Nota do Tradutor: “O texto reproduzido abaixo é de autoria do Irmão Pierre Noel, um investigador ativo que dedicou-se a prática de diversos ritos maçônicos: Francês, Inglês, Escocês e até mesmo Americano. Homem extremamente sério, médico, professor da Universidade da Bélgica, autor de vários livros, ensaios e artigos que lançaram luzes a vários pontos da história da maçonaria que, até então, estavam revestidos de grande obscuridade. Entre os diversos trabalhos dele que tivemos a honra de conhecer, chamou-nos especial atenção este que agora transcrevemos e que tratou de forma bastante fluida sobre o caminho percorrido da Estrita Observância ao Rito Escocês Retificado. Esperamos que o artigo agrade a nossos leitores e sirva de base para maior compreensão sobre nosso amado Rito e seu Regime; tivemos que fazer algumas alterações em partes do texto a fim de adequá-lo ao português falado no Brasil e acrescentamos algumas notas com nossas observações, no entanto tais mudanças não alteram em nada o sentido do texto”.
I.C.J.M.S.
Que Nossa Ordem Prospere !!!
Introdução
O Rito Escocês Retificado ocupa um lugar singular na maçonaria contemporânea. Praticado na Suíça, França e Bélgica, é com frequência objeto de paixões e polêmicas; alguns o veem como a forma mais pura da iniciação maçônica, já outros o consideram um ramo bastardo e até degenerado da maçonaria clássica (1). A pedra de toque desse debate é o cristianismo, verdadeiro ou suposto, que impregna o rito com um “antigo regime” que muitas vezes é qualificado pelos detratores do rito como “cripto católico” (2) [...]
O trabalho que se segue não tem outra ambição a não ser de uma breve apresentação da cronologia e da evolução dos rituais “simbólicos” do Regime Escocês Retificado, tantas vezes mal compreendido e frequentemente alvo de denúncias em virtude dessa incompreensão. Não se trata aqui de uma exegese e menos ainda de uma exposição sistemática de sua doutrina (3) [...]
Da maneira que foi concebido, o Rito Escocês Retificado devia incluir três etapas sucessivas (que chamaremos aqui de Classes), concêntricas como diria Jean-François Var, compostas por graus simbólicos, uma Ordem Interior Cavaleiresca e a dos (Grandes) Professos. Na atualidade, apenas as duas primeiras classes estão em plena atividade. A terceira (até onde sabemos) não está ativa em nenhuma das potências maçônicas ditas regulares, já os grupos que dizem praticá-la valem-se dos textos dos fundadores da “Santa Ordem” e organizam seu conteúdo sob o nome de “Profissão” ( [Grande] Professos), logo não podemos ter certeza da validade de seu conteúdo... Mas nesse texto trataremos apenas dos graus simbólicos.
O Regime Escocês Retificado possui quatro graus simbólicos: Aprendiz, Companheiro e Mestre, que é depois seguido pelo “Mestre Escocês de Santo André”. No século XVIII esses graus eram regidos por um Diretório Escocês cujos poderes foram definidos em Lyon no ano de 1778; algo nada estranho para época, vide que na mesma ocasião a Grande Loja Inglesa - chamada de “Antigos” - exercia sua autoridade sobre quatro graus, o último dos quais o “Royal Arch”.
Na atualidade essa estrutura não mais existe. Os três primeiros graus retificados são conferidos pelas Potências Regulares e o grau de “Mestre Escocês” se confere nas “Lojas de Santo André” pelos Grandes Priorados da Ordem.
Essa dicotomia é condição de “regularidade” no sentido que essa palavra tomou durante os primeiros decênios deste século (no qual foi escrito) e não há nada que a questione.
Jean Baptiste Willermoz e a Maçonaria Lionesa
1. Introdução da Estrita Observância em Lyon
Jean Baptiste Willermoz, lionês de excepcional longevidade (1730-1824), fabricante e comissário de seda, foi sem dúvida alguma o Pai Fundador do Regime Escocês Retificado [...]
[Nota do Blog Primeiro Discípulo: não vamos entrar em muitos detalhes sobre sua iniciação a maçonaria (aos 20 anos de idade) pois já tratamos desse assunto no artigo “Da Recepção de Jean Baptiste Willermoz ao R.E.R.” ]
No início de sua carreira maçônica, Willermoz e seus irmãos praticavam a maçonaria que mais tarde viria a se chamar de “Rito Francês” mas essa, simplesmente, não o satisfazia por completo.
Willermoz estava convencido de que a maçonaria devia desconfiar desses “conhecimentos sublimes” que ela transmitia a fim de satisfazer um sistema tão rudimentar quanto decepcionante a seus olhos.
Ele buscou nas lojas clássicas encontrar as “verdades essenciais” apresentadas sob a capa de alegorias maçônicas herdadas dos especulativos britânicos e acreditou tê-las encontrado em 1767 na “Ordem dos Cavaleiros Maçons Elus Cohen do Universo” de Martinez de Pasqually.
Recebido em 1768 ao grau de Reau-Croix (4), criou em Lyon um “tribunal” de Elus Cohen, reservado a poucos de seus íntimos companheiros, onde se dedicou com fervor, ainda que sem êxito, as experiências teúrgicas prescritas pelo “Grande Soberano” Dom Martinez de Pasqually.
Decepcionado, talvez por não obter assistência dos supostos “Espíritos Intermediários”, desamparado pela partida de seu mestre que, em 1772, abandona a França para não mais voltar (5), Willermoz passa a dar “ouvidos a outras vozes” sem no entanto esquecer-se da doutrina Cohen.
Em 1772, seus correspondentes em Estrasburgo o informaram sobre a existência, para além do Reno, de uma forma de maçonaria caracterizada por sua bela ordem e pela seriedade de seus “conhecimentos”, a “Estrita Observância” ou, mais exatamente, “A Ordem Superior dos Cavaleiros do Templo Sagrado de Jerusalém”.
Fundada em 1751 pelo Barão (FreiHerr) Karl Gotthelf von Hund (1722-1776), ensinava que a Franco-maçonaria era uma perpetuação da Ordem do Templo, suprimida em 1312 pelo Papa Clemente V por ordem do Rei de França Felipe IV, “O Belo”.
A ordem seria dirigida pelos misteriosos “Superiores Incógnitos” - dos quais o Barão Von Hund seria apenas uma espécie de mandatário - e aspirava o restabelecimento da extinta Ordem do Templo e a recuperação de seus bens materiais (6).
[Nota do Blog Primeiro Discípulo: Von Hund afirmava (junto a alguns colaboradores diretos) que teria recebido sua iniciação das mãos de Charles Edward Stuart, Eques a Penna Rubra (Cavaleiro da Pena Rubra), pretendente ao trono inglês exilado na França, que teria lhe conferido o título de Mestre da VII Província da Maçonaria Templária e o encarregado de reformar e retificar a Maçonaria (7). Nunca houve comprovação deste encontro entre Von Hund e o pretendente ao trono inglês. Ao contrário, há registros de que este último não estivera em Paris no ano de 1743 (Dachez e Pétillot 2014: 25). De fato, após a morte do Barão, em 1777, seu sucessor, o Duque Ferdinand de Brunswick, enviou a Roma o Chanceler da VIII Província, Barão von Waetcher, com a missão de se informar com Charles Edward sobre as relações dos Stuart com a Ordem do Templo. O neto de Jaime II respondeu então que “nunca pertencera à Maçonaria e que seu pai, James-Edward Stuart, conhecido como ‘o Cavaleiro de São Jorge’, tinha-lhe negado permissão para iniciar-se” (Ursin 2004: 95). De toda maneira, o Barão von Hund afirmou até o fim da vida que o encontro com Charles Edward Stuart havia acontecido, tentando atribuir a seu sistema maçônico uma legitimidade que não continha e querendo chamar para si a missão de reformar a Franco-maçonaria (8) ].
Uma patente de Grão-Mestre Provincial da qual Von Hund teria se valido para introduzir a ordem na Alemanha e que lhe teria sido dada pelos supostos “Superiores Incógnitos” existe de fato (ainda que os ditos “superiores” nunca tenham existido) conservada nos arquivos da Grande Loja da Dinamarca, redigida em uma “linguagem cifrada” da qual ninguém jamais teve a chave…
Tudo isso, deve-se pontuar aqui, só veio a ser do conhecimento de Jean-Baptiste Willermoz muitos anos depois, quando já havia avaliado as falhas do sistema alemão.
No ano de 1772, Jean Baptiste Willermoz solicita sua admissão ao seio da Estrita Observância por meio de uma carta dirigida a Von Hund que responde em março de 1773 e encaminha a carta ao Barão de Weiler, seu emissário encarregado de implantar a Ordem na França.
Via-se uma certa confusão na correspondência trocada entre Willermoz e Von Hund; enquanto o lionês falava sobre o objetivo oculto da maçonaria e suas questões essenciais, o alemão falava unicamente na restauração da Ordem do Templo.
Não obstante essa incompreensão (ou quiça por causa dela), as negociações entre eles não passariam sem algumas dificuldades suscitadas pela desconfiança dos irmãos lioneses da Grande Loja de Mestres Regulares, os quais Willermoz tinha dificuldades em convencer. ( A.Joly, 1938, pp.47-50).
Passado algum tempo tudo se resolveu e Weiler, que já havia estabelecido em Estrasburgo o Diretório Escocês da V Província Templária, chamado Borgonha (outubro de 1773), pôde inaugurar o da II Província chamada Auvergne, em Lyon, em 21 de julho de 1774, e no mesmo ano, a da III província chamada Occitania em Bordeux (A. Joly, 1938, p.63).
Armados Cavaleiros por Weiler, em 11 e 13 de agosto, Willermoz e seus discípulos prestaram um juramento de obediência ao Barão von Hund e ao Duque de Brunswick-Lünebourg, "Superior Magnus Ordinis" e em troca receberam nomes de Ordem (Eques ab Eremo, para Willermoz) e os cadernos com os rituais alemães.
Não é difícil imaginar a decepção de Willermoz com tudo isso. Longe de surpreender, os rituais alemães pouco diferiam daqueles conhecidos pelos franceses. E quanto a sustentação da tese da “herança templária”, logo o lionês viu a inanidade de tal quimera, cultivada com verdadeira paixão depois que Ramsay, em seu famoso e infundado discurso, requereu para a maçonaria a paternidade dos Cavaleiros Cruzados… e dos Cruzados para os Templários foi apenas questão de mais um passo que o Cavaleiro de Lazarita deu...
Willermoz não ignorava essa fábula ensinada nos graus de “Comendador do Templo” e de “Cavaleiro Templário” praticado no capítulo por seu irmão (A. Joly, 1838, p.15).
Não seria justamente essa a justificação para o Kadosh o qual ele conhecera em 1762 e do qual desconfiava desde então ? (cf. La carta de Meunier de Précourt del 29 de abril de 1762, en Steel-Maret, 1893, pp.79-80).
Embora desconfiado, Willermoz era um homem que se entregava totalmente aos empreendimentos os quais abraçava e, por causa disso, estava disposto a fazer da capital das Gálias o farol da maçonaria templária.
Um ano mais tarde, o Convento de Brunswick ratifica a “restauração” das Províncias Francesas e expede os “Regulamentos Gerais” a V Província, estipulando o que se segue:
“A Ordem interior, velada sob o título de Diretório Escocês (estava) composta de três graus dos quais o último é o complemento, a saber: O de Escocês Verde que desenvolve o simbolismo, mas do qual a ordem não se compromete que aquele que tenha nele sido aceito consiga avançar, podendo permanecer ali toda a sua vida; o grau de Noviço e o grau de Cavaleiro… se denominam “professos” aqueles que fazem ali sua última “profissão”; tal profissão não é um grau que traga novos conhecimentos mas um ato livre e unicamente de vontade daquele que o faz e através do qual se compromete com a Ordem de maneira irrevogável … “ ( citado por J.F. Var, 1991, pp-49-50).
O último grau se dividia em seis classes segundo a condição social do impetrante (Eques, socius, argimer, clerc, servant y valet de armes), (Cavaleiro, Associado, Escudeiro, Secretário, Servente e Guarda de Corpos [Um tipo de guarda real] ) distinções mundanas que não impediam que os “conhecimentos” da Ordem fossem comunicados a todos (salvo aos “servants de armes”).
Por todas essas razões ditadas, sem dúvida, pelos usos locais, Weiler havia concedido em 1773 aos estrasburgueses o direito de acumular os altos graus franceses com os da Ordem Interior, constituindo assim uma classe intermediária que foi evocada pelo capítulo de Auvergne , em Lyon, na sua sessão de 23 de julho de 1774:
“… são lidos paralelamente os outros dois graus de Grande Escocês Vermelho e de Cavaleiro da Águia, chamado de Rosa-cruz: foram propostos para a segunda classe intermediária como da V província ( 3* protocolo da Província de Auvergne).
A escala de graus adotada em Estrasburgo diferia da que estava em uso na Alemanha por essa “segunda classe” intermediária entre o simbolismo e o interior, sendo:
1ª. Classe: Aprendiz, Companheiro e Mestre,
2ª. Classe: Escocês Vermelho e Rosa-cruz,
3ª. Classe: Escocês Verde, Noviço, Cavaleiro (A. Joly, 1938, pp. 66-67).
Os lioneses não se pronunciaram sobre a implementação desse sistema e o encaminharam mais tarde “para exame e decisão dos graus que compõe a segunda classe”; a princípio aderiram a posição de Estrasburgo, como atestado pela “Petit memoire d´instruction” enviado no ano seguinte ao Ir. Bryzet encarregado pelo Capítulo de Aubernia para estender as lojas de França a reforma germânica.
As lojas que quisessem fazer parte desse novo sistema “poderiam obter do Diretório a permissão de conferir os graus da classe intermediária… Os graus da segunda classe chamada intermediária são os de Escocês Vermelho e Cavaleiro do Oriente” ( Em Steel-Maret, 1893, pp. 175-176). O debate, no entanto, foi caloroso: em 1775 o capìtulo de Borgonha renúncia aos graus intermediários ( Roger Dachez e R. Desaguliers, 1989, 80: 290).
Restava resolver o problema da implantação na França de um organismo pertencente a uma potência estrangeira. Nem Willermoz nem os “templários da Auvergne” desejavam romper com o Grande Oriente da França, o que garantia a benevolência do governo.
Em janeiro de 1776, Willermoz anunciou que haviam sido iniciadas negociações com a obediência parisiense e que se esperava uma resolução favorável. E de fato, um “Tratado de União intima” ( Traité d Union intime) foi assinado em 31 de maio desse ano entre o Grande Oriente da França e os três Diretórios de Lyon, Bordéus e Estrasburgo, representados por Bacon de la Chevalerie, muito conhecido pelas suas relações Cohen ( em L. Charrière, 1938). Esse tratado, em dez artigos acrescidos por outros dois “secretos”, previa a reunião dos Diretórios e seus corpos subordinados com o Grande Oriente (artigo 1). Cada um “conservará exclusivamente a administração e a disciplina sobre as lojas de seu Rito e Regime” (artigo 6). A equivalência dos “graus fundamentais” dos dois ritos, estava garantida, assim como os direitos de intervenção e de duplo pertencimento: “ Os membros das lojas de um e outro Rito poderão passar regularmente às lojas do outro Rito, sem cessar de ser membro da loja à qual pertencia primitivamente.” (artigo 9º).
Esse tratado, que seria reformulado em 1811 sem modificações notáveis, ratificou a regularidade perfeita da Maçonaria "reformada" e, nunca foi contestado, justificando até hoje a prática do Rito Retificado no Grande Oriente de França
2. Os Graus da Estrita Observância (1775).
Os rituais conservados na Biblioteca Municipal de Lyon foram recentemente publicados por Jean-François Var (1991) que os julga rudimentares e desprovido de qualquer valor iniciático verdadeiro: “[...] De gestualidade, um moralismo banal, nada mais [...]”. Tal juízo é correto ? Cada qual que conclua o que desejar … Todavia é necessário pontuar que o que se praticava na França não diferia quase nada daquilo o que era feito além do Reno.
A disposição geral das lojas azuis é “comum das lojas francesas”. Estão iluminadas por três velas ante o Venerável, uma ante os Vigilantes e uma ante o Secretário. As tochas para os ângulos do quadro ( ou tapete) não são mencionados. Quer dizer que estavam faltando? É improvável, tendo em conta os usos da época.
Não nos esqueçamos que “comum” seria a disposição clássica das tochas nos ângulos NE, SE e SO conforme prescrito no Rito Francês, assim como no Rito Sueco e, de fato, uma gravura representando a Loja de Aprendiz/Companheiro segundo o Rito da Estrita Observância, atribuída ao fim do século XVIII, elas nos são mostradas dispostas exatamente dessa forma ao redor de um quadro que não difere em nada daqueles apresentados nas divulgações continentais dos anos 1745-1755 (documento conservado nos arquivos da Grande Loja da Dinamarca, em C.F. Feddersen, 1982, d/14) ( pl.1).
Agora, vamos a uma inovação notável e com muito futuro:
“Por trás da cadeira do Venerável pende, pintada sobre papelão ou outro elemento, o símbolo do grau”. Esse símbolo é “uma coluna quebrada no alto mas firme em sua base” (Primeiro Grau), “uma pedra cubo (sic) sobre a qual há um esquadro” (Segundo Grau), “um navio desarmado, sem velas nem remos, sobre um mar calmo”. As divisas em ordem são “adhuc stat”, “Dirigit Obliqua”, “ In silentio et in spe erit fortitudo mea ”.
A abertura dos trabalhos não inclui acendimento de tochas ou orações. O Venerável, depois de uma breve troca de perguntas e respostas do catecismo com os vigilantes, abre a loja por três vezes três golpes diante dos irmãos que portam espadas na mão esquerda, apontando para a terra e levando a mão direita ao pescoço”.
A recepção também não se afasta muito do que era praticado nas Lojas francesas à época, salvo outra inovação que é interessante destacar: A “luz” se dá em duas etapas, e na segunda, com a exclamação “Sic Transit Gloria Mundi”. O juramento do Aprendiz inclui as penalidades tradicionais (corte na garganta, coração partido e o todo queimado e reduzido a cinzas). O catecismo lembra os fundamentos da loja francesa e sua articulação em três colunas (Sabedoria, Força, Beleza) e três Grandes Luzes, agora enunciadas: “o Sol, a Lua e as Estrelas”, esta última substituindo aqui, não se sabe o por que, o mestre da loja (ou a estrela flamejante).
O sol significa o Venerável Mestre, a lua os Vigilantes e as estrelas os Mestres e Companheiros que “ guiam os aprendizes nas rotas escuras e misteriosas da Arte Real”.
O segundo grau, réplica sucinta do primeiro, era conferenciado certamente no mesmo dia. As palavras sagradas são em ordem : J... B... como era o uso continental desde o investimento (inglês) de 1739 ( cf. G.Verbal, 1988), as palavras passe são as reveladas Tub... e Shib…
A recepção ao grau de mestre segue a versão dos ritos praticados à época na França da lenda de Adoniram: os nove mestres enviados à sua procura decidiram por própria autoridade, mudar a palavra de mestre, medida baseada unicamente na prudência. Sobre o túmulo do arquiteto foi depositado “uma medalha triangular sobre a qual foi gravada a antiga palavra de mestre com dois ramos de acácia cruzados” . A instrução esclarece que essa palavra não é outra coisa que “o Santo Nome do Eterno, em hebraico”. Depois o candidato se volta e é coberto com um pano preto, enquanto as nove velas amarela são acesas. O sinal de horror é o único ensinado ao novo Mestre, o sinal "no ventre" pertence a outra tradição, a dos "velhos" ingleses. E, finalmente, a palavra de passe Gi ... e a palavra substituta M..B .. são completamente da tradição dos ritos praticados à época na França.
O Escocês Verde completa a série. Por mais simples que seja, ele contém elementos bem reconhecíveis. O candidato desarmado, com uma corda no pescoço e sob a ameaça da espada, é introduzido na loja decorada em verde e iluminada por quatro luzes dispostas em quadrado.
Livre do jugo da "Maçonaria simbólica" por seu compromisso com de obediência ao Diretório e a seus chefes, ele recebe o "hábito" (avental) verde , um sinal: "a mão direita para agarrar alguém pela cabeça", um toque para o cotovelo e duas palavras, J...á e N...a.
Embora não haja menção a Zorobabel ou o segundo templo, a imagem mostra Hiram ressuscitando e "... quem estica os braços para deixar o túmulo, deixando mais da metade" (pl.3). Está cercado por quatro animais, emblemas das virtudes do grau: o leão (coragem e generosidade), o macaco (domínio e habilidade), o falcão (clarividência) e a raposa (astúcia sem dolo). Com algumas mudanças, esses animais são os apresentados na divulgação de 1747 de "Les franc-maçons écrasés ..." (a pomba substitui o falcão) (pl.4).
3. Primeiras Reformas
Depois da morte de Weiler (novembro de 1775) e da morte de Hund (novembro de 1776), os lioneses decidiram ampliar os rituais, extremamente rudimentares à seus olhos, das iniciações germânicas.
Confiou-se a Willermoz e ao Estrasburguês Salzmann a redação dos graus simbólicos. Já a Jean de Türckeim, também Estrasburguês, coube a redação dos rituais das classes interiores. Nessa confusão, Willermoz se dedicou a redação de uma nova classe “secreta”, a (Grande) Profissão.
Na Estrita Observância, como já vimos, a Profissão não era um grau mas sim um ato livre através do qual o Cavaleiro se comprometia irrevogavelmente com a Ordem, a exemplo de uma “profissão” monástica. Aqui a ambição era outra: tratava-se de condensar o ensinamento metafísico / teosófico de Martinez de Pasqually, ou pelo menos sua parte teórica, em longas "instruções" que não seriam comunicadas, exceto aos escolhidos julgados dignos de recebê-los, em duas séries "secretas", a Profissão e a Grande Profissão. O trabalho foi concluído sem problemas: os textos já estavam preparados quando o Convento de Gálias se reuniu, dez anos depois.
Algumas dessas modificações já apareceriam nos três primeiros graus das Lojas Retificadas na França antes do Convento Nacional de Lyon de 1772 (Dachez y Desaguliers, 1989, pp.294 e seguintes).
Conservados nos arquivos da Corte e do Estado de Viena (rubricados por Gaybler, que era secretário do Convento de Lyon) destaca-se o sentido particular dado a preparação do candidato. Um irmão “preparador” é designado para esse fim e seu papel meticulosamente detalhado não tem nada em comum com a intimidação do manuscrito de Edimburgo (1696-1700) ou com os desvios do "irmão terrível" dos ritos praticados à época na França.
A ênfase se dá na dignidade e no formalismo, tentando convencer o candidato da importância de sua decisão e, ao mesmo tempo, garantir sua sinceridade. As próprias cerimônias são pouco modificadas. Note-se, por exemplo, que a palavra de passagem ou melhor, o nome do Mestre é "acácia" e não Gi…(9).
A Biblioteca Nacional de Paris conserva uma série de rituais “intermediários”, como um trazido de Estrasburgo “Regime Retificado 1776. Diretório Escocês de Estrasburgo antes do Convento Geral de Wilhemsbad em 1782” (Dachez y Desaguliers, 1989, pp. 297 e seguintes). Apesar de sua datação não difere em muito dos que se adotariam em Lyon dois anos depois, salvo nas máximas durante as viagens, que faltam, mas os castigos físicos tradicionais já não se encontram presentes nos juramentos.
Em 27 de abril de 1777 o Diretório de Auvergne decide que o Grau de Escocês Verde se tornara “ostensivo” a todas as lojas sob a denominação de “escocês” como “complemento da maçonaria simbólica” e já não mais como primeiro grau da Ordem Interior.
Essa deliberação "definitiva" também previa que os Veneráveis comunicariam "sem cerimônia e sem custos" aos escoceses os altos graus em uso antes da reforma: Cavaleiro do Oriente, Rosa-cruz e outros da mesma classe (artigo 7), e a exclusão de todos os graus de "cordão preto", Escolhidos ou Kadosh que Willermoz via com horror. Esses graus estavam expressamente proibidos e se negava aos visitantes de outros regimes que lhes possuíam, portar suas decorações em Loja (artigo 9). Esta decisão suprimiu de uma vez por todas a “classe intermédia” anteriormente concedida pela Weiler e com a qual os lioneses não sabiam bem o que fazer.
O artigo 6 desta mesma deliberação descreve o quadro do grau de escocês e o seu “símbolo distintivo”, um leão que brinca com instrumentos de matemática e a moeda “Maelliora praesumat” (sic) (en Renaissance traditionnelle, 1989, pp.313-316 e Cadernos Verdes , Boletim interior do ‘Gran Priorato de las Galias’, 1992, num.10-12, pp.223-237). Este escocês ao modo novo, síntese do escocês verde importado de Alemanha e dos graus escoceses praticados à época na França, será desenvolvido no Convento de 1778.
Fim da Primeira Parte
Notas:
1 - Em nossas pesquisas já nos deparamos com artigos que acusavam o Regime Escocês Retificado de ser uma armadilha dogmática.
2 - Acusações desse nível deram-se na Europa, onde a maçonaria mergulhou quase totalmente em um ateísmo ativista disfarçado de laicismo. Já na América Latina o que temos visto é uma tentativa de “diluir” o conceito de cristianismo presente no rito reduzindo-o a um “decorum”, nada mais que uma alegoria, com a finalidade de desconstruir essa característica com toda sorte de interpretações falaciosas e fantasiosas cujo propósito maior é transformar o R.E.R. em um subproduto de seitas as quais um certo nicho de irmãos pertencem.
3 - Busca a qual nós, do Blog Primeiro Discípulo, temos dedicado todo tempo e energia possíveis. O que não é nada fácil uma vez que temos sempre que tentar lançar luz sobre um cenário extremamente confuso, onde fatos e lendas tem sido misturados no intuito de criar subprodutos da doutrina que possam ser manipulados conforme o gosto de alguns irmãos que tentam sequestrar o rito para suas crenças pessoais…
4 - Mais detalhes podem ser vistos em nosso artigo: “Jean Baptiste Willermoz na Escola de Martinez de Pasqually: Gênese do Regime Escocês Retificado”.
5 - Idem.
6 - O que certamente acabaria nos cofres da “ordem”.
7 - Dachez e Pétillot 2014: 24-26; Ursin 2004: 54-56.
8 - Extraído do artigo “Rito Escocês Retificado” de Joanisval Brito Gonçalves
9 - Notará o leitor do blog que nesse texto estamos abreviando os nomes e as palavras de passe ao contrário do que fizemos em outras postagens. Fizemos isso todas as vezes em respeito às fontes originais, se essas trazem abreviado então traremos a tradução com abreviaturas, caso contrário, não.
Que Nossa Ordem Prospere !!!
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