Questões Essenciais Sobre a Iniciação Maçônica no Regime Retificado - Parte 2
- Primeiro Discípulo
- 22 de mar. de 2019
- 8 min de leitura
Atualizado: 16 de out. de 2020
“A essência de todo ser inteligente é [ segue sendo ] o conhecer e o amar [...] por tal, se dirige continuamente até as regiões da luz” - Joseph de Maistre em ‘As noites de São Petersburgo’.
O destino glorioso que a iniciação visa, como um termo vitorioso, só pode culminar em uma verdadeira ressurreição espiritual, ou seja, em uma verdadeira e plena união com a Divindade. Evidentemente, tal como mostra a terceira prancha do Grau de Mestre Escocês de Santo André através da ressurreição gloriosa de Hiram Abif, que não acontece na carne mas no corpo glorioso, evidenciando-se “a inércia total e a nulidade absoluta da matéria, quando é separada do princípio da vida que a faz existir” - Extrato do Ritual de Grau de Mestre Escocês de Santo André.
A figura de Hiram Abif saindo da tumba e ressuscitando é a “perfeita figura da ressurreição do homem em sua primeira forma incorruptível, a favor de todos aqueles que deixaram a carne e o sangue na tumba, a imitação e pelo socorro do Homem Deus (Jesus Cristo pela sua natureza humana e divina)”. Esta é a perfeita iniciação cristã, possível somente pela ação salvífica e reparadora da encarnação e ressurreição de Jesus: “Esta transmutação da carne atual na primeira forma do homem foi demonstrada pelo Divino Reparador Universal, por ocasião de sua própria ressurreição, que no túmulo despojou-se de tudo o que pertenceu ao velho homem e manifestou-se ante os olhos de seus discípulos sob forma gloriosa individual, dando-se por modelo a todos aqueles que aspiram retornar a seus primitivos direitos (que gozava o homem antes da queda)” - Instrução Secreta citada por Jean Marc Vivenza.
Eis aí a verdadeira natureza da ressurreição gloriosa que Cristo apresenta ao homem, “reveste-se desta forma gloriosa cada vez que quer manifestar a sua presença real a seus apóstolos, para fazer-lhes conhecer que é desta mesma forma, ou seja, de uma forma perfeitamente semelhante e tendo as mesmas propriedades, que o homem estava revestido antes de sua prevaricação.” - Jean Baptiste Willermoz em “O Homem Deus, Tratado das Duas Naturezas”.
Essa é uma das chaves mais importantes que a doutrina do Regime Retificado coloca ante seus iniciados por meio da terceira prancha do Grau de Mestre Escocês de Santo André, sendo em si mesma a culminação do processo iniciático que conduz a entrada triunfal na Jerusalém Celeste, e que, como adverte-nos Jean Baptiste Willermoz em “O Homem Deus…”, será difícil de assimilar para “estes homens carnais e materiais que não veem nada a não ser através dos olhos da matéria, e os que são bastante infelizes para negar a espiritualidade de seu ser, e aqueles também que, unidos exclusivamente no sentido literal das tradições religiosas, não querem ver na forma corporal do homem primitivo antes da sua queda, mais do que o corpo de matéria com o qual está atualmente revestido, nele reconhecendo apenas uma matéria mais depurada. É Jesus Cristo mesmo que vai provar-lhes a diferença essencial destas duas formas corporais e sua destinação, revestindo-se de um após a sua ressurreição, após ter destruído a outro no túmulo”.
Finalizada a viagem na região terrestre e despojado de sua natureza carnal, o homem que estava morto para Deus (Adhuc Stat) ressuscitou, recuperando sua “feliz imortalidade”, “último termo de seu glorioso destino”.
Somente tendo chegado a este termo desaparecem os símbolos maçônicos e o Templo de Salomão (arquétipo ligado ao plano físico), pois já completaram sua função e o iniciado está diante de um novo Templo que já não é deste mundo: A Jerusalém Celeste, a Nova Sião em cujo cume está o Cordeiro de Deus Triunfante, ponto mais alto de nossos mistérios, mistérios que nos conduzem a “plenitude da inteligência, para conhecimento do mistério de Deus, a saber, de Cristo. Nele estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento.” (Col. 2:2-3), a reintegração do homem renovado, do Novo Homem no Cordeiro sacrificado e triunfante (triunfante porque é sacrificado).
Fizemos então uma breve revisão do que significa, para um Maçom Retificado, a Iniciação Maçônica em sua totalidade. Como deixamos claro inicialmente, temos sorte em começar nossos trabalhos maçônicos a partir das reformas empreendidas por uma das mentes mais aguçadas da história da Maçonaria, o Pai Fundador de nosso rito: Irmão Jean Baptiste Willermoz que, em sua iluminação, foi capaz de recuperar o espírito mais puro da primitiva iniciação maçônica aperfeiçoada pela ação reparadora do Cristo encarnado.
Como símbolo de tal reforma se pode tomar a palavra de reconhecimento Phaleg, palavra de reconhecimento na Loja de Aprendiz. De acordo com D.Fontaine, (À propos de Phaleg, Les Cahiers Verts no 10-12, Grand Prieuré des Gaules, 1992.) Phal “que dizer escolha, algo posto a parte, ao mesmo tempo uma germinação...”. Esta palavra que substituiu Tubalcaín, rechaça por completo em nosso rito a tradição cainita que se manteve em outros ritos maçônicos.
“O livro de Gênesis, nos capítulos 10 e 11, nos ensina que Phaleg era um descendente de Sem, um dos três filhos de Noé que soube preservar-se da influência perversa de Cam. ”Assim, o nome de Phaleg, “substituindo” felizmente ao de Tubalcaín nos rituais retificados, nos indica claramente, a importância de se situar na descendência de Sem. Phaleg encarna, pois, como nos foi amplamente demonstrado aqui por Jean Baptiste Willermoz, o verdadeiro fundador das “Justas e Perfeitas Lojas”, a verdadeira “Tradição”, a iniciação santa e pura dos “filhos de Deus” que se mantendo na graça do Eterno.
Nosso Pai Fundador separa assim a iniciação cainita antediluviana da iniciação noaquita pós diluviana (aliança com Noé): “É depois do dilúvio, no tempo da confusão das línguas, que encontramos a razão da fundação de uma iniciação secreta que deverá perpetuar-se e que é o objeto de busca dos Maçons”. Um estudo da verdade feito desde as mais puras intenções nos conduziu a aprender que é nos descendentes de Sem onde devemos buscar a fundação da verdadeira iniciação. Sem foi bendito por Noé, e é correto crer que Phaleg, filho de Héber e descendente de Sem é o fundador da única e verdadeira iniciação e este motivo parece determinante para substituir o nome de Tubalcaín pelo de Phaleg. Cam, amaldiçoado por Noé, teria tido sua iniciação e tudo parece provar que sua palavra de reconhecimento teria sido Tubalcaín; este é o emblema dos vícios e convêm aos filhos de Canaã, os que a haviam transmitido; devemos recordar o que foi dito: "que Canaã seja maldito, que seja servo de seus irmãos, o escravo dolos escravos”. (Mas isso já foi tratado em outro postagem).
Pois bem, esta iniciação restabelecida por Phaleg, sofrerá a dispersão da Babel, a nova aliança com Abraão, a revelação da Lei a Moisés no monte Sinai, a dedicação do Templo de Salomão e a posterior reconstrução do Templo de Zorobabel e, por fim, o restabelecimento da perfeita iniciação com a encarnação do Verbo em Jesus Cristo. “Pois é claramente Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, quem restabelece o homem, operando sua reintegração a suas primeiras propriedades, virtudes e poderes espirituais divinos. A iniciação atua pois por Cristo e nada pode participar dela se não atua em nome e na unidade com este agente Reconciliador Universal” (Pe. Jean-François Var), pois o homem, tendo sido “amarrado por sua escolha pelo mal, se mostrou incapaz de se aproximar do Bem por seus próprios esforços e permaneceria eternamente separado de seu Deus se o amor infinito do Criador por sua criatura não tivesse derrubado essa barreira de eterna separação por sua encarnação em um corpo humano, do qual quis revestir-se para poder sofrer e morrer nesse corpo para expiar, assim, a culpa de todos os homens condenados diante da Justiça” (Pe. Jean-François Var).
Somente podemos ressuscitar para Deus pela ação reparadora de Cristo, sendo transformados e regenerados pelo fogo purificador do Espírito Santo. Nossa Ordem é, pois, cristã pois a iniciação (tal como a concebe Jean Baptiste Willermoz), segundo a doutrina particular do R.E.R, não funciona e nem pode funcionar de outra maneira.
Se tivermos uma clara noção do que representam para o ser humano a iniciação e a História Santa que a justifica, não teremos nenhuma dificuldade para saber até onde a mesma chega ou pode chegar em relação a outros ritos e obediências. Por regra geral, na maioria das vezes, outros ritos e obediências oferecem uma iniciação maçônica simbólica, no melhor dos casos, como um caminho de aperfeiçoamento moral sob o amparo de uma transcendência cujos limites são, na maioria dos casos, mais terrenas do que celestes, sem chegar aqui a considerar os aberrantes desvios de enfoques ateus ou agnósticos. É evidente que elas nada tem haver com a iniciação tal qual a entende o R.E.R. pois nessas iniciações, a maioria das vezes, se trabalha a deriva, sem saber exatamente onde se quer chegar. Elas sequer vão além do narcisismo metafísico-intelectual a que tendem, pois, sob a débil luz dos símbolos submetidos ao relativismo mais selvagem (prova de sua degradação) onde tudo é válido e só está submetido a limitar-se ante a débil razão humana…
No lugar de revelar ao homem sua origem, instruí-lo sobre sua natureza atual e sobre seu destino, o introduzem em um labirinto sem saída que pode, até mesmo significar para ele algum entretenimento mas que se revela estéril ao suposto despertar espiritual que alguns fingem alcançar.
Como aspecto positivo, diria que em geral, se é que isso serve de consolo, se isso melhora as pessoas sob o aspecto moral então que seja… vamos assumir até que agrega algum valor ... Só que não podemos reconhecer isso como um verdadeiro processo iniciático com a profundidade que o R.E.R. empresta ao conceito de iniciação.
Portanto, para que um maçom de outro rito venha a se tornar um Maçom Retificado, ele deve assumir compromissos muito sérios diante da Ordem, dele mesmo e dos irmãos, para que um dia ele possa completar a verdadeira iniciação maçônica que o Restaurador de Toda a Ciência, Jesus Cristo, veio a vivificar em sua obra devolvendo-a a pureza original.
Somente assim poderemos compartilhar a mesma luz no mesmo Templo como “Maçons! Filhos de um mesmo Deus!, reunidos por uma crença comum em nosso Divino Salvador!”.
I.C.J.M.S. Que Nossa Ordem Prospere !!!
Notas:
* Nesta postagem algumas opiniões podem parecer um tanto quanto fortes ou desconexas (talvez até ofensivas) para irmãos de outros ritos, todavia a postagem retrata o pensamento original das fontes das quais nos valemos para a publicação do artigo e não necessariamente a opinião dos mantenedores do blog.
Em postagem anterior afirmamos que temos nos dedicado a tratar aqui, da maneira mais clara possível, sobre o Esoterismo Cristão tal qual veiculado e formalizado por um sistema maçônico particular, o Regime Escocês Retificado. Não tratamos do assunto sob a ótica de nenhum outro sistema maçônico ou de qualquer escola filosófica / iniciática atual ou do passado (salvo em alguma referência que possa corroborar as teses aqui expostas).
Particularmente não somos contrários ou indiferentes a nenhuma posição assumida por quem quer que seja, apenas entendemos que a exclusividade do Blog é o Regime que nos foi legado por Jean Baptiste Willermoz e que abordar algo fora dele seria fugir dos propósitos aos quais nos lançamos.
* Em sua Summa Contra Gentiles, IV, 81, São Tomás de Aquino considera que a doutrina sobre a ressurreição é natural em relação à causa final (porque a alma está feita para estar unida ao corpo e vice-versa), mas é sobrenatural em relação à causa eficiente (que é Deus).
* O corpo ressuscitado será real e material, mas não terreno nem mortal. São Paulo opõe-se à ideia de uma ressurreição como transformação que se leva a cabo dentro da história humana e fala do corpo ressuscitado como “glorioso" (cf. Fl 3,21) e “espiritual" (cf. 1 Cor 15,44).
* A ressurreição do homem, como a de Cristo, terá lugar, para todos, depois da morte.
Fontes:
Cerrato, Diego - Cuestiones Claves de la Iniciacion Masonica en el Regimen Rectificado em www.caballerosdelarosa.org
Instrução Secreta aos Grandes Professos
Var, Jean-François - A iniciação e Cristo, Apreciações Sobre a Iniciação Cristã, A Iniciação Maçônica e a Iniciação Maçônica Cristã, 2008
Willermoz, Jean Baptiste - O Homem Deus, Tratado das Duas Naturezas
Ritual do Grau de Mestre Escocês de Santo André
Opus Dei - Creio na ressurreição da carne e na vida eterna
Comments