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Mais Sobre a Doutrina e o Pensamento de Willermoz

  • Foto do escritor: Primeiro Discípulo
    Primeiro Discípulo
  • 24 de jan. de 2019
  • 5 min de leitura

Atualizado: 16 de out. de 2020

Previamente, para conhecer a razão da posição do Regime Retificado a respeito da matéria, entendida tanto como parte constituinte do corpo carnal do homem como também do composto material comum a todas as coisas criadas, atravessando os reinos animal, vegetal e mineral, convém saber como esse pensamento se impos pouco a pouco ao criador do Regime a tal ponto que veio a converter-se em seu pensamento oficial, ocupando um lugar central nos princípios teóricos ensinados pela Ordem, chegando a constituir boa parte das últimas instruções destinadas aos Cavaleiros admitidos na classe secreta [Professos e Grandes Professos].


Lendo os textos do Regime, uma primeira constatação se impõe: nos deparamos com uma análise estruturada, firme e muito bem construída que predomina no sistema de Willermoz em todos os graus por meio de algumas teses sobre o caráter corrompido e a natureza decaída do homem, forçado a viver aprisionado durante sua permanência nesse mundo.


Mas de onde procedem essas teses ? Em parte de Martines de Pasqually (+1774), porém não somente dele (O aspecto mais simbólico - As essências espirituais, valor do ternário, novenário , as faculdades, etc - Como tratado por Edmond Mazet em um estudo intitulado: “La concepción de la materia em Martines de Pasqually e en el Régimen Escocés Rectificado” ).


As teses apresentadas no Regime Retificado, do ponto de vista filosófico, metafísico e teológico, que é o que mais nos interessa nesse estudo, foram propagadas por outros pensadores / autores da espiritualidade muito antes de Pasqually, entre ele podemos citar Orígenes de Alexandria (185-253), Clemente de Alexandria (s. II), por que não Platão e os neoplatônicos (Jâmblico, Porfírio, Plotino, Damascius)?, ou mesmo São Paulo - primeiro mestre instrutor dos temas fundamentais da espiritualidade cristã - e as palavras do próprio Cristo nos Evangelhos que apresentam uma distinção muito clara entre o mundo material e o mundo celeste, entre as coisas criadas e as incriadas, entre o visível e o invisível, o que levaria a uma distinção básica e essencial que tomará, desde o primeiros tempos do estabelecimento da Igreja Cristã, um lugar central no seio do cristianismo: “O meu reino não é deste mundo; se o meu reino fosse deste mundo, pelejariam os meus servos, para que eu não fosse entregue aos judeus; mas agora o meu reino não é daqui.” (João 18:36).


Um outro aspecto que é por vezes evocado sob a forma de questionamento, sempre marcado por um certo desconforto, relativo ao clima adequado da história do pensamento religioso ocidental, consideravelmente influenciado por esta corrente: “Estariam as teses de Willermoz marcadas por uma sensibilidade Agostiniana?”. A resposta é: Sem sombra de dúvida, pois podemos encontrar numerosas afirmações semelhantes as do Regime Retificado nas obras do Bispo de Hipona ( Sobre a natureza e a graça ou De natura et gratia, Sobre a Trindade ou De trinitate, Sobre a graça e o livre arbítrio ou De gratia et libero arbitrio, A cidade de Deus ou De civitate Dei ). Estas teses, que foram como a marca que distintiva no pensamento de Santo Agostinho, tratam da corrupção do homem, do estado degradado da criação, do caráter viciado do mundo material, da necessidade da Graça, e constituem o que vem a se chamar “agostinismo teológico”, que insistiu com extraordinária força nas consequências negativas da queda do homem: “O pecado [de nossos primeiros pais] foi um desprezo à autoridade de Deus. Deus criou o homem; ele o fez à sua própria imagem; ele o estabeleceu acima dos outros animais; ele o colocou no Paraíso; o enriqueceu com todo o tipo de abundância e segurança; não lhe impôs nem muitos, nem grandes nem difíceis mandamentos mas, a fim de tornar uma obediência sadia fácil para ele, lhe deu um único pequeno e leve preceito pelo qual lembraria à criatura, cujo serviço deveria ser livre, de que ele era Senhor. Consequentemente, foi justa a condenação que se seguiu e uma condenação tal que o homem, que através da manutenção dos mandamentos deveria ter sido espiritual até mesmo em sua carne, se tornou carnal até mesmo em seu espírito. E assim como em seu orgulho, ele buscou ser sua própria satisfação, Deus, em sua justiça, o abandonou em si mesmo, não para viver na independência absoluta que ansiava mas, no lugar da liberdade que desejava, para viver insatisfeito consigo mesmo em uma sujeição dura e miserável a quem, através do pecado, havia se submetido. Ele foi condenado, a despeito de si mesmo, a morrer em corpo assim como havia se tornado, por vontade própria, morto em espírito, condenado até mesmo à morte eterna (não tivesse a graça de Deus o libertado ) porque havia renunciado à vida eterna. Qualquer um que pense que este castigo foi excessivo ou injusto, mostra a sua inabilidade para medir a grande iniquidade de pecar onde o pecado podia tão facilmente ser evitado”... “Mas a atual natureza, com a qual todos vêm ao mundo como descendentes de Adão, tem agora necessidade de médico devido a não gozar de saúde. O sumo Deus é o criador e autor de todos os bens que ela possui em sua constituição: vida, sentido e inteligência. O vício, no entanto, que cobre de trevas e enfraquece os bens naturais, a ponto de necessitar de iluminação e de cura, não foi perpetrado pelo seu criador ao qual não cabe culpa alguma”... "Por causa de sua origem, todos os homens estão sujeitos à corrupção, nossa natureza corrupta só tem direito a uma punição legítima...”


O maçom Retificado deve sempre carregar consigo a ideia de que foi Santo Agostinho, em uma disputa contra Pelágio da Bretanha, que desenvolveu a Doutrina do Pecado Original e que essa doutrina, existente unicamente no cristianismo, é o ponto de partida e a razão da existência do R.E.R. Logo, é totalmente legítimo e até mesmo desejável que ao examinarmos os textos do Regime Retificado, tenhamos em mente que existe uma identidade conceitual entre o pensamento de Santo Agostinho e de Willermoz. Ressaltar essa unidade seria para nós um salutar exercício que nos permitiria compreender e situar a doutrina do Regime (respeitando obviamente seus domínios ) no seio da história da espiritualidade cristã.


Todavia convém observar que a Doutrina do Pecado Original agrupa em si algumas teses que não são apenas de Santo Agostinho, sendo também comuns a outros pensadores cristãos da época e que, depois da morte de Santo Agostinho a doutrina continuou a ser propagada e defendida por toda a cristandade. Da mesma forma, na época de Willermoz a defesa de alguns conceitos não pertencia unicamente a ele ou a seus auxiliares / parceiros, sendo defendidas também por diversos pensadores, como por exemplo Franz Von Baader.


Importa-nos o que é o Regime, o que propaga a nível de ideias e pensamentos. Verificamos que ele lança suas bases nas doutrinas essenciais do cristianismo dos primeiros séculos, nas teses dos neoplatônicos, de Orígenes de Alexandria , de São Clemente e de Santo Agostinho. Isso é um fato indiscutível e, se queremos estar de pleno acordo com uma Ordem à qual dizemos pertencer, é lógico que devemos aceitar e professar sua doutrina… E caso, por pertencimento a outros grupos de pensamentos contrários ou mesmo por convicções pessoais não possamos aceitar e professar o que nos ensina nossa Ordem, tenhamos pelo menos a dignidade de silenciarmos ante seus pontos de vista ao invés de os denunciarmos como erros ou tratar tais pontos com horror como se fossem uma verdadeira heresia.


Fontes


* Vivenza, Jean Marc - As Fontes do Pensamento Willermoziano


* Meditações que compôs o glorioso Doutor da Igreja Santo Agostinho, Bispo de Hipona, Ed H. Garnier


I.C.J.M.S. Que Nossa Ordem Prospere!!!






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