos principais promotores das ideias anticlericais e antiautoritárias, um dos "chefes mais perspicazes já possuídos por uma organização". Ele vê nele a alma da propaganda maçônica e destaca essa personalidade típica de um bom quacre, "selvagem" à moda antiga e maçom virtuoso, que soube habilmente organizar sua propaganda e negociar uma aliança frutífera em favor de seus compatriotas revoltados.
No entanto, devo admitir que não consigo reconhecer, em todos os eventos da guerra pela independência americana, a marca de uma ação tipicamente maçônica. Para mim, há uma grande diferença entre usar as sociedades maçônicas para um fim específico e abraçar esse fim por obediência a alguma vontade mítica superior chamada Maçonaria. Parece ser esse o ponto de vista ao qual o Sr. Bernard Faÿ adere — já não se sabe muito bem ao ler suas obras se os desejos de Washington e, especialmente, de Franklin não eram tanto unir e coordenar os esforços de seus compatriotas e garantir alianças para assegurar o sucesso de sua causa, quanto lançar na Europa o "mito da revolução virtuosa", comprovar a santidade da rebelião e provocar o "suicídio maçônico" da nobreza francesa. Graças a isso, Franklin poderia "retribuir à Maçonaria o que ela fez pela América, pois ele adicionou imensamente à glória da Ordem". Nesse caso, gostaríamos de saber como a Grande Loja de Londres avaliava a interpretação de Franklin sobre seus deveres maçônicos e a glória da Maçonaria! Mas deixemos de lado essas brincadeiras e especulações engenhosas. Sabemos muito bem que há todo tipo de outras razões válidas — independentemente de influências ocultas — para explicar a formação dos Estados Unidos e até o entusiasmo da sociedade francesa pela guerra americana, a personalidade de Benjamin Franklin e o sistema democrático estabelecido pelos colonos transatlânticos.
Se os maçons franceses tivessem conspirado para destruir o regime político de seu país, poderiam facilmente encontrar ideias de reforma entre si, sem precisar de um sinal de ordem da América ou da Alemanha. Mas devemos proibir qualquer hipótese desse tipo, pois não há evidências para sustentá-la. Toda a literatura maçônica do século XVIII que conhecemos mostra os Irmãos franceses como respeitosos ao poder estabelecido e à pessoa de seu rei: a menos que vejamos suas intenções subversivas em seu desejo frequentemente expresso de agir como cidadãos virtuosos e contribuir para o bem comum. Por isso, por "instinto de prudência e preocupação com a precisão", mantemos, enquanto esperamos por alguma prova melhor, as opiniões dos historiadores da Revolução Francesa que atribuem à Maçonaria um papel muito limitado, ou as conclusões moderadas dos Srs. Le Forestier e Dermenghem, que estudaram especialmente a história das sociedades secretas.
Isso não significa que alguns maçons não tenham tido um papel importante na história de seu tempo. Acreditamos que sua responsabilidade foi individual e é injusto atribuí-la ao grupo do qual faziam parte. Se alguns se destacaram por suas ideias progressistas e amor por sistemas utópicos, não foram os únicos. Naquela época, na França, os clubes, reuniões, sociedades e academias desfrutavam de verdadeira prosperidade. Sua atividade era intensa. Alguns desses círculos merecem o título de "Sociedades de Pensamento" com muito mais justiça do que a Maçonaria. Os trabalhos que deixaram para trás transbordam de projetos de reforma, dissertações mais ou menos ousadas; mostram que a fé no progresso, a generosa esperança em um futuro melhor, o gosto por generalizações e o desprezo pela experiência são características gerais do espírito daquele século.
Certamente, não é um bom sinal para um Estado quando os cidadãos são obrigados a se interessar ativamente pelos assuntos públicos e se sentem justificados em oferecer suas sugestões e boa vontade. No entanto, isso é apenas uma consequência e não devemos deslocar as responsabilidades. As verdadeiras causas das revoluções políticas surgem das desigualdades sociais tornadas insuportáveis pela arbitrariedade e desordem econômica, pela fraqueza dos governos e pela incapacidade das administrações. Mas quanto à epidemia das vocações políticas, ao fervor das ideias reformistas e à formação de ligas, clubes e sociedades secretas ou não, elas podem facilitar ajustes sem traumas e evoluções sem revoluções — esta é outra história, frequentemente contada pela História, antes e depois do surgimento da Maçonaria.
Meu desejo, ao lidar cuidadosamente com essa questão complexa, foi expor as razões do caminho que escolhi. Um caminho tão distante dos "pleitos virulentos e romances policiais" que compõem os historiadores antimaçônicos, quanto das perspectivas brilhantes da história intuitiva e impressionista, que têm suas razões que a razão não compreende. Meus escrúpulos são ainda mais moderados porque se assemelham aos dos "historiadores universitários" e se multiplicam com os do chartista, empenhado em reunir o máximo possível de documentos autênticos antes de tentar reconstruir o passado. Quando se trata de Maçonaria, essa empreitada não é tão impossível como muitos gostam de afirmar. Meu objetivo é apenas contribuir para o debate ainda aberto com as informações coletadas sobre como Jean-Baptiste Willermoz e os membros dos Diretórios Escoceses Retificados se comportaram durante a turbulência revolucionária.
Seria interessante ter acesso aos registros dos diferentes círculos maçônicos presididos por Jean-Baptiste Willermoz, como Benevolência, Regência Provincial, Diretório Escocês, Colégio de Professos, Círculo dos Iniciados, onde seu pequeno grupo de seguidores se reunia. Poderíamos avaliar se os eventos contemporâneos tinham imediata influência nesses círculos, ou se a Maçonaria Retificada considerava, como o Grande Oriente em julho de 1789, que questões políticas não deveriam ser tema de seus trabalhos maçônicos, por ser "contrário aos regulamentos". Infelizmente, esses registros estão ausentes. Portanto, não podemos saber se Willermoz permitiu que suas lojas fossem invadidas pelas preocupações do momento, nem se ele fez recomendações específicas aos seus Irmãos durante os períodos eleitorais. A regra maçônica, especialmente a dele, não previa suficientemente o dever do Maçon? Recomendava-lhe ser devoto ao rei e à pátria, fiel à religião e agir, em toda ocasião, como um cidadão exemplar, dado que "as ocupações comuns e ordinárias do cidadão foram santificadas pelos votos livres e voluntários do Maçon". Cada Cavaleiro Benevolente interpretou seu dever de maneira liberal e vaga, o que na prática levou a resultados bastante variados. Em todo caso, parece que nenhum Irmão se sentiu obrigado a alinhar suas convicções políticas com as de seus superiores.
Périsse Duluc relata, a esse respeito, uma anedota significativa: "Foi no final de dezembro de 1788 ou no início de janeiro de 1789. M. Necker tinha solicitado ao Bureau Intermédiaire do Departamento a opinião do próprio Departamento, então reunido, sobre o voto por ordem ou por cabeça. As discussões foram acaloradas sobre as pretensões da nobreza e do clero, e o Marquês de Regnault, muito próximo de Rachais, que há muito tempo morava em sua casa atrás dos tilheiros, sem dúvida lhe falou da energia que eu havia demonstrado na defesa dos direitos da nação... De qualquer forma, em um dia de Grandes Professos, na sexta-feira, Rachais veio duas horas antes da assembleia me procurar em meu depósito e discutir minha opinião sobre a superioridade, ou melhor, igualdade nacional e cívica. Ele começou de maneira bastante moderada, mas finalmente, falando com certo orgulho sobre a preeminência da nobreza, não apenas política, mas também natural, como se os nobres fossem de fato de outra raça, de outro sangue, ele me fez dizer claramente que estava surpreso com sua opinião, dada os princípios que ele professava conosco; quanto a mim, me considerava nobre como ele e o considerava burguês como eu.
Ele me interrompeu vivamente e com um tom ofendido, como se eu o tivesse insultado, ele me disse: 'Monsieur! Monsieur... como irmão na Ordem dos Grandes Professos, eu o aceito'. Isso foi dito com um tom de arrogância e desdém.
Eu retomei friamente: 'Monsieur, não estou falando com você neste momento como irmão, estou discutindo com você como homem e como cidadão, e é nessa qualidade que não reconheço nobreza além daquela baseada em virtudes e méritos pessoais, e digo ainda que, sob essa perspectiva, você merece respeito. Mas pelo mesmo princípio, afirmo que existem muitos nobres de maior qualidade do que você, a quem eu não cederia. A nobreza hereditária, continuei, é uma fundação das nações, que invadiu uma monstruosidade política, que arruína pelo preconceito, honras e posição que são devidas apenas ao mérito. Acredito que os Estados Gerais do século XVIII, compostos por pessoas esclarecidas, destruirão na França esse edifício gótico e abolirão a nobreza hereditária para estabelecer os direitos do homem e do cidadão na constituição francesa'.
Nosso irmão não gostou disso, ele me disse que na constituição francesa, que não se pode atacar, a nobreza é a própria nação.
Eu impaciente, o interrompi dizendo: 'Sim, senhor, foi isso que eu disse há pouco, que todos os franceses são nobres quando são bons cidadãos, mas além disso, esta conversa continua inutilmente, parece que você não está mais disposto a reconsiderar sua opinião, o que eu o parabenizo por gostar, do que eu em abandonar a minha."
"Ele me deixou imediatamente, dizendo entre os dentes que íamos perder o reino e que a nobreza generosa e orgulhosa pereceria, em vez de abandonar seus direitos e se deixar aviltar."
Entre as opiniões extremas desses dois maçons, reunidos por um instante na parte de trás de uma livraria, havia espaço para toda uma gama de nuances, que representavam bem as opiniões da época, na véspera da reunião dos Estados Gerais, oscilando entre um conservadorismo intransigente e princípios igualitários e liberais, prelúdios de uma perspectiva ilimitada de reformas.
Desde os primeiros movimentos que antecederam as eleições planejadas em Lyon, Périsse Duluc se destacou entre aqueles que imediatamente começaram a lutar contra a administração municipal. Vale mencionar que, sendo já administrador da Charité, ele estava familiarizado com os assuntos da cidade. Mais ou menos na mesma época, Jean-Jacques Millanois também abandonou todas as suas ocupações maçônicas para se dedicar à causa pública. O objetivo era impedir que o prévot dos Marchands, Tolozan de Montfort, Imbert-Colomès, o primeiro échevin, e o consulado, a aristocracia burguesa da cidade, conseguissem eleger os deputados do Terceiro Estado, sob sua influência e em benefício próprio. A luta foi, por vezes, acirrada. A eleição de Périsse Duluc causou alguns incidentes entre o corpo consular, que tentava afastar um de seus adversários, e o sindicato dos livreiros, que defendia seu candidato. Foi o ministro Necker quem teve de restabelecer a eleição anulada, em 21 de março de 1789. Quanto a Millanois, ele conseguiu fazer valer os direitos dos eleitores da cidade, que reivindicavam o direito de nomear o mesmo número de representantes que os eleitores das áreas rurais circundantes. Durante a sessão de 21 de março, ele demonstrou sua eloquência e sua capacidade de elevar os debates de questões particulares a generalizações entusiásticas. Os sentimentos que ele expressava e o espírito metódico que demonstrava pareceram ao historiador dos primórdios da Revolução em Lyon representar "em toda a sua grandeza generosa o puro espírito de 1789".
Por mais generoso que fosse em seus discursos, Millanois, na prática, trabalhava principalmente em sua própria eleição e na de seus amigos Goudard, Boscary e Barroud, que pertenciam, como ele, ao mundo judiciário e à rica burguesia da cidade. Ao lado deles, Périsse, simples livreiro, parecia um indesejável, não tanto por suas ideias, mas por sua condição social. A amizade, nascida na loja sob a égide de Willermoz ou ao lado dos sonâmbulos, não era muito sólida. Périsse Duluc teve todas as razões para pensar que, entre aqueles que fizeram o impossível para impedir sua eleição, estava justamente seu colega Millanois [4].
No dia 4 de agosto de 1789, ocorreu na igreja dos Cordeliers a assembleia geral de encerramento das eleições. Os representantes do Terceiro Estado eram oito: quatro deputados da zona rural, entre eles Nicolas Bergasse, que era tão entusiasta da liberdade quanto havia sido do mesmerismo, e quatro deputados da cidade: Millanois e seu amigo Goudard, comerciante de sedas, Guillaume Couderc, banqueiro, e Jean-André Périsse Duluc. "Todos, aliás", escreveu um contemporâneo de opiniões severas sobre os inovadores, "eram conhecidos por sua probidade e até mesmo por sua erudição". O público também sabia que vários deles eram "iluminados". Mas confundiam Bergasse com os Cavaleiros Beneficentes, que estavam entre os eleitos. Estes últimos eram apenas três em toda a delegação de dezesseis membros: além de Périsse e Millanois, havia Jean-Antoine Castellas, decano do Capítulo, escolhido para representar o clero. Todos os três eram, aliás, dos mais íntimos colaboradores de Jean-Baptiste Willermoz.
Em 8 de abril de 1789, Périsse enviou um pequeno bilhete apressado ao hotel da loja, nos Brotteaux, prometendo comparecer a uma reunião dos Grandes Profès organizada na sexta-feira seguinte, com a intenção de pedir as luzes do Espírito Santo para os Irmãos deputados. Em 19 de abril, ele deixou Lyon rumo a Paris. Sua primeira parada foi em Vallières, pois seu papel de deputado não o fazia esquecer seu caráter de Iniciado. Passou uma noite na cela de Madame de Vallières. O comandante de Monspey, membro da Ordem de Malta, também foi designado deputado substituto do clero de Beaujolais, e pode-se imaginar que o Agente Desconhecido estava um pouco desligado do mundo espiritual para se focar nos eventos do dia. O bom Périsse pôde se recomendar às suas orações, assim como às de Jean-Baptiste Willermoz e Madame Provensal.
A fidelidade de sua amizade e sua fé como Grande Profès convicto são evidentes nas cartas que enviou ao seu mestre durante sua estadia na capital. Vemos a intimidade que existia entre ele e a família Willermoz e o afeto carinhoso, às vezes tingido de brincadeiras um pouco pesadas, que sentia por Madame Provensal. Em suas cartas, encontramos o hábito de usar apelidos, uma mania inocente, comum em muitos outros círculos de amigos. Para ele, Madame Provensal não era a "mãe", mas a "esposa" e a "querida mulher". Ele lhe dirigia as confidências mais íntimas de sua vida mística. Mas seria um erro pensar que as cartas do deputado lionês tratavam apenas desses assuntos. Périsse Duluc, de 8 de abril de 1789 a 31 de dezembro de 1791, escreveu não menos que quarenta e sete cartas ao seu amigo Willermoz para dar notícias da Assembleia, saber o que estava acontecendo em Lyon e discutir tudo que se relacionava, direta ou indiretamente, às suas sociedades maçônicas. Essa correspondência é interessante porque é simples e sincera, revivendo as esperanças e preocupações de um homem que, por algum tempo, esteve envolvido nos primeiros eventos da Revolução.
As revoltas dos trabalhadores parisienses em Versailles preocupavam Périsse Duluc. Ele sentia toda a ameaça perigosa da brutalidade desses movimentos populares. "Que Deus afaste esses caminhos!", escreveu ele já em 27 de abril. As intrigas, mesquinharias, a desordem e o "espírito de discórdia e fermentação" que perturbavam as primeiras sessões também lhe causavam grandes preocupações. Ele temia que a exasperação do povo fosse explorada por aqueles que queriam impedir as reformas e o estabelecimento de um governo liberal. Ele expressou claramente sua inquietude: "Embora você tenha lido minhas histórias de alegria pública, não pense que tive um momento de satisfação e paz". Nesta carta de 8 de julho, onde revelava sua angústia, ele também se queixava da deprimente solidão em que vivia em Versailles, no meio da multidão de deputados e da frequência das reuniões e deliberações.
Mesmo assim, nos surpreendemos com seu isolamento. Afinal, Périsse Duluc, um maçom de um regime aliado ao Grande Oriente, deveria encontrar muitos confrades na Assembleia. Será que não havia camaradagem entre os Irmãos deputados? Parece que não. Os representantes das diversas obediências que estavam em Versailles não parecem ter sentido a necessidade de se reunir, nem mesmo para um encontro de cortesia. Périsse Duluc, tão ansioso para contar ao seu mestre e amigo tudo o que se relacionava aos seus princípios, nunca mencionou ter recebido qualquer convite dos membros do Grande Oriente francês. Ele parece não ter tido a oportunidade de trocar qualquer ponto de vista com outros deputados sob a proteção da Maçonaria; o vínculo maçônico não lhe trouxe apoios nem conselhos. Aliás, Périsse nunca pareceu pensar nisso quando se tratava de tomar uma decisão política. No entanto, ele contava com a amizade de seus confrades da Ordem dos Cavaleiros Beneficentes, Profès como ele, também discípulos de Jean-Baptiste Willermoz. A Assembleia dos Estados reunia alguns deles. Além dos lioneses, Turkheim, o conde de Virieu, o duque d'Havré de Croy e um certo Lenoir de la Roche também foram nomeados deputados.
Infelizmente, desse lado, a decepção foi total. O pior foi o comportamento de Millanois. Em Paris e em Versalhes, esse compatriota, que tinha sido um discípulo próximo do mesmo mestre, esse Irmão com quem ele tinha tantos laços secretos, se mostrava frio e distante, tratando-o como um estranho. Não havia nenhuma divergência política que explicasse essa atitude estranha; ambos eram a favor das reformas e patriotas zelosos. Em Lyon, os dois faziam parte do grupo de Mirabeau. Mas Périsse notou que, apesar de terem as mesmas opiniões, a confiança entre eles estava desaparecendo. "Ainda não dissemos uma palavra sobre as grandes questões que nos envolvem, e, tirando as formalidades, não compartilhamos nossos princípios." Ficava claro que o ex-advogado do Rei preferia amigos mais influentes e ricos do que um simples livreiro, e que considerações frívolas eram mais importantes para ele do que princípios sérios.
Ficava claro também que os laços maçônicos eram incapazes de criar um verdadeiro espírito de colaboração entre os Irmãos. No entanto, como todos se conheciam há muito tempo, eram todos muito educados uns com os outros. O duque d'Havré de Croy convidou Périsse para alguns jantares. Turkheim era cordial e afetuoso. Virieu, em encontros rápidos, apertava mãos apressadamente. Mas ninguém parecia interessado em relembrar as doutrinas que formavam a base de sua fraternidade. Quando o Irmão Perseval de Frilleuse visitou Versalhes em nome da Beneficência de Paris e pediu aos confrades deputados que escolhessem um dia para uma sessão solene em sua honra, não houve entusiasmo. Périsse estava muito ocupado para ir a Paris perder tempo, Millanois evitou o convite, e a reunião não aconteceu.
Em Lyon, no entanto, Willermoz estava preocupado com tanta indiferença e pediu a seu correspondente mais detalhes. Périsse enviou-lhe uma lista dos Irmãos de Versalhes, dando todas as informações sobre as opiniões políticas de seus discípulos e sobre seu zelo maçônico. Castellas, "por zelo por seu bispo", Monsenhor de Marbœuf, era um "aristocrata teimoso sem saber por quê". Ele só procurava Périsse quando o partido dos nobres estava em alta, mas quando o Terceiro Estado triunfava, evitava-o. O duque d'Havré era um tolo, e o deputado de Lyon se surpreendia que tivessem elogiado tanto esse homem honesto, que não era nem um pouco distinto e representava a aristocracia em sua forma mais medíocre e limitada.
O conde de Virieu parecia extremamente ocupado e preocupado com os interesses da província que ele representava. Ele tinha grandes planos de uma constituição, onde o poder legislativo seria dado a duas câmaras, seguindo o modelo da Inglaterra. Mas essa ideia era combatida por todos os membros mais avançados da Assembleia. Périsse não demonstrava muita simpatia por Virieu e buscava qualquer motivo para criticá-lo.
Millanois era patriota, mas frio e distante, "tão misterioso e reservado sobre os Estados Gerais quanto sobre os resultados dos 'sonos'". Além disso, essa época dos "sonos" já era história antiga, e parecia que Millanois, antes um Maçom tão fervoroso, estava se tornando apático e indiferente.
O mesmo acontecia com Lenoir de la Roche, que agora era apenas um deísta e declarava não acreditar mais nos ensinamentos secretos que havia recebido. Turkheim, por sua vez, evitava falar sobre Maçonaria ou dar sua opinião sobre os eventos do dia.
Era um quadro desconcertante em todos os aspectos. Embora Willermoz nunca tenha descrito Lyon com tantos detalhes, sabemos o suficiente para perceber que a situação lá também não era muito satisfatória.
Comparando as listas impressas da Beneficência, parece que a sociedade manteve certa coesão até 1791. O número de Irmãos residentes em Lyon diminuiu ligeiramente: 65 em 1787, 63 em 1790, e apenas 53 em 1791. Por outro lado, o número de não residentes aumentou, atingindo cerca de vinte em 1791, enquanto alguns antigos membros desapareciam das listas. A loja propriamente dita perdeu cerca de dez membros. Em compensação, recuperou um Irmão importante na pessoa do abade Rozier, que nunca havia sido oficialmente inscrito em suas listas.
Depois de se dedicar a trabalhos de ciência e jornalismo científico, o abade Rozier fez viagens de estudo à Córsega e à Holanda, e depois se dedicou à agricultura prática em uma propriedade que comprou nos arredores de Béziers. Mas os problemas causados por seus maus relacionamentos com seu bispo o levaram a buscar refúgio em sua cidade natal. Ele comprou um grande jardim na colina da Croix-Rousse, onde planejava continuar suas experiências de agronomia em paz. A Academia de Lyon o recebeu com entusiasmo, confiando-lhe a direção dos viveiros públicos. Provavelmente por cortesia com seus velhos amigos os Willermoz, ele retomou seu lugar na loja.
Em 1791, a Beneficência mantinha quase todos os seus antigos membros. Os nomes habituais dos Willermoz, Rachais, Paganucci, Grainville, Savaron, Périsse Duluc, Castellas, Millanois, Bory, Monspey, etc., estavam presentes. Os novos membros eram simples plebeus, burgueses e comerciantes, que não podiam competir com as aquisições brilhantes do período anterior, como Guillin, procurador dos tribunais de Lyon, e Maisonneuve, administrador do Hôtel-Dieu. O nome do Grande Mestre da província estava em branco porque o substituto do duque d'Havré ainda não havia sido encontrado. O cavaleiro de Rachais e Périsse Duluc permaneciam como os dois dignitários mais elevados, responsáveis por dirigir toda a associação. Jean-Baptiste Willermoz estava modestamente inscrito, sem cargo, entre os Irmãos afiliados.
Na verdade, ele ainda era o centro de toda a associação. Em princípio, ele reunia seu Colégio de Grandes Professos às sextas-feiras e, a cada duas semanas, os Iniciados chamados para estudar as mensagens do Agente Desconhecido nas segundas-feiras. No entanto, não sabemos com que regularidade essas diversas sociedades se encontravam ou se realmente trabalhavam de maneira séria. O Agente ainda estava dedicado à sua tarefa de informador sobrenatural, e Willermoz à sua de recrutar alunos e ensiná-los suas doutrinas secretas. A Concorde também não havia desaparecido e ainda realizava tratamentos magnéticos, apesar de se falar muito em acabar com esse organismo ultrapassado. Mas os dias de harmonia fraternal e meditações em comum sobre temas de moral, terapêutica ou metafísica, já haviam passado.
Périsse e Willermoz, embora convencidos da importância de suas doutrinas místicas, também estavam tão envolvidos na política que acabavam esquecendo a Arte Real. Nos primeiros meses de sua correspondência, as questões maçônicas ocupavam pouco espaço em suas cartas. No entanto, em 16 de novembro de 1789, após uma conversa com dois viajantes suecos, muito interessados em ciências secretas, Périsse Duluc sentiu-se envergonhado por ter, por tanto tempo, negligenciado a Maçonaria. "O que você me diz do Irmão Lée, escreveu ele, me dá grande prazer. Eu não sabia que ele era um Grande Professo, ou tinha esquecido. Pois, querido amigo, acho que ainda não falei das nossas sociedades; não que as tenha esquecido, mas o tumulto das coisas ao meu redor, a parte que devo tomar nelas, me impede de me ocupar de nossos queridos princípios." Ao relembrar memórias tão próximas, parecia que ele já estava aludindo a um mundo desaparecido. Era difícil para ele encontrar as antigas trilhas que seguia com fervor no caminho místico. "Meu querido amigo, ore por mim, escreveu ele em 23 de março de 1790, após uma leitura de 'O Homem de Desejo' que Saint-Martin acabara de publicar, pois, de verdade, as distrações, intrigas, cabalas, e negócios me afastaram tanto de mim mesmo que não encontro mais, que não procuro mais a porta para entrar." Mais tarde, pedindo novamente a intercessão de Madame Provensal, ele se queixava de estar "como mármore", incapaz de sensibilidade interior, morto para toda vida espiritual. Sua experiência pessoal certamente lhe inspirava indulgência para o estado de espírito de Millanois, que se afastava cada vez mais de seus "objetos de fraternidade" e parecia lembrar de seus trabalhos ocultistas apenas como "a lembrança de ter sido enganado."
A Revolução, trazendo uma série de esperanças de um futuro melhor no campo político e social, também despertou, na mente de alguns iluminados, a ideia de que a nova aurora teria o significado mais amplo, brilhando também no campo espiritual. Em meio à inquietação geral, surgiu a esperança de que uma regeneração universal estava se preparando; em certos círculos de adeptos, alguns exaltados de ambos os sexos não hesitaram em anunciá-la. Profetas e profecias alcançaram grande sucesso.
Willermoz tomou conhecimento dessa nova corrente que a incerteza dos tempos trouxe ao iluminismo. Ele tinha tantas relações com seitas de todos os tipos que não poderia deixar de ser informado rapidamente sobre tudo o que acontecia nelas. Périsse, que estava ligado a Versalhes e Paris por suas funções, via frequentemente um certo Gombault, possivelmente ligado à sua Ordem, mas em todo caso bem inserido nos círculos que se ocupavam de teosofia e com acesso ao barão de Staël, embaixador da Suécia. O barão, como bom escandinavo, interessava-se muito por ciências ocultas, talvez por convicção ou para agradar à curiosidade de seu príncipe Carlos de Sudermânia. Era ele quem informava seus compatriotas sobre todos os segredos dos místicos franceses que podia conhecer. Um inglês, Bousie, amigo de Gombault, também fazia parte de seus círculos. Esses homens se encontravam todos no salão da duquesa de Bourbon.
Bathilde d'Orléans, irmã do duque de Chartres e mãe do duque de Enghien, interessava-se há muito tempo pela Maçonaria. Ela era Grande Mestra das lojas de Adoção e parecia mais convencida que seu irmão sobre a importância e seriedade dessas sociedades, que ela e ele honravam com seu alto patrocínio. A duquesa foi recebida como maçom em 1770. Bacon de La Chevalerie foi seu professor nas ciências maçônicas e seu introdutor no mundo do iluminismo; ela honrava seu mestre. As provações de sua vida privada e os impulsos de sua natureza generosa a ligavam fielmente ao partido dos místicos, mas sua ingenuidade e leveza natural a tornavam pouco exigente quanto à qualidade do incenso cujo perfume perturbador ela gostava de respirar. Claude de Saint-Martin, que ela contava entre seus amigos, tentava purificar a atmosfera e direcionar essa "mulher de desejo", de julgamento fraco, à perfeição. Foi para ela que ele publicou, em 1792, a obra intitulada Ecce Homo. Nesses anos, a duquesa de Bourbon também demonstrava grande entusiasmo pelas reformas políticas. Reflexo fiel de seu irmão Philippe-Égalité, ela exibia, sem dúvida de maneira mais desinteressada, ideias muito liberais. Seu salão reunia, de forma mista, revolucionários, notórios Maçons e todos os místicos e iluminados da moda que ainda estavam em Paris.
Gombault foi o introdutor de Périsse nesses círculos meio mundanos, meio ocultistas da capital? O deputado de Lyon tinha notoriedade suficiente por si mesmo para não precisar de recomendação? Seja como for, sabemos que ele frequentava o salão da duquesa de Bourbon e que, em novembro de 1789, recebeu, por intermédio de Gombault, a visita de dois suecos notáveis, Reuterholm e Silwerhielm, que estavam de passagem por Paris antes de se iniciarem nos segredos de uma nova sociedade mística, cujo sede era em Avignon e cujo superior era o beneditino Dom Pernety.
Assim, Willermoz reencontrava, após muitos anos, esse personagem que havia, anteriormente, encorajado a vocação de alquimista de seu irmão Pierre e que lhe havia oferecido um lugar em sua casa e em seus fornos. Nesse ínterim, Dom Pernety havia viajado bastante, tendo rompido com a congregação de São Mauro, seguido a expedição de Bougainville por um ano como capelão e passado mais de dez anos em Berlim com Frederico II, de quem foi bibliotecário. No meio de todas essas mudanças, ele não havia mudado muito. Como vinte anos antes, ele ainda mantinha a esperança tenaz de um dia fabricar a Pedra Filosofal.
Já em 1765, fugindo das perseguições dos superiores de sua Ordem, ele passou algum tempo em Avignon, sob a proteção do Cardeal Legado, e ocupou o tempo de seu exílio organizando, sob o nome de Rito Hermético, uma espécie de academia de ciências alquímicas. Foi para essa região que ele se dirigiu em 1785, depois de decidir deixar a Alemanha para evitar a desgraça do rei da Prússia.
Pernety retornava com uma bagagem rica de novas doutrinas, das quais, incansável compilador, compôs seu ensinamento secreto. Ele havia lido Boehme e traduzido Swedenborg. Ele retornava principalmente acompanhado por um pequeno grupo de fiéis que desempenharam um grande papel no estabelecimento e desenvolvimento da seita chamada Sociedade dos Iluminados de Avignon. Era uma espécie de Maçonaria dedicada à descoberta da Grande Obra, mas cujas doutrinas eram bastante complexas. Elas misturavam as teorias de Boehme e Swedenborg sobre a criação e o mundo espiritual, e as antigas lendas do Graal, com os segredos de um personagem enigmático conhecido sob o pseudônimo de "Elie Artiste", que parece ter vivido em Hamburgo. Foi desse mestre misterioso que Pernety obteve a explicação dos emblemas alquímicos; foi dele que recebeu amostras de "matéria filosófica". O rito também utilizava a doutrina católica e pretendia associar a missa e os sacramentos às iniciações dos adeptos.
Tornava-se Iluminado por meio de uma ordenação. A consagração acontecia em uma colina, após uma novena preparatória; um anjo especial era escolhido para ser o guia e inspirador de cada um; um banquete místico completava a cerimônia. O discípulo de Pernety supostamente se tornava capaz de consagrar sua vida às mais elevadas pesquisas herméticas, pois sua ordenação o capacitava a se comunicar com seres celestiais, por visão ou audição da "palavra santa". Os prodígios mais extraordinários favoreciam a sociedade e o rumor se espalhou além das fronteiras do Comtat e até do reino da França.
Às suas ideias fantásticas, o ex-beneditino misturava uma convicção cada vez mais viva de ter sido especialmente escolhido por Deus para anunciar, mais uma vez, o reino de Deus e o Evangelho aos homens. Suas convicções coincidiam com as concepções de todos os que pregaram que, das ruínas e catástrofes causadas pela justiça divina que pesava sobre a maldade terrestre, nasceriam mil anos de felicidade, reservados apenas aos fiéis que soubessem ouvir a voz dos profetas. Ele pregava que deveria ser o pastor do novo reino e que a Nova Jerusalém deveria se erguer no sul da França, às margens de um rio. Foram essas vaticinações que levaram à instalação em Avignon da seita dos Iluminados. O próprio Pernety habitava Bédarrides, nos arredores da cidade dos papas, na casa de um de seus discípulos, Vernety de Vaucroze, que lhe havia oferecido uma pequena casa em sua propriedade chamada Thabor. O mago ali prosseguia em paz seus trabalhos herméticos e celebrava o culto singular do qual era um dos inventores.
Avignon não fica muito longe de Lyon, e Pernety, por meio de muitos membros de sua família, estava ligado à região de Lyon e era bem conhecido dos Willermoz; no entanto, os Cavaleiros Benfeitores não parecem ter sabido muito sobre seu retorno e o desenvolvimento de sua seita. Isso ocorreu em anos em que estavam muito ocupados com seus sonâmbulos e seus próprios milagres para prestar muita atenção ao que acontecia fora. Se Willermoz tivesse sido informado sobre o movimento de Avignon, a opinião desdenhosa que ele nutria sobre os trabalhos dos alquimistas teria sido suficiente para afastá-lo.
Mas, em 1789, a sociedade de Avignon, em seu auge, atraía curiosos ávidos por novidades e milagres de todas as partes; ela merecia sua atenção.
Dos dois suecos que Périsse encontrou em Paris em novembro de 1789, um era o barão de Reuterholm, camareiro da rainha da Suécia, e o outro era o barão de Silwerhielm, capitão da guarda do rei. O deputado de Lyon não sabia muito bem como se escreviam seus nomes. Parecia também ignorar que Silwerhielm era sobrinho de Swedenborg. Mas ele estava convencido de que esses templários estrangeiros eram pessoas "muito bem informadas sobre tudo o que se dizia em ciências secretas, comunicações espirituais, visões, baterias" e que tinham dessas coisas "noções e talvez realidades". Ele esperava que Willermoz pudesse mantê-los em Lyon e instruí-los. Por sua parte, ele foi muito amável e até emprestou a Reuterholm a soma de 350 libras. No entanto, ele continuava achando que não se devia acreditar cegamente em tudo o que se dizia sobre Avignon e avançava até atribuir, antecipadamente, a seu mestre Willermoz, essa atitude de reserva prudente, um pouco tingida de desdém, que certamente desejava que ele adotasse.
[Nota do Blog Primeiro Discípulo: Infelizmente, o Rito Escocês Retificado está repleto de indivíduos estranhos, auto intitulados "iluminados" e que se arrogam o papel de gurus. Entre essas figuras excêntricas, encontramos um que escreveu sua própria "revelação sagrada", repleta de erros teológicos e fórmulas heréticas; outro que fundou uma igreja e se autointitulou Papa. Além de seu personagem principal, iludido por uma falsa vidente em seus delírios milenaristas, acreditava ser o centro de uma nova revelação que transformaria ele e seu grupo de maçons em um novo marco histórico e ponto de iluminação para o mundo, trazendo a verdadeira compreensão sobre Cristo, e até sugerindo a queima de tudo o que fora produzido nos concílios ecumênicos da Igreja Cristã.
Essa característica doentia e recorrente de muitos personagens da época, cada um com suas próprias visões e interpretações do espiritual e do esotérico, levou-os a se proclamarem portadores de uma verdade suprema e salvadora, o que, no fim das contas, apenas testifica o quão perdidos estavam em suas buscas.
Estamos convictos de que o que faltava à maçonaria no século XVIII era a presença de um olhar clínico e racional, o que poderia ter ajudado a equilibrar essa efervescência de crenças e prevenir o desenvolvimento de doutrinas tão extremas e, em muitos casos, doentias e delirantes.]
Avignon não fica muito longe de Lyon e Pernety, por muitos membros de sua família, estava ligado à região de Lyon e era bem conhecido pelos Willermoz; no entanto, os Cavaleiros Beneficentes não parecem ter sabido muito sobre seu retorno e o desenvolvimento de sua seita. Isso porque o fato ocorreu em anos em que eles estavam muito ocupados com seus sonâmbulos e seus próprios milagres para prestar muita atenção ao que se passava fora. Se Willermoz tivesse sido informado sobre o movimento de Avignon, a baixa opinião que ele tinha sobre os trabalhos dos alquimistas deveria bastar para afastá-lo. Mas, em 1789, a sociedade de Avignon, no seu auge, atraía curiosos ávidos por novidades e milagres de todas as partes; ela merecia sua atenção.
Dos dois suecos que Périsse encontrou em Paris em novembro de 1789, um era o barão de Reuterholm, camareiro da rainha da Suécia, e o outro o barão de Silwerhielm, capitão da guarda do rei. O deputado de Lyon não sabia bem a grafia dos nomes deles. Ele também pareceu ignorar que Silwerhielm era o próprio sobrinho de Swedenborg. Mas estava convencido de que esses templários estrangeiros eram pessoas "muito bem informadas sobre tudo o que se diz em ciências secretas, comunicações espirituais, visões, baterias" e que tinham dessas coisas "noções e talvez realidades". Ele esperava que Willermoz pudesse retê-los em Lyon e instruí-los. Por sua vez, mostrou-se muito amável e até emprestou a Reuterholm uma quantia de 350 libras. No entanto, ele achava que não se devia acreditar cegamente em tudo o que se dizia sobre Avignon e já antecipava para seu mestre Willermoz essa atitude de reserva prudente, um pouco matizada de desdém, que certamente desejava que ele adotasse.
Provavelmente, essa foi a atitude de Willermoz, que conseguiu estabelecer relações amigáveis com alguns Iluminados de Avignon, sem se comprometer com eles. Ele soube, sempre por Périsse, que os suecos tinham sido admitidos nas confidências dos avignoneses, pois foram enviados a Roma para consultar o famoso Ottavio Cappeli, que alguns acreditavam ser o inspirador supremo de toda a sociedade. Na realidade, esse Ottavio Cappeli era o mestre suposto apenas de uma facção dissidente que, sob o nome de "Novo Israel" e sob a direção do conde polonês Gabrianka, pretendia viver separadamente e encontrar, por seus próprios esforços, o reino de Deus e a Pedra Filosofal. Périsse não teve nenhuma notícia da viagem a Roma. Portanto, ele não soube o que os viajantes puderam aprender na Itália sobre o patriarca dos avignoneses, aquele pobre jardineiro que se vangloriava de conversar com o arcanjo Rafael, mas que, preso por ordem do Santo Ofício, retratou todas as suas pretensões de espiritualidade milagrosa e negou todas as ligações que poderia ter com os maçons. Reuterholm, ao retornar a Paris, evitou cuidadosamente o deputado Périsse, que suspeitava que a lembrança do dinheiro emprestado pudesse ser a causa dessa frieza.
Foi o Gombault quem trouxe aos lyonenses os primeiros ecos da aparição de uma nova profetisa, Srta. Labrousse, que começava a causar sensação no mundo dos iluminados e até mesmo na Assembleia Constituinte. Périsse soube dessa notícia em março de 1790; ele imediatamente questionou Dom Gerle, prior dos Cartuxos, que também era seu colega, como deputado do clero na Assembleia Constituinte e que garantia as virtudes da vidente e a antiguidade de suas predições. Estas eram importantes.
"Ela anunciou que nos Estados Gerais, todos os homens deverão ser colocados no mesmo nível, o clero será humilhado e punido, a revolução deve ser geral. A França será o centro dessa revolução. O Papa estará ligado à Revolução. Haverá grandes eventos físicos e morais. Muitos morrerão, e a paz renascerá com a fé e com a religião." [5].
Não vamos discutir se, de fato, Suzette Labrousse tinha chegado a tal precisão desde o início de sua carreira profética, ou mesmo na época em que Dom Gerle a descobriu, cerca de dez anos antes da abertura dos Estados Gerais. Périsse Duluc conhecia as profecias da senhorita apenas pelos panfletos que circulavam sobre ela e pelas informações que obtinha do prior dos Cartuxos. Dom Gerle, que a conhecia há doze anos, tinha a maior confiança em sua inspiração. Ele estava totalmente convencido de que ela expressava os desígnios de Deus; a tal ponto que, por causa dela, ele se envolveu na política, votava com os patriotas e denunciava os erros do clero, para grande escândalo dos membros de sua ordem e aplauso dos partidos avançados. Mas o que a "senhorita do Périgord" não previa? Ela anunciava a restauração da fé, a conversão dos judeus, a reunião das seitas, a destruição dos ímpios, a paz geral e a Revolução se estendendo ao papado. Ela também previa uma revolução física, e que se veria uma imagem ao lado do sol... Pamfletos, vindos de seus partidários e parentes, circulavam em Paris, tanto nos círculos místicos quanto nos clubes políticos. Diziam que toda uma documentação havia sido enviada à Sorbonne e ao Guarda dos Selos. No entanto, apesar da importância dessa manifestação e da boa fé de seu principal defensor, Périsse permaneceu cético. "De tudo isso," escrevia ele a Lyon, "o que devemos acreditar, nós que vimos tantas dessas maravilhosas previsões não se concretizarem?" Ele não hesitava mais alguns meses depois. Após ter jantado várias vezes com a profetisa e conversado com ela, sua opinião tornou-se francamente negativa. A pobre moça lhe pareceu completamente iludida sobre a realidade de seus dons e sua missão [6].
É bastante notável que, informado sobre os eventos mais marcantes do que se chamou de Illuminismo revolucionário, Willermoz manteve, em todas essas ocasiões, uma reserva prudente. Essa forma de julgar, bastante incomum, indica que o lyonês se interessava ainda mais pelos milagres que lhe eram especialmente destinados e que poderiam contribuir para aumentar sua notoriedade e importância? Sugere que as experiências dos anos passados, com Mlle Rochette e o Agente Desconhecido, deram frutos? É justo notar que Périsse era, naquela época, o informante de seu mestre e que sua moderação é certamente responsável, em grande parte, pela sabedoria que observamos.
No entanto, o pequeno círculo não abandonou completamente sua fé secreta. Se os eventos do dia faziam com que alguns relegassem as preocupações espirituais ao último plano de suas prioridades, alguns permaneciam fiéis às suas doutrinas e práticas: como os Coens, que, no equinócio de março de 1790, fingiam estar doentes para poder se "retirar em seu particular", e, principalmente, Saint-Martin, que voltou a compor obras filosóficas e místicas.
Claude de Saint-Martin, no entanto, havia mudado. Sua última obra, "L'Homme de désir", publicada em 1790, tinha acentos mais livres e poéticos do que tudo o que ele havia escrito até então. Certamente, ele permanecia fiel a seus antigos amigos e não deixava, por exemplo, de visitar Périsse toda vez que estava na capital; mas sua vida se fixara em Estrasburgo e o centro de interesse de sua meditação interior não era mais apenas o Tratado da Reintegração. Ele havia aceitado Jacob Boehme como diretor espiritual ao lado de Don Martines. A pessoa responsável por essa evolução foi Mme de Bœklin, que lhe traduziu os livros do místico sapateiro de Görlitz e revelou as obras de Klopstock e Gessner, iniciando-o, em suma, na mística e poesia germânicas. A influência dessa revelação foi muito grande no desenvolvimento de seu pensamento. Sem renegar seus antigos amores, o Filósofo Desconhecido passou a considerar "o queridíssimo Boehme" como seu segundo mestre, Charlotte de Bœklin como a mais querida de suas amigas e Estrasburgo como o paraíso terrestre.
Périsse foi o confidente desse entusiasmo em abril de 1790. Mas ele compreendeu apenas o lado exterior dessa amizade com uma mulher "que ele colocava muito alto nas grandes coisas, não como criasiaca, pois ela é uma magnetizadora, ao contrário, mas como muito elevada em doutrina", e não percebeu as mudanças de pensamento e conduta que Saint-Martin meditava. O Filósofo Desconhecido parecia seguir seu caminho habitual, "exceto, notou Périsse, que em Paris e Estrasburgo, ele flerta um pouco com os criasiacos sem, no entanto, se entregar a eles". No entanto, ele não conseguiu esconder que não perdoava a Willermoz pela criação dos Grandes Professos, essa combinação que o lionês havia feito da Maçonaria templária com a doutrina de Martinès de Pasqually.
Sobre o valor das cerimônias, das iniciações, das formalidades; aquela que questionava a utilidade de seus círculos secretos. Por mais que os dois amigos tivessem se esforçado para parecer esquecer seu desacordo, não conseguiram se entender. Momentaneamente submisso, mais do que convencido pelo milagre do Agente Desconhecido, Claude de Saint-Martin, após todas as experiências com o magnetismo, via, cada vez mais, o que há de inferior e insalubre nesse desejo pelo maravilhoso, que às vezes ele confundia com um desejo de conhecimento místico. Ele compreendia os graves perigos a que se expõem aqueles que ouvem os professores de ciências ocultas, evocam os espíritos, esperam manifestações extraordinárias e esquecem Deus por causa dos "homens de segredo". No final de 1789, decidiu abandonar a Maçonaria e enviou a Lyon sua demissão da Ordem Retificada. No entanto, os laços da Iniciação ainda lhe eram queridos, tão difícil é para cada um de nós matar o homem velho; ele gostaria de poder conhecer, ocasionalmente, as instruções do Agente Desconhecido sem precisar fazer parte da Beneficência. Willermoz não respondeu a essa solicitação.
Em julho de 1790, escrevendo a Antoine Willermoz para resolver alguns assuntos, Saint-Martin aproveitou a ocasião para lembrar, "ao querido irmão mais velho", que sua demissão era irrevogável e que ele queria ser removido das listas maçônicas onde estava inscrito desde 1785. Embora sentisse a inutilidade de repetir explicações que Willermoz nunca compreendeu, ele não pôde evitar reabrir o debate uma última vez. "Não vou cansá-lo com mais detalhes das razões que me determinam. Ele sabe bem que, ao tirar meu nome de seus registros, não fará nenhum mal a si mesmo, pois não sou bom para nada; ele sabe, além disso, que meu espírito nunca esteve inscrito lá, pois não é estar ligado apenas em figura. Espero que sempre estaremos ligados, como Cohens, estaremos mesmo pela Iniciação, se minha demissão não colocar obstáculos. Pois então, farei até mesmo o sacrifício da Iniciação, visto que todo o regime maçônico se torna para mim cada dia mais incompatível com minha maneira de ser e a simplicidade do meu caminho". Ele acrescentou que guardaria até o túmulo a lembrança respeitosa de Jean-Baptiste Willermoz.
Essas garantias soam como uma despedida. Saint-Martin encontrou, na Alsácia, a "terra prometida", ou seja, um lugar de solitude e trabalho, com a ajuda de uma vigilante amizade. Ele deixava alegremente os caminhos complicados que até então havia seguido e não lamentava "nenhum tipo de vertigem", resolvido a buscar apenas Deus. Os eventos da Revolução Francesa não deviam afastá-lo de sua resolução, pelo contrário; eles lhe trouxeram apenas novos motivos de meditação e amplas razões para aprofundar o problema do mal e da expiação, e apegar-se a Jesus Cristo como o único mediador. Ele aceitou a Revolução como um decreto da Providência, mas procurou fazer dela apenas um meio de enriquecimento espiritual e uma razão para entender melhor as Escrituras Sagradas e os caminhos da divina sabedoria. Assim, ele pôde preservar aquela paz de alma, que lhe era tão necessária, em meio às perturbações e desgraças daqueles dias sombrios.
Muito diferente foi o caminho seguido por Jean-Baptiste Willermoz durante o mesmo período. Lyon não era para ele, como Estrasburgo para Saint-Martin, um oásis de felicidade e consolação. A paz não reinava na cidade; ela não reinava na loja da Beneficência, nem mesmo no coração de Jean-Baptiste Willermoz. Pelo contrário, os assuntos maçônicos se tornavam uma fonte constante de preocupações. Os eventos revolucionários eram, entre os Irmãos outrora unidos e disciplinados, apenas um motivo de discórdia. Sem dúvida porque nenhum deles seguia o caminho do Filósofo Desconhecido, que era considerar cada coisa sob a perspectiva da eternidade e evitar se envolver, tanto quanto possível, nas coisas terrenas.
Jean-Baptiste Willermoz havia abraçado as opiniões avançadas daqueles chamados de patriotas, representados na Assembleia por Millanois e Périsse Duluc. Ele foi um desses burgueses liberais que se reuniram para formar comitês patrióticos em Lyon, dos quais surgiu, já em 1789, a Sociedade dos Amigos da Revolução, transformada em Clube dos Amigos da Constituição. A preocupação dessas sociedades em guiar o público, o gosto por moralizar, fazer advertências e dar lições, adequava-se perfeitamente ao caráter do nosso lyonês; ele se sentia à vontade ali, em um ambiente pequeno e seleto, com outros burgueses cheios de boas intenções e do sentimento de sua nova importância como cidadãos.
A Beneficência, ao contrário, contava com muito mais pessoas descontentes com a nova ordem do que fervorosos partidários da Revolução. Os nobres e comerciantes que formavam a maioria de seus membros não podiam suportar, sem uma inquietação irritada, nem a supressão de seus privilégios, nem a incerteza dos tempos, nem a instabilidade do comércio. Viviam-se dias turbulentos em que paixões e interesses entravam em conflito. O sentimento de esperança e boa vontade, que animava a maioria dos franceses, desaparecia; diferenças de opiniões, que pareciam insignificantes no momento das eleições para os Estados Gerais, se tornavam mais acentuadas; o espírito de sacrifício e o entusiasmo se transformavam em desencorajamento e suspeitas irritantes. Os motins nas zonas rurais, complicando a insurreição de julho de 1789, causaram os primeiros pânicos e as primeiras emigrações. O cônego Henry de Cordon deixou Lyon para buscar na Itália um clima mais tranquilo. Entre seus colegas que permaneceram na França, Paganucci, Belz, de Rachais e de Bory escondiam cada vez menos as preocupações causadas pela situação política. Eles não eram os únicos. Périsse Duluc resume assim, em 3 de setembro de 1789, as reflexões que lhe inspirava o descontentamento que sentia crescer entre seus compatriotas: "É o espírito público que mais falta aos nossos concidadãos... nossa cidade contém apenas interesses particulares que desprezam ou desconhecem o bem público." [7].
É fácil escrever à distância uma condenação de princípio. Na verdade, os interesses "particulares" incriminados se mostravam particularmente urgentes em 1789, e em Lyon especialmente; era desculpável pensar neles, em vez de se dedicar a legislar no absoluto. Uma crise severa afetava duramente a indústria da seda. Estima-se que havia 40.000 trabalhadores sem emprego. Por outro lado, a questão do abastecimento era grave; foi necessária toda a energia e medidas habilidosas dos últimos cônsules para evitar uma escassez de trigo.
No início do inverno, já em outubro, uma Sociedade Filantrópica foi formada para combater a miséria, cuja boa organização, propósitos inteligentes e variados, e espírito generoso podem ser louvados. Ela conseguiu reunir, através de subscrições, somas bastante significativas, que permitiram socorrer mais de vinte mil indigentes. Seu papel não se limitava a essa assistência material; seus diretores ambicionavam exercer uma ação moral sobre o povo, desenvolvendo, nas classes populares, a instrução, o gosto pelo trabalho, a religião e os princípios de ordem e justiça. Na prática, abriram oficinas de tecelagem e fiações para trabalhadores sem emprego, cursos de aprendizado e escolas para crianças pobres.
Tudo isso é conhecido. Mas o que é menos conhecido é que a Sociedade Filantrópica de Lyon parece ter sido de inspiração maçônica e se desenvolvido especialmente no círculo dos Maçons da Beneficência. Já em 1786, Willermoz e seus amigos se ocupavam de uma sociedade com o mesmo nome, criada à margem de suas lojas e esforçando-se para ser "puramente civil", mas ainda assim fortemente tingida de maçonaria. A sociedade de 1789 não teria sido o desenvolvimento, sob a pressão das circunstâncias, dessa antiga organização caritativa?
Não se pode responder afirmativamente, por falta de conhecimento da composição de seu conselho diretor e dos nomes de seus primeiros membros. Essa sociedade, bastante eloquente para definir seus projetos e princípios, permanece extremamente discreta em seus prospectos. Os nomes dos dirigentes não são citados nem na deliberação da municipalidade que, em 22 de outubro de 1789, reconheceu sua utilidade, nem no relatório elogioso publicado em 1790 pelo Almanach Astronomique et Historique de la Ville de Lyon. No entanto, em alguns arquivos da época revolucionária, alguns prospectos foram preservados e, o que nos interessa mais, duas listas de membros para 1791 e 1792. Elas nos permitem duvidar de seu caráter. Constatamos que a Sociedade Filantrópica tinha, em 1791, Paganucci como presidente, o abade Rozier como vice-presidente e Braun como tesoureiro. Entre os muitos cotistas, agrupados por comitês de bairro, encontramos também um bom número de Cavaleiros Beneficentes. Antoine Willermoz fazia parte do comitê da rua Buisson, onde tinha sua residência, e podemos identificar nomes familiares como Belz, Guillin, Millanois, Berruyer, Molière, Dumoulin, Maisonneuve, que são provavelmente os Irmãos com os mesmos nomes. No entanto, nem Jean-Baptiste Willermoz, nem seu irmão Pierre, nem Périsse Duluc estavam inscritos nas fileiras dessa sociedade de beneficência cristã, seja porque foram impedidos pelo custo da contribuição, seja porque, naquela data, já discutiam a direção e o espírito da sociedade.
À medida que os eventos revolucionários progrediam, a colaboração entre pessoas com opiniões divergentes se tornava cada vez mais difícil, mesmo quando o objetivo era apenas aliviar a miséria. Os Cavaleiros Beneficentes não eram exceção e, embora tivessem sido treinados durante muitos anos para trabalhar juntos em pé de igualdade fraternal, deixaram-se levar pelas paixões do momento.
A conduta política dos irmãos deputados rapidamente se tornou um escândalo para a maioria dos membros da loja. Em particular, a conduta de Périsse suscitou críticas especialmente duras. Ele foi acusado de ambição desmedida e de fomentar distúrbios em Lyon para alcançar seus objetivos. De 5 a 7 de fevereiro, ocorreu uma revolta na qual os milicianos dos bairros recusaram ceder lugar às tropas de voluntários organizadas pelo último dos échevins, Imbert Colomès. Disse-se que os revoltosos foram pagos pelo impressor Périsse, que teria agido sob a instigação de seu irmão deputado. Quão verdadeiras eram essas alegações? Em todo caso, elas irritavam Périsse Duluc, que sabia que a origem desses rumores vinha principalmente de seu confrade Belz e que as calúnias contra ele tinham origem na loja da Beneficência, onde ele deveria ter apenas amigos. Ele soube que uma denúncia havia manchado sua reputação entre os irmãos de Paris. Pode-se compreender sua amargura e seu desejo de receber desculpas oficiais desses "queridos irmãos acusadores e caluniadores" antes de considerar trabalhar novamente com eles em tarefas maçônicas.
Os partidos se organizaram aproveitando as discórdias. Nossos maçons místicos, em meio a esses eventos, terminaram por se separar e deixaram morrer o pouco que restava de sua fraternidade. Na Assembleia, Jean de Turkheim renunciou com um grupo de deputados aristocratas. O decano Castellas estava entre os "negros", embora evitasse levantar a voz, tanto em particular quanto durante as sessões. A atitude do conde de Virieu era bem diferente; ele se destacava frequentemente por suas intervenções veementes; o caráter impetuoso do daufinês e seu gosto pela contradição tornavam-no difícil de classificar. Uma coisa parece certa: Périsse Duluc não conseguia suportá-lo e o descrevia sem indulgência como um incorrigível turbulento, devorado pelo desejo de obter um papel preponderante na Assembleia. Por outro lado, se as opiniões de Castellas, Virieu e tantos irmãos parisienses e lioneses estavam muito distantes das de Périsse, Millanois estava ainda mais afastado da "Chose".
Assim, as divisões políticas impediam todas as relações entre patriotas e moderados, e as questões de fé dividiam os patriotas. De qualquer ângulo que se olhasse, não havia possibilidade de acordo entre esses homens. O pobre Willermoz se obstinava, em vão, em manter entre os seus uma aparência precária de união.
Em abril de 1790, um novo golpe o atingiu pessoalmente. O Agente Desconhecido informou que uma ordem sobrenatural retirava seu papel de chefe dos Iniciados e o depósito das instruções que havia recebido; Jean Paganucci foi promovido em seu lugar como pastor e depositário. Willermoz sofreu com essa humilhação. Há muito tempo, ele tinha sérias reservas sobre o valor da ação que guiava Mme de Vallières; mas que essa inspiração fosse "aristocrática" era uma constatação amarga para os "patriotas" que acreditaram nela. A política interferia nas questões mais imateriais, corrompendo as almas mais puras.
Lyon estava, naquela época, profundamente dividido. A nova municipalidade e seu prefeito, Palerne de Savy, digno representante das virtudes da alta burguesia, não conseguiam domar as complexas paixões de uma cidade abalada por uma grave crise industrial e pelas incertezas políticas. A proximidade da Sabóia e da Lombardia, onde muitos emigrados haviam se refugiado, também era uma fonte de medo e agitação; notícias tendenciosas circulavam; em todos os meios, reinava a inquietação. Enquanto os antirrevolucionários denunciavam Périsse Duluc como um fomentador de distúrbios particularmente resoluto, Périsse temia a fraqueza do poder real e acreditava que os distúrbios e revoltas eram fomentados pelos aristocratas para impedir o estabelecimento da constituição e o triunfo da liberdade. Cada homem, tornado um partidário, suspeitava dos piores desígnios daqueles que não pensavam como ele.
Jean-Baptiste Willermoz não escapou a essa loucura de suspeitas e denúncias, um capítulo muito triste da história da Revolução Francesa. Ele estava convencido de que os "Príncipes", os condes de Artois e de Provence, irmãos do rei, contavam com Lyon para se rebelar contra a Assembleia Constituinte e empreender a restauração dos privilégios hereditários. Em março de 1790, ele enviou a Paris um certo "boletim de Turim" que continha, sem dúvida, alguma revelação sobre os projetos dos emigrados.
Em agosto, uma carta foi apreendida e publicada que parecia autorizar todos os medos. Ela foi escrita justamente por um ex-irmão da Beneficência, o cônego Henry de Cordon, que acreditou ser necessário avisar uma certa Mme de Persau que ela deveria se proteger de uma "mina pronta para explodir". Willermoz acreditou estar justificado em lutar, na medida de seus meios, contra uma "conspiração tão atroz"; no entanto, os meios que ele empregou não honram nem sua coragem, nem sua franqueza. Na verdade, ele se limitou a transmitir a Paris as denúncias que recebia. Assim, em novembro e dezembro de 1790, ele atuou como intermediário entre Périsse Duluc e o ajudante-mor Frachon, membro dos Amigos da Constituição, que recebia, na época, todos os tipos de revelações de um estalajadeiro Clerc, de um trabalhador Monnier e de um certo Privat, capitão do Gourguillon, sobre uma espécie de complô reacionário do qual Guillin de Pougelon, ex-échevin, era o chefe. Frachon e Willermoz, convencidos da importância desses boatos, não queriam denunciá-los eles mesmos. Périsse, que considerava os fatos mal fundamentados, queria ainda menos comprometer sua dignidade de deputado. As cartas dos lioneses foram, portanto, transmitidas, sob a forma de extratos anônimos, ao Comitê de Investigações. Na verdade, o deputado de Lyon, talvez porque sabia por experiência pessoal o pouco fundamento que têm certos rumores, achava as preocupações de seu velho amigo um tanto exageradas e não acreditava muito que "Altezas" e "Majestades" estivessem prontas para inaugurar em Lyon a era da reação. Ele sabia, além disso, que a agência de espionagem interna que era o Comitê de Investigações tinha correspondentes habituais em Lyon. Ora, ele desconfiava muito desse tipo de pessoas, que têm todo o interesse em construir intrigas fictícias e espalhar boatos alarmantes, a fim de fazer com que suas denúncias sejam corroboradas por cidadãos dignos de fé [8].
A questão, no entanto, teve um desdobramento, já que em dezembro levou à prisão de Guillin e alguns cúmplices. Vale ressaltar que os acusados, posteriormente, invocaram os mesmos argumentos que Périsse Duluc usava para acalmar e tranquilizar Willermoz; alegaram ter sido vítimas de provocadores e denunciadores pagos.
Jean-Baptiste Willermoz contava, em 1789 e 1790, entre os "patriotes". O panfleto reacionário intitulado "Avis d'un vrai patriote" listava os "pretendus amis de la Constitution, soi-disant amis du peuple et qui ne servent qu'à l'exciter au trouble" e incluía o nome de Willermoz ao lado de Frossard, Frachon, Laussel, Roland de La Platière, Chalier, etc. O "démagogue en tout point" mencionado, do bairro de Grand'Côte, provavelmente referia-se ao Dr. Pierre Willermoz. Mas os dois irmãos concordavam plenamente em política, como mostram as cartas trocadas durante uma estadia de Jean-Baptiste em Paris. Ambos eram amigos e apoiadores do novo prefeito, Dr. Vitet, e muito interessados em retirar de Lyon as tropas e oficiais aristocráticos dos regimentos de M. de La Chapelle.
Essa atividade pela coisa pública não era totalmente desinteressada. Durante uma viagem a Paris, no início de 1791, Jean-Baptiste envolveu-se em projetos como a loteria tontine Lafarge, que tentavam fazer ser apoiada pela Assembleia. Ele também esperava conseguir uma posição nos hotéis das moedas, que estavam sendo regulamentados, com a ajuda conjunta de seus discípulos de várias opiniões, como Virieu e Périsse Duluc. Mas o projeto não teve continuidade, seja porque Virieu tinha menos influência do que pensava, seja porque o próprio interessado mudou de ideia no intervalo.
A implementação da Constituição Civil do Clero também foi, para Willermoz, uma ocasião de intensa atividade de conselhos, recomendações e denúncias, das quais encontramos numerosos ecos. Graças a ele, o abade Renaud, pároco de Sancey e membro da Bienfaisance, foi calorosamente recomendado ao bispo Lamourette. Evitaremos julgar essas ações, pois partiam de um verdadeiro desejo de servir à religião. Não é uma observação nova notar que Willermoz a confundia inocentemente com suas convicções particulares. A reforma religiosa que estava se preparando parecia-lhe capaz de aproximar o catolicismo das formas do verdadeiro culto primitivo que ele acreditava conhecer; todos os Coens convictos partilhavam dessa convicção. Claude de Saint-Martin, o primeiro de todos, era um fervoroso partidário da Constituição Civil. Esses sonhadores esperavam que uma renovação do clero provocasse um rejuvenescimento do cristianismo, um despertar da fé. "Os cristãos estavam em um sono letárgico, eles se despertam ao se dividir," escreveu Périsse Duluc. "O espírito de dominação, o vil interesse seduziram a piedade. É preciso iluminar, edificar, reunir, vigiar, é a hora do dia em que as sentinelas devem desvendar o inimigo. É a hora do trabalho." [9].
Uma tarefa muito decepcionante esperava aqueles que pretendiam apoiar o clero constitucional e esperavam contribuir para o desenvolvimento do cristianismo. Willermoz não se desencorajou, fortalecido pelo desprezo que Pasqually lhe havia ensinado por todas as Igrejas constituídas e por todos os padres. Aos seus olhos, aqueles que comprometiam a religião eram os eclesiásticos que se recusavam a se submeter às leis do Estado e contra eles, ele esperava mobilizar todas as boas vontades, todos os verdadeiros fiéis. Foi seguramente para cumprir um dever semelhante que o abade Rozier prestou juramento e abandonou suas estufas e viveiros para ocupar a paróquia de Saint-Polycarpe, embora ao longo de sua vida ele tenha demonstrado pouco gosto pelo pastoreio. Jean-Baptiste Willermoz, por sua vez, tinha o hábito de desempenhar, em seu pequeno círculo, o papel de líder religioso para não se envolver apaixonadamente nessas questões que lhe eram tão caras. Não lhe bastava ensinar a boa doutrina àqueles de seus discípulos que vinham lhe pedir conselho, em suas incertezas, como seu guia espiritual; ele acreditava ser seu dever pedir uma audiência secreta ao bispo Lamourette, sobre a qual não sabemos se este último teve motivos para se alegrar.
A melhor desculpa para essa atividade é que ele foi chamado a resolver questões delicadas, para proteger tanto o exercício do culto legal quanto a liberdade de consciência dos indivíduos, devido às suas funções no Hôtel-Dieu. Após a grave crise financeira, que arruinou os hospitais da cidade e provocou a renúncia dos antigos reitores, Willermoz foi designado pelo corpo municipal como um dos oito administradores encarregados de assegurar o bom funcionamento dos serviços hospitalares. Sua nomeação foi ratificada em 19 de maio de 1791. Não era uma sinecura, nem do ponto de vista financeiro, dada a desaparição das receitas e dos privilégios que até então sustentavam a antiga instituição, nem do ponto de vista moral, pois todos os capelães do hospital haviam recusado o juramento exigido de todos os eclesiásticos que exerciam funções públicas. Willermoz, especialmente encarregado da administração interna, estava em contato diário com as religiosas hospitalares. Ora, parece que as freiras dos hospitais eram muito hostis aos padres constitucionais e que eram moças que "não gostavam muito de obedecer"; parece também que Willermoz talvez não estivesse empregando com elas toda a prudência necessária. Ele sempre fora muito obstinado e, quando se tratava de suas convicções pessoais, não se mostrava nem paciente nem tolerante. Sabemos que ele gostaria de fazer condenar as religiosas com sanções administrativas, e que Périsse Duluc, mais sábio, o lembrou da prudência e da moderação.
As discórdias nascidas da Constituição Civil do Clero terminaram de dividir entre si os Maçons da Beneficência; sobre esse ponto também não chegaram a um acordo. Por outro lado, a fuga do rei e os projetos de regime republicano, que agitaram tão profundamente a opinião, não acentuaram entre eles as divisões já existentes. Os Cavaleiros Benfeitores permaneceram todos apegados ao princípio monárquico. Périsse expressa em suas cartas as razões, mais refletidas do que sentimentais, que o ligam ao governo real. Essa sabedoria, feita do medo de provocar perturbações mais profundas e da recusa de se engajar mais profundamente em experiências aventureiras, era a da maioria. O deputado de Lyon, que representa bastante bem a opinião liberal dos Constituintes, mostra apenas horror pela proclamação do Campo de Marte de julho de 1791. Ele reprova abertamente as insolências dos oradores do Clube dos Jacobinos e condena a exaltação culpável de alguns deputados "jesuítas da Constituição" que, "sob as aparências de defensores da liberdade", procuram apenas provocar distúrbios. Foi a época em que muitos decidiram deixar o Clube para encontrar em outro lugar um local de reunião onde reinasse uma atmosfera mais serena. Périsse foi um dos membros do Clube dos Feuillants. Apesar de seu pessimismo habitual, o desprezo que nutria pelos demagogos o levava a subestimar o poder de seus adversários. "Eles não têm seis partidários na Assembleia e ainda assim não ousam se mostrar", escrevia ele em 17 de julho, "e Robespierre, o atrabiliário, e o difuso Pétion excetuados, os outros são imbecis ou tolos" [10].
As revoluções nunca precisaram muito de inteligências e talentos, porque a popularidade conquistada pela violência e pela demagogia exagerada facilmente supera o valor e os serviços prestados. Périsse, mesmo sendo um dos redatores da Constituição, esperava que ela fosse suficiente para restaurar a ordem e a prosperidade, mas ele observava com angústia o crescimento das paixões. A ação ilegal dos clubes parecia-lhe o pior perigo. Tanto em suas comunicações oficiais quanto em suas cartas privadas com colegas de Lyon, ele advogava pela moderação sensata, o repúdio aos agitadores e o respeito absoluto à lei.
Já era tarde demais. Em Lyon, a Sociedade Popular dos Amigos da Constituição, com seções em cada bairro, havia eclipsado facilmente o outro clube mais antigo, mais elitista e, por assim dizer, mais tedioso. Ela apoiava democratas que se reuniam em torno de Roland de La Platière, ou exaltados como Chalier. Teoricamente, os dois clubes estavam unidos, mas os patriotas respeitáveis que frequentavam o clube mais antigo não apreciavam o ambiente misto da Sociedade Popular, nem o pathos brutal, nem as reivindicações excessivas de seus oradores favoritos. Naturalmente, eles se inclinavam a se alinhar com os princípios professados pelo Clube dos Feuillants de Paris.
A situação se tornava cada vez mais desanimadora para aqueles que, trabalhando para dotar a França de uma constituição justa e generosa, haviam acreditado estar trabalhando para o bem-estar e o progresso geral. Périsse Duluc sentia amargura ao concluir sua missão, ao término da legislatura, pensando em retornar à sua cidade natal. Ele percebia que seus esforços haviam sido em vão e que seu zelo pela justiça só lhe trouxera inimigos em todos os partidos. Sua imaginação aumentava seu pessimismo desencorajado, vendo-se como "um desses homens proscritos cuja proximidade é perigosa e que comprometem tudo ao seu redor".
Essa visão, já romântica, de seu papel político não tinha mais lugar. Os tempos de revolução são rápidos para levar os mortos e os ausentes não valem mais do que os mortos. A preocupação com a legalidade há muito tempo era uma visão ultrapassada. A pessoa e as ideias de Périsse não conseguiam mais despertar o interesse de seus compatriotas. Na província, assim como na capital, as dissensões políticas se misturavam à angústia da guerra e da invasão, e as rivalidades entre os homens no poder completavam a confusão da opinião pública.
A situação em Lyon permanecia turbulenta. O prefeito Vitet, cansado de suas funções, renunciou em novembro de 1791 e partiu apressadamente para uma viagem à Provença, sem esperar a nomeação de seu sucessor. Ele deixava temporariamente uma cidade onde os republicanos, aliados de Roland, agora pareciam moderados e tinham muito a fazer, apesar do apoio da maioria dos eleitores, para resistir aos ataques dos radicais, liderados pelo municipal Chalier. Meses de tumultos, proclamações e eleições incertas culminaram nas crises municipais de fevereiro e março de 1793, que viram o triunfo dos clubistas, e depois no dia revolucionário de 29 de maio, quando as Seções de Lyon, revoltadas contra a ameaça da tirania extremista, expulsaram o prefeito Bertrand e prenderam Chalier.
A cidade tomava partido de maneira abrupta na disputa mortal que dividia os Convencionais em Girondinos e Montanheses em Paris. O Comitê Insurrecional de Lyon, logo transformado em Comissão Popular de Salvação Pública, não hesitou em romper com a Convenção assim que soube dos eventos de 31 de maio e 2 de junho e da proscrição dos Girondinos. Foi essa Comissão que acusou Joseph Chalier e o condenou à morte. No entanto, a rebelião não se tornou irreversível imediatamente. Houve vários meses de negociações e esperanças entre Paris e Lyon. A reconciliação parecia muitas vezes iminente, pois os lioneses não queriam se aliar aos realistas do Oeste e do Sul, e sempre faziam questão de afirmar seus sentimentos republicanos. Mas a intransigência de Robespierre e seus seguidores, junto com a queda de Danton, desencadeou a verdadeira guerra civil: o cerco de Lyon, que durou de 8 de agosto a 9 de outubro de 1793.
Não sabemos por quanto tempo a Beneficência resistiu a esses tumultos. Willermoz escreveu que, pela firmeza de seus princípios, os Irmãos Grandes Professos conseguiram resistir melhor do que outros maçons antes de serem "arrastados pelo torrente". Esperamos que sim. O declínio da Maçonaria foi um fenômeno generalizado nos primeiros anos da Revolução. As lojas fechavam uma após a outra. Em todos os lugares, os maçons abandonavam suas sociedades, como se abandonam hábitos obsoletos em novas circunstâncias.
Philippe-Égalité apenas constatou isso ao anunciar, em 5 de janeiro de 1793, que renunciava a todas as suas dignidades e funções de Grão-Mestre do Grande Oriente, preferindo a realidade às ilusões vãs. Naquela época, os maçons, burgueses e aristocratas, enchiam as prisões ou partiam para o exílio. O Terror os dispersou completamente, e a guilhotina reduziu suas fileiras. Apenas alguns pequenos círculos esporádicos, com atividades limitadas, conseguiram sobreviver por mais tempo, tentando passar despercebidos. Os sans-culottes consideravam a Maçonaria como um símbolo do fanatismo e um refúgio da aristocracia.
Em 1793, o hotel da Beneficência, nos Brotteaux, já estava fechado. O que restava de mais real eram seus arquivos, que Willermoz embalava da melhor forma possível para mudá-los daquele bairro excêntrico que as tropas iriam ocupar.
Não se sabe se o Agente Desconhecido descrevia esses tumultos como a realização das sinistras previsões que ele havia feito aos que não ouviam sua mensagem. Na verdade, os Iniciados de Lyon estavam então muito envolvidos na tempestade para poderem se deter muito nas profecias de sua visionária. Jacques Millanois era um desses republicanos que defendiam a revolta contra a Convenção; o conde de Virieu havia chegado para ajudar aqueles que organizavam a defesa da cidade; enquanto o velho Paganucci usava seus talentos de contador para organizar os recursos do general Précy, chefe militar dos rebeldes.
Os Willermoz e Périsse Duluc, nessas circunstâncias difíceis, seguiram um caminho pouco definido. Suas opiniões os colocavam mais no campo jacobino, enquanto seus gostos e relações os alinhavam com os moderados. Eram boas razões para tentar manter-se à parte. Tudo o que se sabe sobre a conduta de Jean-Baptiste Willermoz permanece pouco claro. Ele afirma ter assinado a petição revolucionária de 14 de maio de 1793, ter sido procurado como suspeito após 29 de maio e removido da assembleia do departamento, da qual era membro, como partidário de Chalier; por outro lado, o vemos, em 8 de agosto, deixar sua casa nos Brotteaux para se trancar na cidade, como se pactuasse com os rebeldes. Sua adesão aparente não excluía a prudência. Ele afirmará nunca ter contribuído em nada, nem por ação nem por dinheiro, para o cerco da cidade e ter limitado seu papel a cumprir, da melhor forma possível, suas funções de administrador dos hospitais.
Assim que o cerco de Lyon lhe pareceu iminente, seu primeiro cuidado foi deixar a casa Bertrand nos Brotteaux, onde vivia há dezoito anos. Foi em 6 ou 7 de agosto, véspera do dia em que foi disparado o primeiro tiro de canhão. Willermoz, avisado das ameaças que pesavam sobre a cidade, apressou-se a mudar seus móveis e os de sua irmã, sem esquecer os preciosos documentos maçônicos que havia embalado em várias malas. O transporte foi realizado com a ajuda de um dos serventes da loja, enquanto caíam os primeiros projéteis que, durante o cerco, destruiriam o hotel da Beneficência.
Desde 25 de setembro, um apartamento de quatro cômodos no segundo andar de uma casa na rua Clermont, esquina com a rua Lafond, já havia sido alugado. O contrato foi feito em nome de Madame Provensal; estava especificado que seu irmão Jean-Baptiste lhe sublocaria um quarto do apartamento. A casa era bastante restrita. Poucos meses antes, Madame Provensal havia perdido seu filho Jean; restava com ela apenas uma jovem órfã, sobrinha-neta de um velho amigo, que ela criava desde os três anos e considerava como filha. Jeannette Pascal servia de dama de companhia para sua velha amiga e de secretária para Jean-Baptiste Willermoz, que precisava de seus jovens olhos para ajudar os seus, cansados pelos longos trabalhos de escrita e cópia. Foi neste modesto lar, no coração da cidade, que passaram o período opressivo do cerco. Willermoz contou, em 1810, que nos primeiros dias de sua instalação, uma bomba caiu em seu quarto e destruiu uma das malas que continham os preciosos arquivos maçônicos.
Seu papel de administrador do Hôtel-Dieu permitia a Jean-Baptiste Willermoz ser útil sem se comprometer. Ele se orgulhava de ter dedicado todo o seu tempo e coragem a essa tarefa durante esse período dramático. Se acreditarmos nele, foi, em parte, graças a ele que conseguiram assegurar o abastecimento do hospital e proteger o dinheiro e as provisões das requisições dos defensores da cidade. Durante as terríveis noites de 22 a 25 de agosto, quando Lyon ardia sob os tiros inimigos, Willermoz trabalhou com os serventes e as enfermeiras para transportar os doentes e protegê-los do fogo. Foi ele quem teve a ideia, em 24 de agosto, de hastear no grande domo a bandeira negra da miséria, implorando a piedade dos atacantes. Mas o sombrio estandarte foi interpretado como um sinal de resistência desesperada, e o hospital continuou a ser alvo dos adversários de Lyon. Com todos os que se esforçavam para apagar os inúmeros focos de incêndio que ameaçavam o enorme edifício, Willermoz se multiplicou durante três dias e três noites. Passada a emergência, ele se ocupou da mudança dos doentes, que foram instalados provisoriamente em locais menos expostos; os conventos dos Cordeliers de l'Observance e dos Deux-Amants, no subúrbio de Vaise, foram escolhidos. Podemos imaginar o que foi a mudança de centenas de doentes e freiras que ocupavam os edifícios do Hôtel-Dieu. A transferência foi concluída em 2 de setembro.
Entre a população cercada pelo bloqueio, muitos suportavam sem esperança as durezas do cerco, muitos não confiavam no sucesso e temiam que seus compatriotas agravassem sua situação com sua obstinação. O abade Rozier era um desses pessimistas, alguns diriam derrotistas; o que não o impedia de se prodigar para ajudar os desgraçados de sua paróquia, em meio às ruínas causadas pelos canhões dos atacantes. Ele foi o instigador de reuniões de "anciãos" que compartilhavam seus receios. Podemos supor que entre esses respeitáveis personagens estava talvez Jean-Baptiste Willermoz. Algumas reuniões ocorreram na grande sala do edifício onde os comerciantes faziam suas transações e que era chamada de Loge du Change. Discutiu-se se era possível negociar a submissão da cidade, mas o projeto não teve seguimento, pois o general Précy dispersou os "clubistas". Pouco depois, durante a noite de 29 de setembro, um projétil destruiu a casa do abade Rozier na rua Vieille-Monnaie, matando-o enquanto dormia. No mesmo dia, o bispo Lamourette foi feito prisioneiro pelos Convencionais.
O projeto de negociação foi retomado algumas semanas depois, quando ficou evidente para todos que a situação estava perdida e o desânimo era geral. Aqueles que menos tinham se aliado à rebelião colaboraram com os membros das Seções para tentar evitar o desastre iminente. Précy, desta vez, não conseguiu impedir a reunião daqueles que queriam "avaliar os meios de salvação" da cidade. Périsse Duluc presidiu, em 8 de outubro, uma reunião dos comissários das Seções da cidade que ocorreu em Saint-Nizier, desde a manhã até a noite. Entre os membros dessa reunião desesperada, encontramos alguns nomes familiares, como o de Maisonneuve, vice-presidente dos debates, e o de Willermoz. No entanto, provavelmente se tratava de Antoine, que, na seção da rue Buisson, estava envolvido na administração da cidade. Apesar da oposição de Précy, que, embora decidido a se retirar, queria preconizar uma resistência desesperada aos que ele estava prestes a abandonar, foi decidido que uma delegação iria imediatamente negociar a capitulação. Trinta e dois deputados foram escolhidos e conduzidos por Périsse a Sainte-Foy, precedidos por um trompete. Após seis horas de marcha, chegaram aos representantes da Convenção. Um dos sitiantes, o general Doppet, declarou em suas memórias que os burgueses de Lyon ofereceram apenas "meios insignificantes de acomodamento". Périsse deixou o testemunho de que obtiveram, de qualquer forma, algumas promessas de clemência. Poderiam eles fazer melhor e negociar melhor? Não estavam completamente à mercê do vencedor? Nesse mesmo momento, Précy tentava romper o bloqueio e realizar uma retirada para salvar os elementos mais comprometidos de seu exército e para salvar a si mesmo. Nesse último ponto, ele conseguiu perfeitamente. Na noite de 8 para 9 de outubro, os exércitos da Convenção ocuparam a cidade.
Quaisquer que fossem as promessas feitas aos vencidos, seu efeito foi curto. No entanto, foi notado que os primeiros representantes da Convenção, Maignet, Laporte, Couthon, Chateauneuf-Randon, não se mostraram totalmente impiedosos, apesar do terrível decreto de 12 de outubro de 1793 que decidia apagar Lyon do "quadro das cidades da República". Aqueles que vieram depois, Fouché e Collot d'Herbois, tinham o desejo de se mostrar ferozes e de levar a sério a ordem dada. Com eles, as demolições do rico bairro de Bellecour foram ativamente impulsionadas. Prisões, condenações, julgamentos sumários, seguiram um ritmo acelerado durante os cinco meses do Terror lyonês, de novembro de 1793 a abril de 1794.
Encontramos Jean-Baptiste Willermoz fugitivo e perseguido em dezembro de 1793. No entanto, ele dificilmente poderia ser contado entre os apoiadores da aristocracia, nem mesmo entre os partidários da rebelião. Na entrada dos vencedores, ele havia obtido do prefeito Bertrand e das autoridades militares as medidas indispensáveis para salvar o Hôtel-Dieu da destruição; junto com os outros administradores, ele tinha um salvo-conduto para cuidar das compras de grãos necessários ao abastecimento do hospital. Dois mandados de prisão, o primeiro emitido em 9 de outubro, haviam sido facilmente cancelados em consideração aos serviços prestados em seu papel de administrador. O que poderia ter acontecido para que, em tão poucas semanas, ele se visse obrigado a deixar precipitadamente seu domicílio e suas funções e buscar a salvação na fuga? O fato é que nada de realmente novo havia ocorrido; exceto que uma nova denúncia o fez temer ser preso uma terceira vez. Ele aparentemente deveu sua salvação à piedade de um dragão que o deixou fugir dizendo: "Cidadão, você me parece um homem bom, fuja". Ele fugiu sem ter tempo de se informar sobre o que havia de novo contra ele. Isso explica a incerteza em que ele se encontrava nos últimos dias de nivôse, no fundo do refúgio onde havia encontrado um abrigo seguro.
Willermoz havia sido denunciado por seu vizinho dos Brotteaux, um cabeleireiro chamado Carra, que havia observado a mudança das caixas de documentos maçônicos, suspeitando do cuidado e das precauções tomadas. A pouca consistência dessa acusação não era nada reconfortante. Por mais insignificante que pareça, o caso era grave porque ocorria em um momento em que a repressão havia atingido o auge de sua loucura assassina. O bairro dos Brotteaux era o local das execuções; trincheiras cheias de cadáveres iam da casa Bertrand até o Ródano; os lugares onde ele havia vivido por tanto tempo não eram mais do que um ossuário. Em 28 de novembro, seu irmão Antoine havia sido executado, pagando com sua vida algumas assinaturas dadas como vice-presidente de sua Seção. Millanois, que havia contribuído para a administração da cidade durante o cerco, sofreu o mesmo destino em 5 de dezembro. Bruvzet só foi salvo pelo devotamento de seu irmão Pierre, que se fez condenar em seu lugar. O ex-diretor da Concorde, o Dr. Dutrech, estava preso e ameaçado de morte por ter prestado cuidados indistintamente aos feridos de ambos os lados. Périsse Duluc, apesar de sua reputação de civismo, viu seus bens serem sequestrados. Sem mencionar o conde de Virieu, desaparecido durante a retirada de Précy, de Paganucci e de todos os outros, que só conseguiram se salvar exilando-se.
Jean-Baptiste Willermoz, no momento mais dramático de sua vida, contou com a ajuda vigilante de duas mulheres solidárias, Jeannette Pascal e Madame Provensal. Elas se esforçaram para apoiá-lo durante essa difícil provação, conseguindo confortá-lo e aconselhá-lo de forma útil. Seu irmão, o doutor, popular entre os sans-culottes, fez o possível para usar sua influência com os poderosos da época. Avisos e notícias chegavam ao fugitivo através de frequentes bilhetes. Como ele não podia conservar as cartas originais que recebia, com medo de comprometer aqueles que se esforçavam para salvá-lo em caso de desgraça, Willermoz manteve uma espécie de diário resumido dessa correspondência, que ainda possuímos. Este pequeno caderno evoca os encontros clandestinos à noite, através dos becos que atravessam os antigos bairros de Lyon e formam uma rede discreta conhecida apenas pelos iniciados, paralela às ruas habituais. Ele revive todas as incertezas, pedidos decepcionantes, compromissos, esperanças e medos pânicos daqueles que viveram sob tal ameaça.
Os irmãos Willermoz hesitavam ansiosamente entre o desejo de saber exatamente do que Jean-Baptiste era acusado, a fim de apresentar uma justificativa clara à polícia municipal, e o medo de atrair muita atenção das autoridades públicas com suas ações. Esquecer era mais fácil do que justificar. Isso se tornou certo para o Dr. Willermoz quando ele avaliou as principais queixas que os amigos de Chalier poderiam ter contra seu irmão. A denúncia de Carra era oficial, mas poderia-se tentar obter uma retratação mediante pagamento; poderia-se até mesmo tentar destruir o mandado de prisão por uma quantia elevada. Certamente, as notáveis conexões de Willermoz com Millanois e outros aristocratas eram lembradas, e a mudança suspeita de baús de papéis misteriosos era incriminada, mas o principal perigo não residia nessas acusações. O pior e mais irremediável era que Jean-Baptiste Willermoz não era simpático. O doutor resumiu assim as objeções daqueles a quem ele queria recomendar o caso de seu irmão: “você é um moderado, um Feuillant, sempre se mostrou assim. Eles acreditam que você é um homem honesto, mas apenas fala com eles em assembleias, não aperta as mãos deles nas ruas, mantém um perfil discreto e está ligado aos realistas.”
O retrato de Jean-Baptiste Willermoz, um jacobino desdenhoso e reservado, é divertido. Evoca a figura de um “Calixte” revolucionário, cuidadoso para não misturar relações, que teria sido engraçada se não tivesse sido traçada em circunstâncias tão graves. Willermoz arriscou sua vida por seguir a tendência bem lionense de economizar nos cumprimentos e apertos de mãos. Selos foram colocados no quarto que ele ocupava na Rue Clermont em 23 de Pluviôse. Ele teve que deixar a cidade sem mais demora.
Apesar do perigo, Jean-Baptiste Willermoz não conseguia se decidir a partir porque não tinha garantido a segurança de seus arquivos maçônicos. Sua determinação em preservá-los em tais circunstâncias perigosas beirava o heroísmo. O doutor o instava a “ensacar” os papéis, provavelmente escondidos em Valse; ele oferecia seus sótãos como refúgio e, talvez para isentar sua responsabilidade em caso de busca, redigiu um contrato de aluguel para um quarto em sua casa na Rue des Forces em 24 de Pluviôse. Ainda melhor, ele sugeriu um assistente discreto para a embalagem, um certo Laurent que não sabia ler.
Provavelmente foi no 5 de Ventôse, ou seja, na noite de 1º de fevereiro de 1794, que Willermoz deixou seu esconderijo. Na manhã do dia 6, ele saiu da cidade. Era hora, pois naquele mesmo dia houve uma busca na casa de sua irmã. Não sabemos onde ele encontrou refúgio inicialmente, nem onde se escondeu em Lyon para evitar a perseguição. No entanto, presume-se que ele encontrou esconderijos e cumplicidade no Hôtel-Dieu ou na casa dos Dois-Amantes que, sem dúvida, salvaram sua vida.
Em 6 de junho, ele estava instalado em Sermenas, perto de Néron, no Ain, a duas léguas de Lyon, com seu irmão. O doutor morava no campo devido à sua saúde precária, e Jean-Baptiste por causa de seu status de suspeito. Este último não podia arriscar-se a ir à cidade sem um certificado de civismo e de não rebelião, o que era difícil de obter. No entanto, o grande perigo havia passado, e a vida em Lyon estava se tornando quase suportável, apesar das buscas e prisões. Madame Provensal e Jeannette Pascal enviavam fielmente notícias reconfortantes aos exilados: “Aqui está a gazeta, estamos todos bem, nada de novo a relatar exceto muitas prisões, dizem, mas muitos estão sendo liberados... O pão está facilmente disponível, a carne está no preço máximo, mas não se consegue tudo o que se quer, adeus... As coisas estão bastante calmas, exceto pelas prisões diárias. Périsse insiste que você não venha à cidade nem de dia nem de noite até que as coisas estejam muito mais calmas, porque ele diz que as pessoas são esquecidas quando não são vistas.”
As corajosas mulheres permaneceram em Lyon para monitorar os sequestradores e garantir a segurança daquele que lhes era querido. Elas enviavam, junto com jornais, todos os tipos de objetos úteis para que ele pudesse se instalar confortavelmente. Às vezes, arriscavam uma visita montadas em burros, encurtando o tempo da separação, trazendo da campanha provisões de ovos, manteiga e farinha, que constituíam uma verdadeira riqueza em tempos de abastecimento incerto. Suas cartas, quase diárias de junho a outubro de 1794, são escritas em pequenos pedaços de papel grosso, muitas vezes numerados, que certamente não são folhas de papel de carta. Em alguns, pode-se ler, escritos com uma bela caligrafia, as palavras estranhas soos, ivos, isuspos, que não deixam dúvidas sobre sua origem. A desgraça da época havia posto fim aos trabalhos de linguística mística, e era o esboço de um repertório da "língua primitiva" usada pelo Agente Desconhecido, que havia sido sacrificado para a correspondência.
Thermidor veio para acabar com essa torpor angustiante, essa triste adaptação à desgraça que pesava sobre Lyon. Em 11 de Thermidor, Jeannette Pascal ainda enviava más notícias sobre a acusação de fanatismo que ameaçava Jean-Baptiste Willermoz. Mas nos dias 19 e 20, sua alegria explode francamente por causa das proclamações de três Representantes, incriminando as tramas do traidor Robespierre e prometendo aos lioneses o fim de seus males. Alegria ainda temerosa, como costuma ocorrer com aqueles que sofreram por tanto tempo que não ousam acreditar na felicidade. "Se você ver as diferentes expressões faciais aqui, é bastante singular pelo contraste. Há muitas pessoas que não víamos há muito tempo. — No entanto, não cometa imprudências, pois quem sabe sobre as reviravoltas das situações. — Esta manhã do dia 20: a cidade está tranquila... os tiros de canhão são apenas exercícios, assim como os tambores, envie-me um burro e eu vou partir. Quanto ao certificado, parece que você não precisa dele, esse partido está se tornando muito fraco. Ainda não se fala nada sobre o prefeito, exceto que ele é um tolo."
Eu evitaria enfraquecer, com comentários, a expressão desajeitada desse alívio, nem esse julgamento alegre sobre Bertrand. No entanto, não posso deixar de destacar o quão comovente é a surpresa de uma lionesa daquela época, admirada por poder ouvir o som do canhão e dos tambores sem estremecer.
A situação se reverteu em poucos dias. Os membros da administração que haviam presidido à vingança rapidamente se tornaram acusados e, apesar das previsões dos extremistas, que se gabavam de se vingar um dia de tudo o que haviam sofrido, ameaçando "que se veria um grande espetáculo no retorno dos patriotas", o tempo do terror estava para sempre acabado.
Os selos colocados no quarto de Jean-Baptiste Willermoz foram removidos em 4 de setembro. Em 10 de outubro, por volta das oito ou nove horas da noite, espalhou-se pela cidade o rumor de que os representantes do povo haviam anunciado, durante o espetáculo nos Celestins, "a feliz notícia da regeneração de Lyon, assim como a revogação de todo decreto relativo à rebelião". No dia seguinte, Antoine Pont, jovem amigo de Madame Provensal, enviou a Jean-Baptiste Willermoz o relato desse "interessante espetáculo", que ele soubera da boca de um assistente, mencionando as "coroas cívicas" e os versos de circunstância que os cidadãos alegres ofereceram aos "pais do povo". Jeannette Pascal simplesmente acrescentou ao seu relato: "colocaram uma bandeira nova e bonita na varanda da Prefeitura e todos os cidadãos festejaram". Nada mais podia impedir o retorno de Jean-Baptiste Willermoz ao lar de sua irmã.
NOTAS:
1 - E. DERMENGHEN. Joseph de Maistre. La Franc-Maçonnerie, 1925, p. 24-33.
2 - Independentemente dos estudos gerais, alguns bons estudos detalhados sobre a vida e o desenvolvimento da Maçonaria nas províncias serão de grande ajuda para quem quiser abordar, com total objetividade, esse assunto complexo.
3 - Bernard FAŸ, La Franc-Maçonnerie et la révolution intellectuelle du XVIIIe siècle, p. 257.
4 - Lyon, ms. 5430, n° 2. Périsse a Willermoz, 27 de abril de 1789. "É fácil ver aqui que, em vez de Couderc e eu, a aliança estava feita e eles queriam como co-deputados o procurador Boscary e Barroud... O lamentável é que os cidadãos eleitores não se tenham prestado aos seus arranjos."
5 - Ms. 5430, n° 21. Périsse a Willermoz, 12 março 1790.
6 - Lyon, m.s. 5430, n° 47. Périsse a Willermoz, 3 de dezembro de 1791. Sabe-se que Suzette Labrousse, incentivada pelo ambicioso Pontard, um eclesiástico sem escrúpulos que explorava suas predições em seu Jornal Profético, partiu para Roma em 1792, com o objetivo de converter o Papa. Internada como louca no Castelo de Santo Ângelo, ela foi libertada pelos franceses em 1800 e morreu obscuramente em Paris em 1821.
7 - . Lyon, ms. 5430, n° 14.
8 - A carta do cônego Henry de Cordon teve a honra de ser lida na sessão de 9 de setembro de 1790 da Assembleia. Dizia-se que ela havia sido transmitida ao Comitê de Investigações por um lavadeiro que a encontrou esquecida no fundo de um bolso de uma roupa que ele devia lavar.
9 - Périsse Duluc recusou-se a envolver-se nesse caso, que ele considerava incapaz de suprir o déficit, como era apresentado, mas sim de garantir a fortuna de seus promotores. Ele aconselhou Willermoz a interessar-se antes por uma tontina que lhe parecia muito mais inocente: "La tontine des vieillards". Lyon, ms. 5430, nº 33, 34, 35.
10 - Na carta de 31 de outubro de 1791, Périsse novamente se refere ao "trio ridículo Robespierre, Pétion, Grégoire, homens medíocres, que não contribuíram em nada para a Constituição".
I.C.J.M.S.
Que Nossa Ordem Prospere !!!
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